Nos próximos dias, o presidente Michel Temer deverá assinar um decreto que faz duas alterações no dia a dia das agências reguladoras. Primeiro, vai permitir que os funcionários possam viajar a serviço sem depender de autorização do ministro da área. O texto vai garantir ainda às agências autonomia para firmar contratos na área administrativa, como os de limpeza e serviços terceirizados.
Parece pouco, mas a mudança dará mais fluidez para o funcionamento desses órgãos. Segundo fontes, as agências operavam assim antes, mas foram alvo de um progressivo aumento de controle a partir do primeiro mandato da ex-presidente Dilma Rousseff. “Era uma dificuldade inacreditável, pedir para o ministro autorizar cada viagem”, comentou um ex-dirigente de agência reguladora. “Era uma coisa muito Dilma.” A ex-presidente era conhecida, nos bastidores, por seu estilo centralizador e detalhista, apelidado de “dilmismo”.
Técnicos que atuavam no governo à época dizem que ela via um excesso de autonomia nas agências reguladoras desde que assumiu o Ministério de Minas e Energia, em 2003. Essa visão teria levado o governo de Luiz Inácio Lula da Silva a propor, em 2004, uma nova lei para as agências reguladoras.
O texto, cujo resultado principal seria a transferência de poderes das agências para os ministérios setoriais, ficou anos parado. Após idas e vindas, o projeto foi bastante modificado.
A versão que aguarda votação no Senado antes de seguir para a Câmara dos Deputados, ajustado aos objetivos do atual governo, mantém as atribuições regulatórias das agências, procura profissionalizar sua gestão e lhes garante maior autonomia. O decreto que está em elaboração no Planalto, que trata de viagens e contratos, apenas antecipa alguns pontos dessa maior liberdade.
Segurança
Com a nova lei, o governo espera garantir um ambiente mais seguro para as concessões em infraestrutura, negócios que envolvem investimentos elevados e contratos de longo prazo. A instabilidade de regras e a debilidade das agências são queixas recorrentes dos empreendedores no setor privado.
“Queremos converter as agências em órgãos de Estado, e não de governo como elas se tornaram”, disse um interlocutor de Temer. “Na medida em que a agência fica vinculada ao titular do Executivo e seu partido político, suas ideologias, ela pode sofrer interferência indevida na regulação de contratos.”
Além do funcionamento das agências, o atual governo elimina, das concessões rodoviárias que pretende leiloar, itens que foram marcas do Programa de Investimentos em Logística (PIL), uma vitrine do primeiro governo de Dilma. As concessões do PIL privilegiavam a menor tarifa possível e exigiam elevados investimentos. A conta era, teoricamente, equilibrada com financiamentos generosos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A modicidade tarifária e uma forte presença do Estado na economia eram outras manifestações do “dilmismo”.
Esse modelo foi substituído, nas futuras rodadas, por um “realismo tarifário”, que admite pedágios mais altos e exige investimentos de acordo com a demanda. Essa mudança foi iniciada no segundo governo Dilma e mantida pela equipe de Temer.
No setor de óleo e gás, está em fase de desmonte a atual política de conteúdo nacional, criada em 2005, que exigia que as petroleiras utilizassem uma elevada quantidade de bens e serviços produzidos no Brasil. A nova versão vai dar maior flexibilidade para comprar produtos no exterior. Por outro lado, dará bônus caso as operadoras adquiram equipamentos aqui para usar em suas áreas de exploração em outros países.
Escolha de dirigentes dos órgãos reguladores será mais rígida
Em fevereiro de 2009, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva escolheu, para a diretoria da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), o assistente social Ivo Borges. Na época, o indicado admitiu ao jornal O Estado de S. Paulo que não tinha experiência no setor. No máximo, havia administrado a rodoviária de Brasília. Mesmo assim, teve seu nome aprovado pelo Senado e exerceu seu mandato como diretor - tendo, inclusive, chegado ao posto de diretor-geral.
Até ir para a ANTT, Borges era tesoureiro do PTB no Distrito Federal e dava expediente no gabinete do então senador Gim Argello (PTB-DF). Segundo se comentava, a indicação havia partido do parlamentar.
Há duas semanas, Argello foi condenado a 19 anos de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e por obstruir investigações. Ele havia sido preso em abril, na 28.ª fase da Operação Lava Jato.
O projeto de lei das agências reguladoras que tramita no Congresso não permite a repetição de situações como essa. Ele exige que os indicados para direção de agência reguladora tenham pelo menos dez anos de experiência na área, no setor público ou como profissional liberal na área a ser regulada. Ou que seja docente ou pesquisador no campo. E exige que o candidato tenha uma formação acadêmica compatível com o cargo. “Ele tem de ter, como requisito, essa experiência de dez anos”, frisou a senadora Simone Tebet (PMDB-MS), relatora da matéria.
Além disso, o texto proíbe que sejam indicados para o cargo ministros, secretários estaduais ou municipais, dirigentes de partido político, políticos com mandato no Legislativo, dirigentes sindicais, pessoas com participação em empresas ou entidades do setor regulado e pessoas que estejam inelegíveis, entre outros.
O texto uniformiza os mandatos de dirigentes das agências em cinco anos, sem direito a recondução. Um dos pontos mais importantes é o que dá às agências uma independência orçamentária. Elas negociarão seus recursos diretamente com o Ministério do Planejamento.
Hoje, essa negociação passa também pelo ministro da área. As novas normas serão submetidas a audiências públicas e não poderão ser modificadas sem uma análise de custo e benefício dessa alteração.
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