Os sinais de alívio que apareceram na economia brasileira no segundo trimestre ficaram para trás. O IBGE informou ontem que o Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país) recuou 0,8% no terceiro trimestre, numa queda mais intensa e disseminada. Se no segundo trimestre a queda fora menor (-0,4%) e com pequenas altas na indústria e nos investimentos, entre julho e setembro houve retração generalizada, afetando ainda agricultura, serviços, exportações, importações, consumo das famílias, gastos do governo e ainda 11 de 13 subsetores avaliados pelo IBGE. O resultado veio pior do que o esperado por analistas, que, agora, já não descartam a possibilidade de uma estagnação ou até mesmo uma nova retração em 2017, ainda que o cenário básico seja de crescimento.
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Com isso, o país caminha para registrar sua recessão mais longa e intensa da história recente — superando até mesmo as crises de 1981 a 1983, quando houve moratória da dívida externa, e de 1989 a 1992, no confisco do governo Collor.
Com a queda do último trimestre, o PIB brasileiro retornou ao patamar de seis anos atrás. Frente ao terceiro trimestre de 2015, a queda foi de 2,9%. O resultado acumulado em 12 meses ficou negativo em 4,4% — ligeiramente melhor do que o tombo de 4,8% acumulado no segundo trimestre.
“Já estamos com previsão de (crescimento) zero para 2017. Um pouco por inércia, um pouco por estatística, (a retomada) só em 2018. Até lá o mercado de trabalho já parou de piorar. A perspectiva é ainda muito desfavorável por causa dessa incerteza e dos efeitos esperados de uma política fiscal mais apertada — afirma José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator e professor da FEA/USP.
Herança de 2016
Pela ótica da produção, a indústria caiu 1,3% frente ao segundo trimestre, enquanto na agropecuária a queda foi de 1,4%. O setor de serviços, por sua vez, teve perda de 0,6%.
Já a ótica da despesa apontou uma redução de 0,6% do consumo das famílias na comparação com o trimestre anterior, acompanhada por recuo de 0,3% do consumo do governo. O investimento, medido pela Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), caiu 3,1%. Das 12 atividades da economia, só duas tiveram alta frente ao segundo trimestre: extrativa-mineral (3,8%) e serviços de informação (0,5%). O indicador de atividades imobiliárias ficou estável, e os outros nove segmentos recuaram.
“Não é meu cenário dominante, mas aumentou a probabilidade de não se ter crescimento em 2017. Há muita incerteza, inclusive com a presidência de Donald Trump, de como ficarão a taxa de câmbio e os juros. Mesmo um crescimento de 1,1% não é para celebrar. Mas não há que ser excessivamente dramático, nada dura para sempre. A Grande Depressão nos Estados Unidos também terminou”, diz o economista-chefe do Goldman Sachs para a América Latina, Alberto Ramos.
Um dos fatores determinantes para o desempenho da economia brasileira em 2017 é a trajetória da taxa de juros. Ontem, o Comitê de Política Monetária (Copom) reduziu a Selic de 14% para 13,75% ao ano.
“Se o Banco Central cortar pouco a taxa de juros, a chance de um crescimento perto de zero aumenta. Se chegar ao fim de 2017 em 11,25%, como é nossa estimativa, a possibilidade de estagnação é baixa. Mas há risco de recessão, sim, se a crise política recrudescer e gerar uma crise de governabilidade”, avalia o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges.
Uma das barreiras para o desempenho em 2017 é o chamado carregamento estatístico deste ano. Ou seja, quanto o resultado de 2016 vai influenciar o do ano que vem. Se a economia ficar estável ao longo de 2017, ainda assim o PIB registrará uma queda de 0,7% por causa desse efeito estatístico.
“Não dá para descartar um PIB negativo, porque depende da evolução dos fundamentos e da conjuntura internacional. Até porque as projeções não estão muito distantes de zero ou negativo. Ainda esperamos alguma recuperação, mas mais lenta e gradual do que anteriormente”, aponta o economista do Santander Rodolfo Margato.
Forças para a retomada
Uma das principais dúvidas entre os economistas é de onde virá a força para a retomada da economia. O setor externo, que vinha sendo apontado como uma saída, já vê seu impacto positivo se dissipar diante da queda do dólar. Já o consumo das famílias — que acumula sete trimestres de queda, após mais de 11 anos de altas seguidas — se encontra restrito pelo desemprego e pela queda na renda, além do envidamento. Por outro lado, a incerteza ainda emperra os investimentos.
Gustavo Rangel, economista-chefe para América Latina da ING Global Markets, previa há algumas semanas um crescimento de 1,7% para o ano que vem. Hoje, sua estimativa é de 0,9%.
“A recuperação está bastante difícil, porque todo mundo está bastante endividado. Então, enquanto não houver alívio nesse endividamento, dificilmente haverá recuperação de investimento e consumo”, diz Rangel.
As projeções positivas para a economia em 2017 são ancoradas nas expectativas de corte de juros, desaceleração da inflação e bons desempenhos da agricultura e de alguns segmentos da indústria.
“As perspectivas para a colheita em 2017 são bastante favoráveis. A safra de produtos relevantes deve crescer dois dígitos, de acordo com projeções do IBGE e da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). Em 2016, houve muita quebra de safra, principalmente do milho. A agricultura sozinha representa só 5% do PIB, mas o agronegócio como um todo espera um cenário mais favorável no ano que vem”, comenta Margato.
Sergio Vale, da MB Associados, diz que o setor automobilístico também pode ajudar no resultado positivo no ano que vem:
“Se mantivermos a média diária de oito mil unidades por dia em 2017, o crescimento das vendas de automóveis e comerciais leves seria de 5%.