O brasileiro está poupando menos em 2014. É o que sugerem os números da caderneta de poupança e dos fundos de investimento, aplicações que estão entre as mais acessíveis ao pequeno investidor. Somadas, as captações líquidas (depósitos menos resgates) dessas duas modalidades caíram de R$ 119 bilhões no primeiro semestre de 2013 para apenas R$ 11,5 bilhões no mesmo período deste ano.
INFOGRÁFICO: Aplicações em poupança e fundos de investimento perderam a força em 214, confira
De janeiro a junho, a caderneta captou R$ 9,6 bilhões, segundo o Banco Central. O valor, 38% menor que o do mesmo período de 2013, é também o mais baixo para a primeira metade do ano desde 2011. O resultado dos fundos de investimento foi pior. A captação líquida caiu de R$ 103,2 bilhões para R$ 1,9 bilhão, o montante mais baixo dos últimos 12 anos, conforme a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).
Essa perda de fôlego pode estar relacionada, em parte, a uma migração de recursos rumo às Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), que vêm ganhando popularidade, e rumo a títulos do Tesouro Direto, que ficaram mais atraentes com a alta da taxa básica de juros. Esse movimento, no entanto, não foi suficiente para compensar a retração dos depósitos em poupança e fundos.
À parte essa possível migração, a principal razão para o brasileiro estar guardando menos dinheiro parece estar na própria estagnação da economia, que registra desaceleração no mercado de trabalho, inflação no teto da meta e famílias bastante endividadas.
Para Luciano Nakabashi, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP de Ribeirão Preto, o principal obstáculo à poupança está na perda de ritmo da renda dos trabalhadores que ainda avança, mas cada vez mais devagar. "A própria geração de emprego formal está perdendo força", observa.
Marcos Wagner da Fonseca, professor de Finanças da UFPR, destaca a questão do endividamento, que suga recursos que antes poderiam ser poupados. "Qualquer desaceleração econômica tende a reduzir o consumo e a poupança. Desta vez há um fator adicional, que é o fato de as famílias estarem muito endividadas. Elas estão dando prioridade ao pagamento de dívidas", diz.
O dado mais recente do Banco Central indica que, em março, os brasileiros deviam o equivalente a 45,73% da renda anual, pouco abaixo do recorde do mês anterior (45,83%). Segundo uma pesquisa da Confederação Nacional do Comércio (CNC), hoje 63% das famílias têm dívidas. É o maior índice desde janeiro, e não deve cair tão cedo. "Como não há melhora à vista no cenário econômico de curto prazo, endividamento e inadimplência tendem a piorar nos próximos meses", diz o economista Bruno Fernandes, da CNC.
Fundos perderam R$ 42 bilhões em um ano
A baixa captação dos fundos de investimento no primeiro semestre foi uma notícia até positiva se comparada às fortes perdas que eles tiveram na segunda metade do ano passado. Naquela ocasião, o aumento da taxa Selic e a volatilidade da Bolsa de Valores provocaram desvalorização no patrimônio de vários fundos, levando investidores a resgatar suas aplicações. Nos meses de janeiro e abril deste ano, os saques voltaram a superar os depósitos. O acumulado dos últimos 12 meses é bastante negativo, com saída de R$ 41,7 bilhões.
"Muitos investidores acabaram migrando para outros produtos naquele momento. E, em 2014, a indústria de fundos acabou carregando ainda as consequências do que aconteceu em 2013", diz Carlos Massaru, vice-presidente da Anbima. "Além disso, é natural que um crescimento menor da economia tenha reflexos em uma indústria que está ligada ao ato de poupar, de guardar dinheiro. As pessoas eventualmente precisam usar o dinheiro que está aplicado para fazer jus a seu orçamento."