Futuro em xeque
Ao longo do tempo, a implantação de vários produtos, equipamentos e serviços foi vista com ressalvas pelo Estado ou por setores empresariais. Houve casos em que a falta de regulação acabou se mostrando benéfica ou prejudicial:
Música na rede
No início da década passada, gravadoras e artistas entraram em guerra contra o Napster, serviço de compartilhamento gratuito de músicas pela internet. Nos anos seguintes, coube a Steve Jobs enxergar a oportunidade e lançar a loja virtual iTunes, que vende canções e discos em formato digital. Hoje também são comuns os serviços que oferecem músicas via streaming o que comprova que escutar e compartilhar música pela internet era mesmo um caminho sem volta.
Carros
Uma lei de 1865 na Inglaterra exigia que os primeiros veículos movidos a vapor tivessem uma tripulação de três pessoas, e que uma delas carregasse uma bandeira vermelha à frente, caminhando, para alertar os pedestres. A lei caiu alguns anos depois e permitiu o desenvolvimento de veículos mais rápidos e melhores.
Derivativos
Exemplo de área em que a falta de regulação causou problemas. A crise econômica de 2008 começou com em um mercado de títulos lastreados por hipotecas que não tinham supervisão do governo norte-americano. As apostas foram altas e com informações ruins. Dos cinco maiores bancos de investimentos dos Estados Unidos, três sucumbiram à crise e os efeitos foram sentidos por economias de todo o mundo.
Cheque pré-datado
Foi uma inovação brasileira criatda pelos lojistas, empresários e consumidores para lidar com a inflação alta. O governo não interferiu e, com o tempo, a própria Justiça interveio a favor da alternativa, decidindo que o cheque pré não poderia ser apresentado antes da data combinada entre as partes.
Cartão internacional
O cartão de crédito é um grande avanço para transações internacionais, mas o Brasil só permitiu seu uso no governo Collor. Por anos os brasileiros tiveram de viajar com dinheiro em espécie e não podiam comprar pelo correio com o cartão. Hoje, com o "boom" das compras on-line, parece impensável não contar com esse recurso.
Poluição
O governo Obama implementou em seu primeiro mandato uma série de padrões de eficiência a serem seguidos pela indústria automobilística de todo o país. Além de tornar os carros mais econômicos, as medidas pretendem diminuir a emissões de gases que contribuem para o efeito estufa. Neste caso, ao obrigar as indústrias a seguirem os padrões, a regulação acaba contribuindo para a inovação.
A controvérsia recente entre a Urbs e os taxistas de Curitiba que usavam aplicativos de celular para buscar passageiros escancarou mais uma vez o descompasso que cerca a disseminação de novas tecnologias e o papel do Estado em regular estes serviços e produtos.
O caso de Curitiba, em que a utilização dos apps foi colocada em xeque devido a uma necessidade de regularização, é emblemático, mas está longe de ser o único exemplo recente da queda de braço entre o poder público e empreendedores e os próprios usuários, que ficam no meio do fogo cruzado.
Polêmicas semelhantes têm ganhado corpo porque, em geral, o Estado resolve agir somente quando os novos produtos e serviços já estão disseminados e ameaçam, de alguma forma, certos setores da economia ou o próprio poder público. É o caso da briga judicial que cerca o serviço de hospedagens pela internet Airbnb, plataforma que reúne 500 mil imóveis em 190 países. A prefeitura de Nova York tem apertado o cerco contra os criadores do serviço, atendendo a uma demanda das empresas de hotelaria afinal, ao mesmo tempo que incentiva o aluguel "informal" de casas e quartos, a plataforma não paga impostos.
Para especialistas, as controvérsias partem justamente da dificuldade do Estado em se antecipar às novas tecnologias e criar regras e parâmetros que delimitem qual caminho pode ser seguido. Os efeitos deste descompasso são mais sentidos quando a inércia do poder público, ao invés de deixar o caminho livre para empreendedores e usuários, atravanca a inovação.
"Até recentemente, o 3G e o 4G não puderam ser implantados no Brasil até que o governo regulasse esse serviço. Para nós, empresários, isso é péssimo, porque às vezes estamos anos à frente para lançar algo mas esbarramos na falta de uma legislação que contemple essas tecnologias", afirma o diretor executivo da Morphy Digital Group, Marlon Souza.
O mesmo pode ser aplicado para a demora no país em criar um marco regulatório para o uso de sementes transgênicas, que atrasou em alguns anos o desenvolvimento de variedades específicas para certos climas especialmente no Paraná, que inicialmente lutou contra a inovação.
"A burocracia é o inimigo número um da inovação. Ela não necessariamente é ruim, afinal, seu objetivo é buscar isonomia, justiça. O problema é quando ela se transforma em uma barreira que freia qualquer empreendimento e só traz dificuldades", reforça o diretor-executivo do Centro Internacional de Inovação da Fiep, Filipe Cassapo.
Seja no Brasil ou no exterior, algumas tecnologias recentes ainda devem desafiar o Estado por um tempo antes que se chegue a um modelo de regulação razoável. Caso das impressoras 3D, que permitem a impressão doméstica de produtos variados que podem ser comercializados em seguida de próteses dentárias a biquínis, passando por itens de decoração.
De olho na tela
O "boom" dos smartphones e das redes sociais também tem desafiado autoridades e colocado o próprio usuário como alvo. O Waze, aplicativo que informa em tempo real condições do tráfego nas cidades e a localização de blitze policiais, fez com que o Batalhão de Polícia de Trânsito (BPTran) de Curitiba passasse a monitorar o dispositivo a fim de cercar os motoristas que "burlavam" as operações por meio do app iniciativa implantada em várias outras cidades brasileiras.
Colaborou Guido Orgis
Reforma tributária promete simplificar impostos, mas Congresso tem nós a desatar
Índia cresce mais que a China: será a nova locomotiva do mundo?
Lula quer resgatar velha Petrobras para tocar projetos de interesse do governo
O que esperar do futuro da Petrobras nas mãos da nova presidente; ouça o podcast