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Paul Krugman

Comparar Obama com Reagan é revelador

Republicano Reagan era um grande gastador de recursos | Lee Celano/Reuters
Republicano Reagan era um grande gastador de recursos (Foto: Lee Celano/Reuters)

Os republicanos amam contrastar o histórico do presidente Barack Obama com o de Ronald Reagan (1911-2004).

Poderia-se pensar que a comparação mais relevante deveria ser com George W. Bush, que estava – ao contrário de Obama – presidindo sobre uma enorme perda de empregos no setor privado.

Como explicarei a seguir, a depressão econômica que Reagan enfrentou era muito diferente da atual e muito mais fácil de se lidar. Ainda assim, a comparação Reagan-Obama é reveladora, em alguns aspectos.

Pois a verdade é que, pelo menos em uma dimensão, a dos gastos do governo, havia uma grande diferença entre as duas presidências depois do ajuste da inflação nas despesas totais do governo, e o crescimento populacional aumentou mais rápido em um do que no outro.

Considero ser especialmente instrutivo olhar os níveis de despesas no terceiro ano da administração de cada um – o primeiro trimestre de 1984, no caso de Reagan, e o primeiro trimestre de 2012, no de Obama – em comparação com os quatro anos anteriores, que, em ambos os casos, corresponde ao começo da crise econômica. Sob um presidente, as despesas per capita reais eram 14,4% maiores do que nos quatro anos anteriores; sob o outro, menos da metade: 6,4%.

Muitos leitores já devem ter percebido qual é o truque aqui: Reagan, e não Obama, era o grande gastador. Embora tenha havido um breve surto de despesas governamentais no começo da administração Obama – principalmente com programas de auxílio emergencial, como seguro-desemprego e o Programa de Assistência Nutricional Suplementar – esse descontrole já é passado.

De fato, as despesas governamentais estão caindo rapidamente, com o verdadeiro gasto per capita diminuindo num ritmo jamais visto desde a desmobilização que veio após a Guerra da Coreia.

Por que as despesas governamentais eram muito mais fortes sob Reagan do que na presente crise? "O Keynesianismo Militar" – o grande desenvolvimento militar de Reagan – teve um forte papel. Mas a maior diferença foram as despesas reais per capita em níveis estadual e local, que continuaram a subir sob Reagan, mas caíram significativamente desta vez.

E isso reflete um ambiente político alterado. O fato é que governos estaduais e locais costumavam se beneficiar de compartilhamento de receita – o auxílio automático do governo federal, um programa que Reagan encerrou, mas só após o fim da crise.

O mais importante é que nos anos de 1980, o dogma anti-imposto não havia desenvolvido o mesmo efeito que tem hoje, por isso, os governos estaduais e locais costumavam ser muito mais dispostos do que são agora em cobrir déficits com aumentos tributários temporários, evitando, assim, cortes bruscos nas despesas.

Para resumir, se quisermos ver uma resposta do governo em épocas de dificuldade econômica com as políticas de "gaste e cobre impostos" que os conservadores sempre condenam, deveríamos olhar para os anos da era Reagan – e não Obama.

Então, a recuperação econômica de Reagan demonstra a superioridade da teoria economia keynesiana? Não exatamente.

Pois a verdade é que a crise dos anos de 1980 era muito diferente de nossa depressão atual, que foi trazida por um excesso do setor privado: sobretudo, um surto no déficit doméstico durante os anos Bush. A crise de Reagan pôde e foi trazida a um fim rápido quando se decidiu ceder e cortar as taxas de juros, causando um gigante crescimento imobiliário. Essa opção não está mais disponível porque as taxas já estão quase zeradas.

Como apontaram muitos economistas, a América está atualmente sofrendo de um caso clássico de deflação deficitária: em toda a economia as pessoas estão tentando pagar suas dívidas cortando os gastos, mas, ao fazerem isso, elas mesmas estão causando a depressão que faz seus problemas de déficit piorarem. Essa é exatamente a situação na qual as despesas do governo deveriam temporariamente contrabalancear a crise dos gastos privados e dar ao setor tempo para reparar suas finanças. Isso não está acontecendo.

Reagan pode ter sido a favor de diminuir a presença do governo, mas, na prática, ele presidiu com muito crescimento de despesas – e agora é disso exatamente o que a América precisa.

Tradução de Adriano Scandolara.

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