Em muitos momentos no trabalho, e também fora dele, passamos por dilemas em que nossos lados pessoal e profissional são colocados à prova diante de nossa própria sabedoria e discernimento. Da mesma maneira, sabemos que cada um de nós tende a decidir com maior ou menor peso da razão e da emoção. Hoje, em especial, trago uma história em que os envolvidos precisaram ter muito controle desses sentimentos para que as suas decisões não acarretassem em situações desagradáveis ou consequências ainda piores.
Marco e Celso se conheceram na faculdade. Os dois ingressaram juntos no curso de Administração, ainda muito jovens. Como é comum na graduação, ao término do curso, os colegas acabaram seguindo caminhos distintos. Marco conseguiu um estágio em uma multinacional, e Celso preferiu trabalhar fora do país e terminar a faculdade no exterior. Apesar da distância, eles nunca perderam contato. Os dois se formaram na mesma época, porém, em contextos muito diferentes. Celso voltou ao Brasil como gerente comercial da empresa em que trabalhava na Europa. Já Marco não conseguiu ser efetivado naquela multinacional e, após pegar o diploma, ficou desempregado.
Pela proximidade, Celso indicou o amigo para um processo seletivo na empresa para uma oportunidade de analista no setor de qualidade. Como Marco possuía muitas qualidades, acabou sendo contratado. Dois anos depois, o destino juntou-os uma vez mais. Marco acabou sendo transferido para o setor de Celso, e atuaria como um de seus subordinados. A transferência, que no começo causou um pouco de desconforto e estranheza entre os amigos, revelou-se uma grande aliança com o passar do tempo.
Tudo estava indo bem, até que Marco não conseguiu mais guardar um segredo e pediu para ter uma conversa a sós com Celso, seu chefe. Na conversa revelou que havia iniciado um relacionamento com outra funcionária do mesmo setor já há algum tempo. Entretanto, como a empresa não tolerava esse tipo de envolvimento devido a suas políticas internas, não sabia mais como esconder.
Celso, no papel de chefe, falou a seu amigo que infelizmente não poderia fazer nada para ajudá-lo, uma vez que aquela regra fazia parte das políticas da empresa. Aconselhou que se o relacionamento fosse realmente promissor, infelizmente um dos dois precisaria pedir demissão. Marco ficou desapontado com a atitude do chefe e amigo no início. Entretanto, após alguns dias, acabou compreendendo o papel de gestor que ele tinha de desempenhar, por mais que ele fosse seu amigo de longa data. Sendo assim, Marco decidiu, junto de sua companheira, sacrificar o próprio cargo, já que ela estava havia mais tempo na empresa e tinha um maior potencial de crescimento ali.
Podemos dizer que esse é um típico exemplo de situação complicada que nós, eventualmente, passaremos. Podemos aprender algumas lições com essa história. Celso precisou exercer seu papel de líder, não se deixando levar pela afinidade que possuía com o amigo. Regras foram feitas para serem cumpridas, sejam elas agradáveis ou não. Entretanto, mesmo com toda a racionalidade exposta por Celso, ele, valendo-se da transparência que Marco, seu subordinado e amigo, demonstrou para com ele, mostrou seu lado humano e emocional ao dar a opção para que os dois decidissem quem sairia da empresa. Celso sabia que poderia perder um grande amigo e um bom funcionário com essa decisão, mas que não poderia decidir por eles, e nem agir desonestamente abrindo uma exceção na empresa permitindo o relacionamento, ato que poderia ser mal visto pelos demais colegas (que poderiam exigir o mesmo direito) e, também, custar-lhe o emprego.
Ademais, podemos notar profissionalismo em ambos. Marco mostrou-se maduro e não guardou mágoas do chefe ambos continuam amigos até hoje. Ele poderia ter titubeado e até entrado em conflito, mas preferiu internalizar a decisão e entendê-la.
Quando se fala nesse tipo de decisão (ou indecisão), às vezes é preciso refletir duramente e abrir mão de certas coisas para que se possa ter acesso a outras. Eu mesmo já me deparei com uma escolha dessas.
Em uma das empresas em que trabalhei, fui promovido várias vezes. Junto de cada promoção, era necessário mudar de cidade. Assim, morei em Recife, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Recife novamente e Rio de Janeiro novamente até que, na última promoção, para um dos maiores cargos da empresa, eu precisaria morar no exterior. Era a chance de concretizar meu sonho e tornar-me um executivo internacional.
Entretanto, minha esposa, já saturada de tantas mudanças e preocupada com o futuro de nossos três filhos também, disse-me que dessa vez ela não iria. Eu teria que decidir entre a família e o futuro na carreira naquela empresa. Escolhi o futuro de minha família e, por consequência, fui demitido da companhia. Aquela foi a melhor oferta que eu poderia ter recebido na época, mas algumas vezes precisamos refletir e seguir por aquilo que nos completa ou que consideramos ter mais valor.
Hoje não me arrependo um segundo sequer da minha escolha. Graças a ela construí minha própria empresa e construí, também, um futuro muito melhor junto de minha família.