O sócio fundador da Gávea Investimentos, Armínio Fraga, disse que o Brasil está na UTI, mas não é um paciente terminal. “Não vejo o Brasil como um paciente terminal, mas não tenho uma visão positiva do quadro do Brasil”, afirmou nesta terça-feira (12) durante o Summit Imobiliário, realizado pelo Estadão em parceria com o Secovi-SP.
Fraga pontuou que o país vive a maior crise de sua história, apontando para a queda do PIB dos últimos dois anos. “Estamos vivendo o caso de corrupção mais impressionante de nossa história, que não só envolve atos ilícitos, mas acoplados a um projeto de poder”, disse.
Segundo Fraga, o Brasil precisa de uma resposta clara e uma visão de longo prazo. “Vivemos neste momento e, a partir disso tudo, uma descrença na política e nos políticos do Brasil”, citou. “Precisamos de uma visão de longo prazo para encontrar saída para essa situação em que nos encontramos”, acrescentou.
Fraga afirmou que, no momento, não é hora de assumir um cargo no governo em um eventual convite, caso o impeachment da presidente Dilma Rousseff se materialize. Admitiu que é difícil dizer “nunca mais vou fazer isso”, mas que por várias razões não deveria dar tal passo. “Já fui do governo três vezes: um jovem diretor do BC, presidente do BC e fiquei por um ano assessorando o Aécio Neves (PSDB). É difícil dizer nunca mais vou fazer isso. No momento, não acho que eu possa ir, por várias razões. Muito de natureza pessoal. Não é hora para mim”, afirmou ele.
De acordo com Fraga, o que ele pode fazer é passar sugestões. “Posso fazer sugestões ao governo, de longe, e isso eu farei”, concluiu.
Fraga afirmou não ter sido convidado para participar de um novo governo e negou ter jantar agendado com o vice-presidente Michel Temer esta noite. “Não fui convidado a participar de um novo governo”, afirmou em conversa com jornalistas após palestra no evento.
Ele acrescentou que já havia sinalizado que neste momento não poderia compor o governo, por razões pessoais, que envolvem, por exemplo, a recém-recompra da Gávea Investimentos. Há especulações de que Fraga ocuparia o Ministério da Fazenda em um eventual governo pós-impeachment da presidente Dilma Rousseff, com o atual vice, Michel Temer ocupando a presidência.
Fraga reiterou, no entanto, que gostaria de colaborar como o que fosse possível e que suas políticas estariam próximas do que havia elaborado na composição da chapa do então candidato à presidência pelo PSDB, Aécio Neves, em 2014.
Trajetória perigosa
A volta da CPMF não será suficiente para corrigir a rota do déficit fiscal no Brasil, na opinião de Fraga. “A coisa chegou em um jeito que não é suficiente só a volta da CPMF, fazer um esforço curto. Não é uma questão cíclica. Nossa máquina não está preparada para crescer. Vive hoje certa paralisia”, afirmou ele.
De acordo com Fraga, o Brasil vive hoje uma trajetória “muito perigosa”, que combina queima de caixa, PIB encolhendo e juro real “astronômico”. Destacou ainda que a relação dívida/PIB, de 72%, não incorpora prejuízos a olho nu, como a necessidade de capital para a Petrobras, a Caixa Econômica Federal e o FGTS. É necessário, na sua visão, uma “reviravolta importante na área fiscal”.
“Nossos Estados estão péssimos do ponto de vista de finanças. O Rio de Janeiro vive um momento particularmente difícil”, acrescentou o sócio-fundador da Gávea.
Ele vê a relação dívida/PIB do Brasil chegando perto dos 80%, crescendo entre 7% e 8% por ano. Para Fraga, alinhar a trajetória da dívida pública no País requer uma reforma de Estado. “O melhor a fazer de cara seria arrumar a trajetória da dívida pública”, avaliou. Segundo Fraga, para reverter a situação econômica do País seria preciso, de maneira mais imediata, atuar sobre a trajetória da dívida pública. O executivo disse que essa iniciativa seria um passo inicial numa reforma do Estado.
Fraga afirmou que, atualmente, o orçamento nacional é muito difícil de ser administrado, uma vez que os valores vão subindo e ficam parados em patamares elevados. Ele mencionou ainda que seria preciso fazer uma reforma da Previdência e atuar sobre a produtividade em geral no país.
Os comentários foram feitos no evento após o ex-presidente do BC ser questionado sobre possíveis medidas a serem tomadas no caso de uma mudança de governo. Fraga também afirmou que a nomeação de um grupo ministerial forte seria uma sinalização importante para a economia.
O executivo também ressaltou que o Brasil está diante de um cenário binário, no qual a economia pode continuar a piorar ou pode dar sinais de recuperação. De acordo com Fraga, independentemente do resultado da votação sobre o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no plenário da Câmara dos Deputados no domingo, se a economia parar de piorar “já é bom”.
Mercado imobiliário
O mercado imobiliário é um reflexo da situação econômica enfraquecida, de acordo com o ex-presidente do BC. O executivo fez uma comparação do setor com o mercado de ações, uma vez que existem ações de qualidade mais baixa, mas que continuam com demanda. Os compradores enxergam nesses ativos a possibilidade de evolução e há perspectiva de ganho numa eventual recuperação da economia. “No mercado imobiliário, é parecido”, explicou, ao apontar que no médio prazo a situação pode melhorar. Mas no curto prazo ainda é difícil. “O mercado pode demorar um pouco para dar uma aliviada”, afirmou o executivo.
Ainda sobre o setor de imóveis, Fraga apontou que o programa habitacional federal Minha Casa Minha Vida ainda precisa passar por ajustes para se tornar um programa de Estado, em vez de ser uma iniciativa de governo.
O ex-presidente do BC alertou que o Brasil pode piorar muito se não acontecerem as mudanças que o mercado espera. “Os mercados estão relativamente estáveis porque há expectativa de mudanças, mas a trajetória pode ser muito mais apavorante”, disse Fraga.
Segundo ele, se o impeachment vier acompanhado de uma proposta clara para o futuro do Brasil, a economia pode reagir, mas não em um salto, porque os problemas são muito difíceis. “Saindo Dilma o país pode crescer”, pontuou.
Fraga notou que a situação hoje é inversa à de 2002, quando o governo tentou administrar a crise que era, no fundo, de expectativa. “Havia medo do que aconteceria com o Lula eleito”, disse. Agora é o inverso, de acordo com ele, com o receio sendo quanto à permanência do governo atual. “Existe pouca dúvida, pois o governo teve toda a chance de melhorar e não melhorou. Com a economia afundando, pode ser um circulo vicioso contra nós. Tenho muito medo desse cenário”, disse.