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O cinema, da forma como o temos hoje, isto é, a imagem em movimento posta numa tela para um público, surgiu na França, em 1895, por força do cinematógrafo, invenção dos irmãos Lumière, quando eles apresentaram alguns dos seus filmes. Mais de uma sessão do cinematógrafo foi feita ao longo daquele ano, mas foi a de 28 de dezembro em Paris que é considerada marco do nascimento do cinema. Menos de dois anos depois, precisamente no dia 8 de outubro de 1897, a invenção era apresentada em Curitiba.

Os primeiros filmes que se seguiram aos dos Lumière, de início documentários, e logo em seguida ficção, a partir de Georges Méliès, eram filmes curtos. Os documentários, em geral, eram registros de aspectos das cidades, sua gente, personalidades, curiosidades, aspectos da natureza, e os feitos da civilização.

O cinema logo chamou a atenção do mundo, os cinegrafistas se deslocando para todos os continentes à cata de novos registros, ou "vistas", para atender um mercado crescente e ávido por essas imagens. Assim, eles também chegaram ao Paraná, atraídos pela Estrada de Ferro Curitiba-Paranaguá, orgulho da engenharia da época, ou pelas belezas das Cataratas do Iguaçu. Esses filmes, além dos de outras partes do mundo, também eram mostrados em Curitiba. Imagens feitas por cinegrafistas vindos de fora, portanto.

O primeiro paranaense a filmar no Paraná foi Anníbal Requião. Seus primeiros filmes, documentários, datam de 1907, incluindo registros do Desfile Militar na Rua XV, homenagem à comemoração da Proclamação da República. Requião é o principal cinegrafista da Belle Époque paranaense, filmando Curitiba e os primeiros automóveis, o charme da Rua XV, os bondes, os clubes, as festas, inaugurações.

Em 1912, ele realizou Panorama de Curityba, que são as imagens cinematográficas da capital paranaense mais antigas preservadas de que se tem conhecimento. Vendo o filme, percebe-se que seu trabalho, em termos de técnica e de sensibilidade, não tinha nada a perder para os similares vindos de fora. De visão moderna, a Requião coube também a abertura, em 1908, da primeira sala dedicada exclusivamente ao cinema, com sessões diárias – o Smarth Cinema – que ficava na Rua XV.

Este pioneiro morreu em 1929, aos 54 anos. Outros pioneiros do cinema do Paraná são João B. Groff, Arthur Rogge, José Cleto, que filmou em União da Vitória, e Hikoma Udihara, em Londrina. Como documentarista citam-se Vladimir Kozák, de Curitiba, que com o antropólogo José Loureiro Fernandes realizou Índios Xetá na Serra dos Dourados (1954), uma referência mundial do filme antropológico.

O cinema do Paraná continuou documentário ao longo de cinco décadas, enquanto no Rio Grande do Sul, por exemplo, já em 1912, faziam-se filmes de ficção. Salvo algumas produções pornôs, e salvo o sonho de Arthur Rogge de implantar, na década de 20, uma indústria de cinema em Curitiba, na forma de Hollywood, o filme de ficção paranaense só foi ocorrer mesmo na década de 1960. O feito coube a Sylvio Back, com Lance Maior (1968), feito em 35 milímetros, seu filme de estréia no longa-metragem.

Na década de 1950/60, além de Curitiba, houve experiências na ficção no norte do Paraná, em Londrina e Siqueira Campos. Um exemplo é o longa em 16 milímetros Senhor Bom Jesus da Cana Verde, com direção de Gabrielangelo Caramore e Juracy Garanhani. Mas Lance Maior é superior em termos técnicos e dramatúrgicos. Além disso, lançado em todo o país, pôs o Paraná no mapa nacional da produção de ficção ou de enredo em longa-metragem. Sérgio Bianchi, que como Back se tornaria um dos principais cineastas do Paraná, está neste filme, no papel de um bancário.

Lance Maior não é obra-prima, não se compara aos primeiros filmes de Glauber Rocha, por exemplo, mas é um bom filme. Tem como enredo jovens, de classes sociais diferentes, divididos entre o emprego e a universidade, a sobrevivência, a família, crises existenciais, dilemas ideológicos, decepções amorosas. Trata do drama e da condição humana, tem toques de universalidade, é um filme que não envelheceu. A importância de Back se faz ainda por ter coordenado, para o Museu da Imagem e do Som (MIS), no início da década de 1970, em Curitiba, duas edições do Festival Nacional do Filme Super-8, dando visibilidade a uma produção de muita significação no Paraná, feita no litoral, em Curitiba, Maringá e Londrina. A iniciativa de Back, de certa forma, teve continuidade nos festivais Super-8 realizados pelo Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná (CEFET) – hoje Universidade Tecnológica do Paraná (UTFPR).

A criação da Cinemateca de Curitiba por Valêncio Xavier, em abril de 1975, foi, em termos da cultura do cinema, um divisor de águas. A Fundação Cultural de Curitiba, a qual pertence a Cinemateca, já tinha atividades de cinema, cursos, exibições, porém, esporadicamente. Criada com a finalidade da pesquisa e da documentação cinematográfica, acervo e preservação, formação e difusão, a Cinemateca, com seu trabalho, logo tornou-se uma referência nacional e até mundial, possibilitando, através de seus cursos, seminários, sessões diárias, a revelação de diversos cineastas.

A Lei de Incentivo Municipal de Curitiba, a partir de 1993, pioneira no Brasil, foi outra importante conquista deste cinema, permitindo, além de diretores, a revelação de produtores como Maurício Appel e Rubens Gennaro, por exemplo. A partir da década de 1990, novas iniciativas surgiram no interior do Paraná, como o núcleo de Cascavel, no Oeste, liderado por Talício Sirino, e o de Londrina, por Carlos Lourenço Jorge e Caio Cesaro, núcleo que neste ano de 2007 revela o promissor Rodrigo Grota, com a estréia do curta Satori Uso.

Neste novo milênio, este cinema teve novas e importantes conquistas. Além da Lei de Incentivo da Prefeitura de Curitiba, em 2005/2006 o poder municipal instituiu o Edital do Filme Digital, que foi muito bem aceito pela comunidade de cinema local, e que já tornou possível a realização de diversos filmes, inclusive com a novidade da categoria iniciantes.

Mas a maior conquista, em termos da produção do Paraná, neste novo milênio, foi a instituição do Prêmio Governador do Estado, também em 2005/2006, que tornou possível a realização de oito longas-metragens, alguns já lançados. Destes oito, dois em 35 milímetros, no valor de um milhão de reais cada um. O Edital do Filme Digital, que, na sua terceira edição, contempla também a modalidade longa-metragem, e o Prêmio Governador do Estado, são a concretização real de um sonho há muito tempo reivindicado pelos cineastas locais.

Francisco Alves dos Santos, formado em Filosofia e Jornalismo, é crítico e pesquisador de cinema e coordenador da Cinemateca de Curitiba. Realizou diversos curtas-metragens como A Margem do Belém, Cicatrizes e Pesadelos. É autor dos livros Dicionário de Cinema do Paraná e Cinema do Paraná – Nova Geração, entre outros.

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