Nos filmes americanos, pegar um empréstimo dando a casa como garantia é tão comum quanto ter cartão de crédito. O que poucos brasileiros sabem é que isso também é possível por aqui e, segundo especialistas, pode ser uma solução interessante para se livrar de dívidas caras, sobretudo neste momento em que quase um quarto das famílias do país tem pagamentos em atraso, segundo dados da Confederação Nacional do Comércio (CNC).
A vantagem do chamado crédito pessoal com garantia do imóvel — home equity, no jargão do mercado — são seus juros, que giram em torno de 2% ao mês, enquanto a taxa média das linhas de crédito para pessoa física está em 8,13% mensais, de acordo com a Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac). Para especialistas, o home equity é ideal para trocar débitos do tipo bola de neve, como cheque especial, por uma dívida mais fácil de pagar. Mas alertam que essa opção exige um regime de austeridade nas finanças pessoais, já que o desequilíbrio poderá significar a perda do seu maior patrimônio.
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Por meio do home equity, o cliente pode tomar emprestado junto ao banco até 60% do valor do seu imóvel, que deve estar quitado — em alguns bancos, como Santander e Máxima, o limite é menor: 50%. Por ser garantida, a transação oferece pouco risco à instituição financeira, daí as taxas cobradas serem mais baixas. Há bancos que cobram 1,45% mais inflação ao mês, por exemplo. O prazo para pagar chega a 15 anos.
O pagamento costuma ser feito em parcelas mensais, mas algumas instituições permitem negociar amortizações trimestrais ou semestrais. Outras ainda dão carência de alguns meses para o início dos pagamentos. Em geral, os bancos exigem que as parcelas comprometam, no máximo, 30% da renda do tomador.
Mercado
Embora exista há anos no mercado brasileiro, o home equity é pouco conhecido. O Banco Central (BC) e a maioria dos bancos não divulgam dados específicos sobre essa linha, mas sua carteira total está entre R$ 12 bilhões e R$ 15 bilhões, estima Luiz Pedro Albornoz, presidente da Novi Soluções Financeiras, que promove a contratação desse crédito.
Assim, representaria menos de 3% do saldo de R$ 525 bilhões do financiamento imobiliário no país. No Bradesco, a carteira de home equity supera R$ 2 bilhões, segundo o diretor da área de Empréstimo, João Carlos Gomes da Silva. No Banco do Brasil, a linha existe há apenas dois anos.
“Acho que os bancos não têm muito interesse em divulgar essa linha, porque ela tem uma margem menor e custo maior, já que exige mais burocracia. A papelada é processada rapidamente, mas reuni-la e processá-la é trabalhoso”, diz Albornoz.
Mas, embora a publicidade não seja o forte do home equity, o fato é que todos os grandes bancos o oferecem. No Santander, a procura tem vindo de clientes endividados e de pequenos empreendedores atrás de capital de giro, gente de classe média com imóvel avaliado entre R$ 500 mil e R$ 600 mil em grandes metrópoles, explica Gilberto Abreu, diretor-executivo de Negócios Imobiliários.
O Banco do Brasil tem focado, por enquanto, no público de alta renda, salientando que o home equity pode ser uma ferramenta de educação financeira, explicou Hamilton Rodrigues da Silva, diretor de crédito imobiliário. No Bradesco, o foco é exclusivamente o empreendedorismo. “Não usamos essa carteira para renegociação de dívida”, ressalta Rodrigues da Silva.
Reorganização financeira
O risco de tomar esse empréstimo é, obviamente, a perda do imóvel. Isso porque o cliente faz uma alienação fiduciária do bem, permitindo a execução do patrimônio em caso de inadimplência. Segundo os executivos dos bancos, atrasos de mais de 90 dias geram um processo de notificação extrajudicial. Com 120 dias, a cobrança já vira judicial, e, se não for bem-sucedida, o banco tem direito a reincorporar o bem para leiloá-lo.
Primeiro, tenta-se conseguir o valor de mercado do imóvel no leilão. O recurso levantado é usado para pagar a dívida, e o restante é devolvido ao correntista. Caso isso não dê certo, o banco pode tentar leiloá-lo ao valor da dívida — nesse caso, o cliente não recebe nada no fim.
“É muito raro chegar a essa etapa de execução. Caso o cliente não esteja conseguindo honrar as parcelas, é muito mais racional que ele venda o próprio imóvel para pagar a dívida, do que deixar o banco vender nas condições dele”, afirma Abreu, do Santander.
Segundo os executivos, a inadimplência dessa linha de crédito é baixa, semelhante à do crédito imobiliário.
Virgínia Prestes, mestre em Finanças e professora do MBA da Faap, ressalta que esse empréstimo não pode ser usado, em qualquer hipótese, para consumo. Ele só é interessante, explica, quando o objetivo é investir em capital produtivo ou quitar dívidas mais caras. Mesmo nessas situações, o tomador deve fazer contas e mudar seus hábitos.
“Se ele estiver com dívidas, deve pegar o empréstimo, mas se organizar. Afinal, é seu imóvel que está em jogo, ele não pode, de jeito nenhum, se enrolar de novo. A parcela precisa caber no orçamento dele. Quanto aos empreendedores, é preciso calcular muito bem para saber se o projeto em que se quer investir terá retorno suficiente para compensar os juros do crédito”, explica.
O tomador também deve evitar dar o imóvel como garantia para tomar valores baixos, observa Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor executivo de estudos financeiros da Anefac: “Não vale à pena usar o home equity para pagar uma dívida de R$ 20 mil, por exemplo. Isso porque o processo para obtenção dessa linha de crédito é burocrático e tem um custo, como as taxas dos cartórios. Acaba retirando a vantagem dos juros mais baixos.”
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