Ao longo dos anos, temos insistido na tese de que pedágio nada mais é do que a contraprestação de um serviço público. E como todo serviço público é remunerado por taxa, espécie tributária, por consequência o valor cobrado de usuários das rodovias pedagiadas deve ser regido por lei.
Assim como no Direito Penal vigora o princípio segundo o qual nullum crimem nulla poena sine praevia lege (“não há crime, nem pena sem lei anterior que os defina”), no campo da tributação igualmente impera a regra nullum tributum sine praevia lege (“não há tributo sem lei anterior”). Ambos os princípios, corolários da legalidade, encontram-se inscritos com status de cláusula pétrea na Constituição Federal brasileira. Na tradução popular, estabelecem que não há crime nem pena, menos ainda tributo sem prévia lei formal.
Serviço público
Não se diga que o pedágio cobrado dos motoristas brasileiros está fora do conceito de serviço público – e por isso o valor fixado dependeria apenas de regras contratuais – só porque a atividade em questão é exercida pelo setor privado. Ledo engano.
Serviço público, na lição do mais acatado administrativista brasileiro da atualidade, Celso Antonio Bandeira de Mello, é “toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administrados, prestada pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de direito público – portanto consagrado de prerrogativas de supremacia e de restrições – instituído pelo Estado em favor dos interesses que houver definido como próprios do sistema normativo”.
Noutro dizer, para caracterizar a natureza jurídica da contraprestação que se paga compulsoriamente por um serviço público prestado ao cidadão (se é imposto, taxa, tarifa ou preço público), não basta indagar se o seu prestador é o próprio poder público ou um concessionário desse mesmo serviço. A fonte arrecadadora é o dado menos importante. O porte de arma, por exemplo, hoje é expedido pelo poder público mediante pagamento de uma taxa. Amanhã, se essa atividade for transferida à iniciativa privada, mediante concessão, não mudará a essência do serviço público prestado, que continuará condicionado ao pagamento compulsório da mesma taxa.
Sem opção
A conservação das nossas rodovias, tarefa essencialmente afeta ao poder público, no decorrer dos tempos foi confiada à iniciativa privada, graças ao gigantismo estatal crescente. Transfigurou-se em empreendimento mercantil como outro qualquer. Como tal, sua finalidade precípua é o lucro, o que naturalmente envolve custos materiais, administrativos e humanos.
Aqui surge a principal questão: além de não ser conferido ao cidadão usuário o direito de optar por uma via alternativa, o preço cobrado individualmente dos usuários não é autorizado por lei e sim por contratos, que ficam sujeitos a termos aditivos, revisões de cláusulas e outras mudanças do gênero, costumeiramente entabuladas em gabinetes, por isso nem sempre transparentes.
Estudos
Na edição do último final de semana, a Gazeta do Povo publicou exaustiva reportagem reunindo estudos sobre os critérios de cobrança do pedágio no estado do Paraná. De acordo com a matéria – assinada pela colega jornalista Kátia Brembatti –, além de três Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) abertas pela Assembleia Legislativa do Paraná, outros órgãos da mais elevada seriedade, como a Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), Fundação Instituto de Administração (Fia) e os Tribunais de Contas da União e do Estado do Paraná, apontaram distintas conclusões em relação ao valor cobrado dos usuários. A grande maioria dos estudos apontou distorções significativas em prejuízo dos motoristas.
O imbróglio está a merecer resposta definitiva dos deputados paranaenses. Impõe-se encarar o pedágio como uma taxa, espécie do gênero tributo. Em homenagem à segurança jurídica das próprias concessionárias e dos usuários, sua disciplina, compreendendo o quantum a ser pago e os critérios de reajustes, deve ser objeto de lei e não de contratos sujeitos a renovações entabuladas em gabinetes.
NO VÃO DA JAULA
***A partir da declaração do Imposto de Renda (IR) deste ano, os profissionais das áreas de saúde, de odontologia e de advocacia que recebem rendimentos de pessoas físicas terão que informar à Receita o CPF dos clientes para os quais prestaram serviços. Até a declaração do ano passado, o valor era informado de forma global, sem a a informação individualizada.
****Com a mudança, muitas declarações deixarão de cair na malha fina. Estima-se que haverá uma sensível diminuição das filas de contribuintes que se deslocam ao órgão fiscal para exibir comprovantes de despesas, principalmente com médicos e hospitais.