Algo impensável para quem mora nas cidades, ter energia disponível por, no máximo, três horas diárias ainda é um luxo para muitas comunidades isoladas que não fazem parte do Sistema Interligado Nacional (SIN) de energia. Mas um projeto em fase de testes promete levar luz em tempo integral a essas pessoas.
A Itaipu Binacional, por meio da Fundação Parque Tecnológico Itaipu (FPTI), desenvolveu, em parceria com o Exército Brasileiro, um sistema que usa baterias para armazenar a energia do sol e distribuí-la para o consumo conforme a demanda.
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Até aí, não há nenhuma novidade, afirma o assessor de Mobilidade Elétrica da Itaipu, Celso Novais. O diferencial do projeto, segundo ele, está na tecnologia e na faixa de potência dessas baterias. Feitas de sódio (o popular sal de cozinha) e 100% recicláveis, elas são imunes à variação de temperatura, diferente das baterias de lítio, e operam em alta tensão, na faixa de 600 volts.
Desenvolvido para funcionar com diferentes fontes ao mesmo tempo, conectado ou não à rede de energia, o sistema será abastecido inicialmente por energia solar. Os painéis captam a luz do sol, que é armazenada nas baterias. Um software se comunica com os dispositivos - os inversores solares e as baterias – e faz o gerenciamento do consumo de energia com base em uma estratégia prévia de operação.
Em locais ou comunidades isoladas, sem acesso à rede elétrica, a energia armazenada pelas baterias é usada nos momentos em que a luz solar não incide, com autonomia de carga de até duas horas ininterruptas. Já em lugares conectados à rede, é possível fazer uma gestão ainda mais criteriosa do uso da energia com base no custo do insumo.
“Sem as baterias, teríamos que usar a energia na hora em que ela é produzida, independente se naquele momento ela é cara ou barata. Com as baterias, podemos usar a carga armazenada em horários de ponta, quando a tarifa é mais cara, e a energia da rede fora dos períodos de pico, gerando maior economia”, detalha Novais.
Projeto-piloto
O sistema entrou em funcionamento há pouco mais de uma semana no quartel-general do Exército Brasileiro, em Brasília (DF), onde foram instalados 360 painéis fotovoltaicos conectados a seis inversores solares com potência total de 90 kW. Depois do quartel, o sistema será implantado no Pelotão Especial de Fronteira (PEF) de Tunuí Cachoeira, no Amazonas. O próximo passo, então, é replicá-lo em áreas isoladas do país, como comunidades ribeirinhas e de fronteira que sofrem com a falta de eletricidade.
O cálculo de quantidade de painéis, inversores e baterias será feito com base nas necessidades energéticas de cada local. A partir da estimativa de uso dos moradores, se dimensiona o tamanho do sistema a ser instalado para garantir o abastecimento contínuo de energia. Em uma área remota, na selva amazônica ou numa ilha, o investimento se paga em dois ou três anos porque o custo da energia é muito elevado. Já nas cidades, onde o preço do insumo é mais acessível, o investimento demora mais a se diluir, segundo Novais.
O foco inicial do projeto é atender os 25 pelotões de fronteira e entorno, onde a única energia disponível é produzida por geradores a diesel. Periodicamente, um avião leva a esses locais comida, medicamentos e diesel, caro e escasso. A energia gerada é suficiente apenas para duas a três horas por dia, o que causa uma série de limitações.
“É triste pensar que uma criança picada por uma cobra, por exemplo, não pode ter acesso ao soro porque não tem geladeira funcionando para armazená-lo por falta de energia. Com um projeto assim você consegue levar dignidade às famílias que vivem nessas áreas”, ressalta.