O avanço da recessão, que compromete a renda atual de milhões de famílias, ameaça também o futuro de muitas delas. O desemprego entre chefes de família cresceu 53% em apenas um ano, segundo o IBGE. Para especialistas, a perda da principal fonte de renda da casa levará jovens a antecipar a busca por trabalho e deixar os estudos em segundo plano, o que poderá limitar sua renda mais adiante.
INFOGRÁFICO: Veja a evolução da taxa de desocupação da população economicamente ativa
De acordo com a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) de janeiro, de cada dez pessoas sem trabalho nas seis maiores regiões metropolitanas do país, três eram chefes de família – a maior proporção, para o primeiro mês do ano, desde 2003. Ao todo, estavam desempregados 560 mil homens e mulheres que antes eram os principais responsáveis pelo sustento do lar, quase 200 mil a mais que no início de 2015.
A mesma pesquisa revela que, do total de 1,88 milhão de desocupados nas metrópoles, 269 mil eram pessoas em busca do primeiro emprego, 45 mil a mais que um ano antes. O avanço desse contingente é menor que o do total de chefes de família sem emprego. Ainda assim, o número de indivíduos procurando trabalho pela primeira vez é o maior dos últimos cinco anos para meses de janeiro.
“Um jovem que se dirige precocemente ao mercado de trabalho pode estar comprometendo seu futuro, impedindo uma condição mais favorável lá na frente. Quem entra com baixa escolaridade vai ganhar pouco e terá menos condições de subir na carreira”, diz João Saboia, professor emérito do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
O economista Hélio Zylberstajn, professor da Universidade de São Paulo e pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), lembra que no passado recente houve uma redução significativa na participação dos jovens no mercado de trabalho, por bons motivos. “Com o pai e a mãe trabalhando e os salários crescendo acima da inflação, muitos jovens puderam se concentrar nos estudos. Foi uma conquista importante, que está se perdendo agora”, lamenta.
O drama não se restringe ao núcleo familiar. A economia toda sofre quando diminui a escolaridade dos novos trabalhadores. Com profissionais menos qualificados, ficará mais difícil obter ganhos de eficiência, o que vai limitar o crescimento do PIB quando a atividade econômica se reaquecer.
“A crise prejudica a formação e a acumulação de capital humano, que no Brasil já não é lá essas coisas”, diz Zylberstajn. “Ou seja, o drama é instantâneo, mas também terá efeitos lá na frente.”
Por conta própria
O índice de desocupação dos chefes de família só não é maior porque muitos dos demitidos passaram a trabalhar por conta própria, na informalidade. É o caso do almoxarife Luís Antônio Gomes de Lima, 47 anos. Quando a loja em que trabalhava fechou as portas, há um ano, ele passou a fazer bicos como pedreiro e pintor. “A renda até que não caiu tanto. O pior é ficar sem carteira assinada, sem os benefícios”, diz Lima, responsável pelo sustento da mulher e de um filho de três anos. Segundo a PME, em janeiro havia 4,61 milhões de pessoas trabalhando por conta própria nas principais metrópoles, maior número para o mês desde o início da série histórica, em 2002.
Empresas dispensam até profissionais mais qualificados
Com a junção da crise brasileira com a crise da Petrobras e do setor, a empresa demitiu centenas de pessoas.
Érico Rodriguesadministrador.
Se há jovens largando o estudo e precipitando a entrada no mundo do trabalho, a economia brasileira sentirá falta de profissionais qualificados quando voltar a crescer. Mas, enquanto a crise não acaba, as empresas continuam abrindo mão de funcionários mais instruídos.
Depois de pelo menos uma década de crescimento, o mercado formal voltou a dispensar os mais experientes e escolarizados em 2014. Naquele ano, o país fechou 134 mil postos de trabalho para pessoas com 30 anos ou mais, formadas no ensino médio ou superior. Em 2015, houve 818 mil dispensas de profissionais com essas características. Em janeiro deste ano, mais 49 mil demissões.
O administrador Érico de Oliveira Rodrigues, que tem MBA em controladoria e finanças, foi demitido em agosto da companhia em que trabalhava, uma multinacional da indústria do petróleo. “Com a junção da crise brasileira com a crise da Petrobras e do setor, a empresa demitiu centenas de pessoas”, conta.
Érico e a esposa, Fabiola Cottet, já pensavam em deixar o país. A demissão dele, que tinha o maior rendimento, apressou a decisão: os dois vão morar no Canadá a partir de abril. Ele fará uma pós-graduação e tem permissão para trabalhar até 20 horas por semana; ela poderá trabalhar até 40 horas.
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