Chama a atenção o fato de o custo dos empréstimos ao consumidor, em especial dos cartões de crédito, ter entrado em um pacote de estímulo à economia. O governo decidiu agir em um campo onde ninguém até hoje conseguiu sucesso.
A briga contra os cartões é a ponta mais chocante da dificuldade de acesso a crédito no Brasil. Com juros anuais acima de 400%, os cartões, juntamente com o cheque especial e o crédito concedido por financeiras, cobram pelo dinheiro um preço impossível. Mesmo as linhas “baratas”, de crédito ao consumidor, como o CDC, são horrivelmente caras.
Para começar a discussão, é preciso reconhecer que o imbróglio é complexo. Os juros são altos por causa de uma combinação de fatores que no Brasil se juntaram em uma fórmula explosiva. Os juros básicos são altos, a captação é cara, o sistema financeiro é concentrado, a regulação é frouxa e há dificuldade para avaliar a qualidade do tomador e para recuperar o dinheiro emprestado em caso de calote.
Nas medidas anunciadas na quinta-feira, há a proposta vaga de se fazer um estudo para a redução dos juros nos cartões, a redução do prazo para os lojistas receberem por esse meio, a criação de um cadastro positivo quase obrigatório e a cobrança de preços menores em dinheiro.
É difícil estimar quanto disso vai chegar no nosso bolso. As medidas não chegam perto de corrigir o erro de origem no mercado brasileiro de crédito. Os recursos direcionados (com destinação obrigatória em lei, como a destinação da poupança para a construção civil) somam quase metade do mercado. Isso cria um desequilíbrio, com linhas baratas e pouco lucrativas de um lado, e a necessidade de os bancos buscarem a rentabilidade na outra metade do mercado.
Baixar os juros à força e estabelecer limites para linhas específicas pode não ser possível legalmente. É algo testado no crédito consignado para aposentados, mas é uma condição de acesso ao pagamento em folha. No cheque especial ou cartão de crédito, essa condição de acesso não existe e seria questionável uma limitação escrita em lei.
Dar um benefício maior para o pagamento em dinheiro parece ter o efeito de obrigar as operadoras e bancos e melhorarem taxas operacionais e juros, mas também é uma medida limitada. Na prática, os lojistas já embutem esse custo ao dar o desconto na compra em dinheiro ou à vista (quando há a opção de parcelamento no cartão). A lei não mudaria muito estímulos que já existem, portanto.
O cadastro positivo obrigatório pode sofrer resistências, embora seja a ideia com mais chances de dar resultado. Os bancos usam informações de seus cadastros para oferecer crédito, mas um banco de dados mais completo e universal, com um sistema de pontuação fácil de entender, poderia dar acesso a crédito mais barato a quem é bom pagador. A preocupação maior aqui é com o sigilo dessas informações – o cadastro com adesão quase obrigatória pode não ser constitucional.
Apesar das boas intenções do governo, o custo do crédito no Brasil vai continuar alto por um bom tempo. Só uma combinação de regulação inteligente (que engloba mais competição no mercado financeiro), liberação de recursos da destinação obrigatória e de educação financeira da população teria um efeito amplo o suficiente para o Brasil ser mais normal nessa área.
Em alta
O Fed, banco central dos EUA, retomou a normalização da política monetária e elevou os juros para uma banda entre 0.5% e 0,75% ao ano. O dólar deve se fortalecer no processo.
Em baixa
O fundo de pensão dos funcionários da Caixa teve de pedir um aporte de mais de R$ 7 bilhões. Parte das perdas foi em projetos duvidosos, como no projeto enrolado do estaleiro Sete Brasil.
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