Embora os menores de 16 anos sejam absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil (excepcionalmente, poderão fazê-lo por meio de representação), nem por isso eles escapam da mira do Fisco. Como é público e notório, a Receita Federal mantém convênios com os cartórios de registro de nascimento em praticamente todo o país para fornecer sem burocracia o número do Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) aos recém-nascidos. A voracidade do Leão é tamanha que os bebês de Pindorama já nascem “cepefados”.
À parte os questionamentos sobre a fixação da idade de 16 anos a partir da qual alguém pode praticar atos da vida civil (o teto foi fixado há exatos 100 anos, em 1916), na seara fiscal toda pessoa física, independentemente da idade, está sujeita a figurar no polo passivo da obrigação tributária. Esse vínculo é compulsório, já que decorre de lei. A criança herdeira de patrimônio ou beneficiária de rendimentos, por exemplo, não escapará da tributação. No caso, a relação fisco-contribuinte se perfaz com o representante legal do infante.
Menor dependente
Na declaração anual do Imposto de Renda (IR), são lançados todos os rendimentos dos dependentes do titular, salvo se houver opção pela tributação dos ganhos em separado. Todavia, no dia a dia da malha fiscal verifica-se que essa regra nem sempre é respeitada. Há quem, propositadamente ou não, lança mão dos abatimentos atinentes aos encargos de família e omite os respectivos rendimentos dos dependentes que informados na declaração.
Golpe contra a esperteza
Para os que assim agiam intencionalmente, o Fisco criou uma barreira intransponível com a finalidade de impedir a burla, ao menos em relação ao filhos com idade superior a 14 anos. O CPF do menor agora deverá ser indicado na declaração do IR – já a partir deste ano. Em breve, a obrigatoriedade certamente se estenderá aos bebês. Afinal, como dissemos antes, nada impede que eles sejam beneficiários de rendimentos ou de legados patrimoniais.
Não temos vocação para lançar flores ao Fisco ou para adular a juba dos leões. Afinal, salvo os ladrões da Lava Jato, o Leviatã explora e tritura diariamente os cidadãos honestos na exata medida em que eles se preocupam com o cumprimentos de suas obrigações cívicas. Em nosso país, é avassalador o preço de ser honesto.
Entretanto, no tocante à questão do CPF das crianças, há lógica jurídica na iniciativa do Leão. Ao menos enquanto as deduções permitidas na declaração do IR permanecerem intimamente ligadas ao contexto econômico do montante tributável e ao critério da pessoalidade. Os abatimentos da renda bruta, que são favores fiscais, dizem respeito exclusivamente a quem produziu o ganho tributável (cônjuge, filhos etc.).
Assim é que quando o suposto benefício das deduções relacionadas a um filho, que tem rendimentos tributáveis, resulta aquém do que seria apurado na hipótese de as declarações serem apresentadas em separado, a lei dá a opção do caminho menos oneroso. Em ambas as declarações seus titulares têm assegurado o direito às deduções cabíveis sobre o valor levado à tributação. Buscar outra saída pode custar caro.
Realidade familiar
Isso não significa que as regras hoje aplicáveis à dedutibilidade dos encargos de família dos contribuintes estejam em harmonia com o quadro socioeconômico do país. A começar com a idade máxima para dedução do IR dos filhos dos súditos – fixada em 21 anos ou, se universitários, em 24. Basta verificar as estatísticas oficiais para constatar que ao redor de muitos chefes de família existem filhos e outros parentes desempregados, em idade superior à estipulada pela Receita Federal. Como consequência, a sobrevivência desses infortunados depende do pai, da mãe ou mesmo da aposentadoria do avô.
Uma reflexão sobre o assunto viria em boa hora. Com a palavra o eventual representante do povo junto ao Congresso Nacional que estiver lendo estas linhas.