Em meio a uma crise que fez despencar a venda de veículos no Brasil, o faturamento do setor automotivo tem perdido espaço na economia do país. Em relação ao tamanho do Produto Interno Bruto (PIB), o total faturado pelo setor caiu em 2015 para 4,1%, dando sequência a uma trajetória de queda que vem desde 2010, quando a taxa era de 6,3%, e retornando ao nível de 2004.
Diante disso, uma recuperação só seria possível na primeira metade da próxima década, avaliam analistas ouvidos pela reportagem. Eles defendem que primeiro será necessário uma melhora dos indicadores macroeconômicos do país para depois estimular a recuperação do setor.
Os dados de faturamento foram estimados pelo economista João Morais, da consultoria Tendências, a pedido do Broadcast. Ele considerou a receita bruta de revenda do setor no varejo e no atacado, levando em conta automóveis, comerciais leves, caminhões, ônibus e motocicletas, além de suas partes e peças.
Desempenho inferior
A queda da receita em relação ao PIB ocorre porque, desde 2011, o mercado de veículos tem apresentado desempenhos inferiores aos da economia como um todo. Os motivos, no entanto, variam em cada período. Em 2011 e 2012, quando as vendas bateram recorde, os preços dos carros estavam mais baratos, em razão da redução temporária do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), lembra Morais. O faturamento do setor cresceu, mas não o suficiente para acompanhar a expansão da economia. A proporção da receita bruta em relação ao PIB, portanto, saiu de 6,3% em 2010 para 6,2% em 2011 e 5,8% em 2012.
Dali em diante, as vendas começaram a cair e não pararam mais. Como resultado, a taxa caiu para 5,6% em 2013, 4,9% em 2014 e 4,1% em 2015. Sobre as quedas em 2013 e 2014, Morais explica que, como houve uma antecipação de compra de carros em 2011 e 2012, os efeitos do IPI foram reduzidos nos dois anos seguintes, contribuindo para a diminuição das vendas. Tanto que, no fim de 2014, o governo decidiu não prorrogar o benefício.
Calote
Com a antecipação das compras, aumentou o número de pessoas físicas que deram calote nos bancos onde haviam conseguido crédito para financiar a aquisição, afirma a economista Mariana Orsini, da GO Associados. O avanço da inadimplência começou em abril de 2011, com uma taxa de 3,95%, e alcançou o pico em julho de 2012, a 7,22%. “Por causa disso, o crédito ficou mais restrito para o financiamento de veículos”, diz.
Como resultado, o número de veículos leves financiados em 2013 registrou queda de 0,9% em relação a 2012, segundo a Unidade de Financiamento da Cetip, que compila dados das instituições financeiras. Em 2014, o ajuste foi mais expressivo, com recuo de 9,6%.
Com a crise econômica, o ano de 2015 trouxe um novo componente: o pessimismo do consumidor. A queda da renda e o aumento do desemprego tornaram o brasileiro mais cauteloso, afirma Morais. “Ele passou a postergar itens de maior valor agregado (como um carro) e passou a priorizar a compra de bens essenciais (como alimentos)”, diz.
Não é a toa que o índice de confiança medido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) tem se mantido abaixo dos 100 pontos (varia de zero a 200) desde outubro de 2014. Em fevereiro deste ano, ficou em 68,5 pontos, sete pontos a menos que em fevereiro de 2015. No ano passado, a venda de veículos novos, em unidades, caiu 26,5% na comparação com 2014, segundo dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). “Somos extremamente sensíveis à confiança do consumidor”, diz o presidente da entidade, Luiz Moan.
Moan lembra também que o setor automotivo não inclui somente as montadoras e as concessionárias, mas também lojas de autopeças, serviços de pós-venda, financeiras e outros segmentos. “Temos o mais longo processo do setor de produção, nossa interação é muito forte. Então, assim como estamos ajudando a derrubar a economia, uma retomada do nosso setor vai ajudar na recuperação do país”.
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