No vão da jaula
Nessa toada do "preço da civilização", surgem sinais da chegada de um novo imposto! Renascendo das cinzas, será uma espécie de recriação do famoso "imposto da saúde" versão para 2015 da polêmica e hoje extinta CPMF. O tributo foi idealizado na metade da década de 1990 pelo bem intencionado médico Adib Jatene, então nomeado ministro da Saúde. Ele sonhava tirar do coma a saúde pública de Pindorama. Como se sabe, logo surgiriam os pesadelos dos desvios de finalidade engendrados por políticos na destinação dos salvadores recursos. Sem pestanejar e para preservar o honrado nome, o famoso cirurgião demitiu-se.
A Receita Federal deflagrou na última quarta-feira, em Salvador (BA), uma operação de combate a crimes tributários envolvendo pessoas físicas. A ação leva o nome de "Recibos Falsos e conta com o apoio da Polícia Federal e do Ministério Público Federal.
A fiscalização constatou a inclusão de falsas despesas médicas, odontológicas e de instrução em mais de 2 mil declarações, dos anos-calendário 2008 em diante. O foco das investigações é um grupo de contribuintes que contratou os serviços de um mesmo contador. Na tentativa de burlar o erário, os contribuintes intimados pela Receita apresentaram recibos e notas-fiscais eletrônicas falsas. As consultas médicas e os tratamentos dentários ou de fisioterapia declarados nunca aconteceram.
Com a fraude, os contribuintes objetivavam redução do imposto a pagar ou aumento do imposto a restituir. Nunca é demais alertar nossos leitores para acionarem o desconfiômetro diante de promessas ou facilidades para reduzir o valor de imposto a pagar ou o aumento do imposto a restituir.
Ao longo do tempo, com os avanços dos estudos científicos no campo das finanças públicas, o tributo passou a ser encarado como contribuição decorrente da solidariedade coletiva, uma espécie de seguro em grupo para garantir serviços públicos de saúde, segurança, educação etc. É de Oliver Wandel Holmes, destacado magistrado da Suprema Corte dos Estados Unidos da América, a célebre frase "tributo é o preço da civilização".
Mais recentemente, porém, a causa do imposto deixou de ter explicação preponderante na prestação efetiva de serviços à comunidade. A força motriz da imposição tributária passou a ser, simplesmente, o tamanho do Leviatã, cuja gula sempre foi e será insaciável.
O lado nefasto disso é que atividades vitais do Estado, como educação, saúde, segurança e outros serviços inerentes e inafastáveis ao bem-estar coletivo, já não seriam mais cobertos apenas pela escorchante carga tributária retirada de forma direta da economia popular. Objetivamente, a arrecadação dos impostos, em que pese o rótulo de suas finalidades, passou a ter destinos insondáveis.
Sem retribuição
Alguns exemplos do cotidiano dão a dimensão exata da distância abissal entre o Estado arrecadador e o Estado não-retributivo: se o súdito quiser saúde, precisa contratar um plano privado para atendê-lo; se quiser educação de qualidade para os filhos, terá de socorrer-se na rede privada de ensino; se quiser segurança, terá de contratá-la a preço de mercado; se quiser asfalto na rua, terá de suportar o seu elevado preço, porque, segundo a legislação, o IPTU pago anualmente não se vincula a essa atividade pública; se o cidadão-contribuinte utilizar-se da rede pública de esgoto (como se existisse outra opção), terá de pagar praticamente o mesmo valor da taxa do consumo de água. Para não ser cansativo com o leitor, mais um exemplo dessa distância, agora com sintoma de neurose arrecadatória: se o súdito for deficiente visual, mesmo sem enxergar a luz do dia, nem por isso estará desobrigado do pagamento da taxa de iluminação pública!
E assim caminha a história da arrecadação tributária. Cobra-se taxa até dos cegos pela luz que eles não veem! Um preço amargo pago pela civilização.
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