A taxa de câmbio brasileira está distorcida e o próximo presidente, seja quem for, precisará gerenciar um processo de valorização do dólar, que, ao menos no curto prazo, trará impactos negativos na economia, como pressão inflacionária. Esse é o consenso que transparece entre os acadêmicos e participantes de mercado ouvidos pelo Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, que, em sua maioria, preveem uma transição mais suave na política cambial no caso de vitória da oposição, já que a confiança dos investidores elevaria o fluxo de recursos para o País e contrabalançaria os fatores que impulsionam o dólar.

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Na opinião de Nathan Blanche, sócio da Tendências Consultoria Integrada que atua há 40 anos no mercado de câmbio, a primeira decisão do novo governo em 2015 será definir qual o regime que impera no País. "Que regime cambial nós temos? Alguns falavam que era um crawling técnico, entre R$ 2,20 e R$ 2,25, que já foi furado. Será um regime de bandas sujas? Câmbio administrado? Com um estoque de swaps de US$ 96 bilhões, certamente não temos um câmbio flutuante", afirma.

Outros dois especialistas apontam os perigos de os formuladores de políticas focarem excessivamente no curto prazo. Na avaliação do professor de Economia da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), Antônio Corrêa de Lacerda, o câmbio é a principal variável macroeconômica a ser corrigida por quem for eleito, pela sua capacidade de transmissão de variações da moeda aos preços da economia. Ele reconhece que a desvalorização do real teria inicialmente como consequência um aumento da inflação, mas no longo prazo representaria mais investimentos e ganhos de produtividade.

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Já Márcio Garcia, professor da PUC-Rio, aponta que o controle da inflação tem sido o principal objetivo de política cambial sob o governo de Dilma Rousseff (PT). "Eu comparo as políticas econômicas do período Dilma a um erro médico, que identificou a doença errada e administrou o remédio errado", critica. Entretanto, ele estima um impacto menor do processo de desvalorização do câmbio na inflação, explicando que o pass-through tende a ser menor quando a economia está em recessão e o câmbio apreciado, como acontece atualmente.

Na contramão da maioria dos analistas, o ex-diretor de Política Monetária do Banco Central (BC) Luís Eduardo Assis não acredita que Dilma tenderia a tentar e segurar mais o câmbio do que os candidatos da oposição. "O compromisso da Dilma não é com o erro passado, mas com a governabilidade nos próximos quatro anos. Empurrar com a barriga por quatro meses como ela tem feito até agora é possível, mas por quatro anos não dá", argumenta.

Blanche, da Tendências, diz que a petista pode até tentar conter uma depreciação abrupta e acentuada do real, mas afirma que isso é algo que foge ao seu controle. "No médio a longo prazo, a taxa de câmbio sempre vai procurar o equilíbrio, por bem ou por mal", afirma. Ele reconhece que o programa do Banco Central de oferta de hedge, por meio dos swaps cambiais, é um instrumento "nobre", evitando que o País quebrasse em momentos de crise aguda. Alerta porém, que esse artifício não pode ser usado como formulador de taxa de câmbio.

Garcia afirma que a o cenário mais positivo para a transição no câmbio seria uma vitória da oposição e uma recuperação mais gradual nos EUA, que diminuiria a necessidade de o Federal Reserve elevar os juros. O professor da PUC-Rio diz não ver muitas diferenças entre as propostas de Marina Silva (PSB) e Aécio Neves (PSDB). O grande trunfo do tucano é ter arregimentado o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, o que lhe dá "uma capacidade de execução muito maior".

Os analistas apontam que o mais indicado seria o BC encerrar seu programa de swap cambial de maneira gradual, permitindo que o dólar se valorizasse lentamente, o que reduziria os impactos negativos na economia e permitiria uma melhora nas transações correntes. Atualmente a projeção é que o déficit em conta corrente brasileiro continue subindo, se aproximando de 4% do PIB em 2015. Essa condição foi a principal responsável por garantir ao Brasil um lugar no chamado grupo dos Cinco Frágeis, as economias emergentes mais suscetíveis a uma forte volatilidade em função da normalização monetária nos EUA.

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Lacerda, da PUC-SP, entende que um candidato da oposição teria mais argumentos para justificar um ajuste no câmbio. "Tanto Aécio quanto Marina teriam a favor a justificativa de estar corrigindo um erro passado do governo petista, admitindo um aumento de inflação e juros no curto prazo mas oferecendo no longo prazo mais investimentos, mais produção e mais empregos na indústria, aumento das exportações e redução do déficit em conta corrente", afirma o economista.

Mesmo com os argumentos em favor de uma situação um pouco mais confortável em caso de vitória da oposição, Assis aposta que o BC continuará coordenando parcialmente os movimentos do dólar e até chega a defender essa atitude. "Não dá para pensar em uma política de câmbio verdadeiramente flutuante com as oscilações que o mercado possa impor. Nos outros países também é assim. Há interferências dos bancos centrais", comenta o ex-diretor do BC.