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De Olho no leão

Bacenjud, a penhora assassina

Qualquer cidadão com um mínimo de consciência sabe que o tributo, no sentido de pecúnia devida ao Leviatã, é o preço da civilização. A frase não é minha, foi proferida em histórico julgamento por magistrado da Suprema Corte americana.

Obedecidos os princípios básicos da tributação, como a capacidade contributiva e o não-confisco, todos nós somos solidários no custeio das atividades estatais voltadas ao bem estar coletivo. Da mesma forma que concebemos as necessidades financeiras de um clube social para prestar serviços a seus associados e assegurar a própria manutenção, o Estado precisa contar com a colaboração de cada um de seus cidadãos para alcançar os objetivos de interesse comum.

Bem por isso, o contribuinte honesto, que cumpre em dia suas obrigações fiscais, sente-se afetado diante dos costumeiros crimes contra a ordem tributária, perpetrados por pessoas inidôneas, físicas ou jurídicas. Cada centavo desviado dos cofres públicos pelos sonegadores representa, no frigir das contas, aumento do fardo tributário imposto aos súditos em geral e, em especial, aos contribuintes zelosos.

Naturalmente, em meio ao crescente aumento da nossa carga tributária, surgem situações de inadimplência, pura e simples. Mas isso está longe de caracterizar delitos de natureza fiscal propriamente ditos. É o caso de quem apresenta regularmente suas declarações ao fisco, reconhece obrigações pecuniárias e, por variados motivos, não consegue quitá-las.

Quando isso acontece, isto é, diante da falta de pagamento do tributo, a Fazenda Pública executa o devedor e se lança à procura de bens para garantir seu crédito. Antes mesmo dessa busca o juiz manda citar o executado, concedendo-lhe o prazo de cinco dias para pagar o débito ou oferecer um bem à penhora.

Do contrário, o oficial de justiça fica autorizado a proceder a chamada livre penhora. Finalmente, não sendo encontrado bens suficientes, o magistrado tem o poder de penhorar qualquer valor encontrado na conta bancária do devedor.

Essa atividade judiciária nem sempre é procedida de serenidade ou cautelas legais e humanitárias. Não raro, o juiz, com simples clic em seu computador, bloqueia valores absolutamente impenhoráveis, como aposentadorias de idosos, deixando-os à deriva, sem condições de adquirir medicamentos ou de ir ao supermercado.

Nesse caso, a vítima precisa sair correndo atrás de um advogado para recuperar o desfalque, quase sempre indispensável à própria sobrevivência. Mesmo quando o erro judiciário é reconhecido, a famosa burocracia canina do "ao, ao" ou do simplório "diga, diga" leva dias, senão meses para ser efetivamente corrigida. Já vi idosos morrendo por à míngua de recursos mínimos com aposentadoria bloqueada ilegalmente pela justiça.

O pior, a jurisprudência pátria não está nem aí. As decisões caminham no sentido de validar e robustecer essas decisões absurdas desumanas, tomadas às cegas. Nem mesmo a Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo, que em 2008 criou uma comissão para analisar a questão, parece ter encontrado uma luz no fim do túnel

Essa prática nefasta foi instituída pela Lei Complementar 118/2005 , que introduziu o artigo 185-A no Código Tributário Nacional, e pela Lei 11382/06, que acrescentou o artigo 655-A no Código de Processo Civil.

Considerando que a administração pública é useira e vezeira na imbecilização de carimbos para identificar esse e aquele serviço, bem que poderia criar mais um para avisar ao juiz da execução que determinados devedores não são criminosos. Com isso, contribuiria para evitar que um aposentado de noventa anos, mero devedor do erário, vítima de algum infortúnio, não tivesse sua aposentadoria penhorada "no escuro".

Não é tão difícil separar o joio do trigo. Não é preciso assassinar.

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