Vivienne é uma escritora em crise criativa. Depois do sucesso alcançado aos 12 anos com a publicação de um romance sobre um menino judeu escondido sob o assoalho, ela nunca mais conseguiu repetir o seu feito infantil. Agora, perto dos 30 anos, com outras preocupações na cabeça, dentre elas a possibilidade de um AVC, ela quer deixar uma marca, mas não tem ideia, apenas algumas frases soltas sobre o amor.
Encontramos uma Vivienne alucinada quando entramos no TUC Teatro Universitário de Curitiba, onde a peça que leva o nome da personagem está sendo exibida até sábado. Uma seleta plateia é convidada a assistir ao espetáculo em cadeiras espalhadas pelo palco, o que a torna participante e cúmplice dos tormentos da escritora que, desesperadamente, procura algo inédito e bom para escrever, mas não consegue, nem com a ajuda dos amigos que se aglomeram no seu apartamento.
Aliás, é normal que amigos sejam condescendentes quando colocados no papel de críticos. Há laços mais importantes que precisam ser mantidos e é por isso que a crítica, seja ela positiva ou negativa, dá lugar à simples bajulação. É preciso que um escritor célebre, que surge na peça na forma de um assado para ser devorado por comensais sedentos de arte e inspiração, mostre a Vivienne o caminho para o seu sucesso. É a partir daí que "Vivienne", não mais a personagem, mas a peça, envereda sobre o tema que quer explorar: o teatro contemporâneo.
Satírico, o espetáculo faz rir e muito dos pressupostos artísticos que ditam a construção do teatro atual: pegue um fato cotidiano a crise criativa, por exemplo e o envolva em meio ao caos de ideias, sentimentos e personagens, tendo como mote a metalinguagem o teatro falando do próprio teatro. Junte um pouco de filosofia e algo de mistério aquilo que o público não vai reconhecer de imediato ao texto e o entregue a um diretor consagrado, que possa desconstrui-lo de acordo com a sua própria dramaturgia. E deixe, por fim, que o crítico, o grande vilão de Vivienne, a peça, desenvolva as teorias que, no fim das contas, estão fadadas à morte.
É uma maneira de ver as coisas e "Vivienne" acerta justamente por não se levar a sério. Despretensiosa, ela se torna um jogo divertido e cheio de qualidades: o cenário caótico, o texto rápido e irônico, e um elenco que, embora desigual, torna o espetáculo agradável. O destaque vai para Patrícia Cipriano, atriz que dá vida à protagonista, e sua atuação algo neurótica e exagerada, mas delicada em certo sentido, que causa empatia e faz rir em muitos momentos.
Desenvolvida por um grupo de atores como trabalho de conclusão do curso de artes cênicas da Faculdade de Artes do Paraná, a montagem surpreende em meio à produção de grupos iniciantes. Isso não significa que não haja tropeços. Na tentativa de caracterizar tudo o que sinalizam como elementos deste teatro contemporâneo, algumas situações não se encaixam na narrativa e são lançadas na peça apenas para arrancar gargalhadas da plateia o que funciona, é verdade, mas que também dá provas de inconsistência.
Personagens deslocados e atuações afetadas também minimizam o sabor agradável da peça, que muitas vezes peca pelo exagero. Logicamente, ele é proposital, mas parece diminuir o impacto das questões que, mesmo em meio ao absurdo e ao cômico, são importantes para o jovem grupo de atores afinal, são eles que colocam essas questões em cena.
Problemas à parte, "Vivienne" é uma grata surpresa. Leve, irreverente e debochada, a peça merece ser vista, se não pelo tema que propõe, pelo menos para se ter boas risadas.
Serviço
"Vivienne". Mostra Coletivo de Pequenos Conteúdos. TUC Teatro Universitário de Curitiba (Galeria Júlio Moreira, s/n Pça. Tiradentes), (41) 3321-3312. Dias 5, às 16h; dia 6, às 19h; e dia 7, às 22h. R$ 20 e R$ 13 (meia-entrada mais taxa).
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