Em meio ao boom do setor imobiliário, que vem batendo recordes de lançamentos e vendas, uma luz amarela começou a acender para construtoras, incorporadoras e compradores. O crédito da poupança, hoje a principal fonte de financiamento do setor, deve se esgotar em 2012 e os bancos terão de encontrar, até lá, outras fontes de captação de recursos. Instituições financeiras e entidades do setor afirmam que "não vai faltar dinheiro" para a compra da casa própria, mas há grandes chances de que esse recurso fique mais caro para o comprador a partir de 2013. "Trata-se de uma notícia ruim para o setor, que terá de puxar o freio de mão. É preciso lembrar que a escassez de recursos vai afetar todo o ciclo de construção a partir de meados do próximo ano", diz Gustavo Selig, presidente da Associação dos Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi) no Paraná. A entidade projeta que, mantido o atual cenário, construtoras e incorporadoras poderão frear o ritmo de lançamentos, principalmente a partir do fim de 2011.
Segundo Marcos Kahtalian, consultor do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon) no Paraná, o esgotamento da poupança como fonte de recursos terá de ser contornado para evitar que o mercado imobiliário diminua o ritmo atualmente muito aquecido. O estoque de crédito imobiliário somou R$ 107 bilhões em maio, 50% maior do que no mesmo período do ano passado, segundo dados do Banco Central. "Não existe uma solução imediata. O que ocorreu é que, com a explosão da demanda, o que era para acontecer só daqui a alguns anos agora deve ocorrer dentro de três anos", afirma.
A Associação Brasileira de Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) estima que a partir de 2013 o "déficit" de crédito da poupança para o mercado imobiliário pode chegar a R$ 100 bilhões. O descompasso ocorre porque os depósitos crescem a um ritmo bem menor do que a demanda por crédito. "Hoje temos o crédito imobiliário com avanço de 50% ao ano e a poupança com cerca de 20% ao ano. A escassez de crédito da poupança não é uma projeção, é uma certeza", diz Fernando Baumeier, superintendente de negócios imobiliários do Santander.
Títulos
Para atender à demanda prevista de financiamento imobiliário nos próximos anos, os bancos já estudam alternativas, como a securitização, transformando as próprias carteiras imobiliárias em títulos que serão vendidos no mercado como forma de refinanciamento. As principais alternativas são os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e as Letras de Crédito Imobiliário (LCIs). São títulos lastreados em dívidas, que embutem um risco maior de inadimplência na carteira e da atribuição de valor que se dá aos ativos.
A Caixa Econômica Federal, que tem uma participação de 80% no mercado, anunciou que deve lançar até o fim do ano uma emissão de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), com um valor inicial estimado de cerca de R$ 500 milhões, para testar a demanda.
Hoje, esses tipos de operação certificados de recebíveis e letras de crédito têm uma participação pequena; representam um estoque de cerca de R$ 35 bilhões no Brasil. A questão é que eles ainda são uma alternativa de captação mais cara do que a poupança, segundo os bancos. "Enquanto o custo de captação da poupança é de 7% ao ano, o de uma LCI, por exemplo, é a partir de 10,6% ao ano", lembra Antonio Barbosa, diretor de crédito imobiliário do HSBC. Como embutem um risco maior, esses títulos têm de oferecer taxas mais altas para atrair o investidor.
De acordo com Barbosa, o mercado de securitização também depende da padronização de regras, como a dos contratos entre os bancos, o registro único da matrícula dos imóveis, dentre outros. Estuda-se exigir que o banco carregue parte do risco securitizado.
Não há consenso entre representantes do setor sobre o papel que a securitização terá no mercado brasileiro. Para Kahtalian, o mercado de securitização dificilmente vai ter uma participação significativa como forma de captação nos próximos anos. "A poupança provou ser um modelo vencedor para financiar o mercado imobiliário."
As financeiras, por outro lado, começam a se movimentar para atuar nesse mercado. "Considerando-se o crescimento anual de 30% que a securitização vem atingindo em níveis mundiais, esse setor tem tudo para crescer no Brasil", diz Rodrigo Pinheiro, diretor da Barigui Financeira, que se prepara para lançar no mercado uma empresa de securitização, com capital inicial de R$ 14 milhões. "Não há dúvida de que o mercado de capitais vai ganhar espaço no financiamento do setor", afirma Normando Baú, vice-presidente do Sinduscon.