Empreendimentos
Para dar certo, ideia pede investimento privado
O projeto de revitalização da Rua Riachuelo parte da ideia de que os moradores e empresários da região abraçarão a causa. Esse investimento deve acontecer em algumas frentes, como a requalificação e diversificação dos negócios instalados no local, mas obrigatoriamente passa pela reforma e restauração das fachadas e da infraestrutura dos imóveis, alguns deles há muito abandonados.
História
Via sempre teve vocação comercial
Em dois séculos de história, a Rua Riachuelo passou por mudanças significativas. Trocou o comércio de secos e molhados pelas lojas de usados. Viu os habitantes dos andares superiores abandonarem seus sobrados e os pedestres desviarem algumas quadras por medo da violência. A passagem entre as Praças Generoso Marques e 19 de Dezembro foi aberta no início do século 19, como via de acesso ao núcleo da vila que se formava. A Riachuelo delimitava um dos lados do quadrilátero povoado formado ainda pelas atuais Dr. Murici, Treze de Maio e Marechal Deodoro.
Foi batizada em 1871, em celebração à Batalha do Riachuelo, vencida pela esquadra brasileira na Guerra do Paraguai. Antes, chamou-se Rua do Lisboa, dos Veados, do Campo e da Carioca. A pavimentação se completou em 1871, diminuindo o lamaçal dos dias chuvosos. Foi se transformar em um trajeto concorrido a partir de 1885, por conta da inauguração da Estrada de Ferro e do Passeio Público (em 1886), nas imediações. Um ano depois, ganhou trilhos de bonde.
As mudanças se refletiram na diversificação do comércio. Apareceram sapateiros, relojoeiros, marceneiros, farmácia, livraria, açougue, alfaiataria, lojas de calçados, botequins e armazéns. Era costume dos proprietários manter a atividade comercial no térreo e habitar os andares superiores.
Vida noturna
O comércio se voltou ao ramo de tecidos, roupas e armarinhos com a chegada dos sírio-libaneses a partir dos anos 50. Havia então um quartel militar na altura da Rua Presidente Carlos Cavalcante, o que significava movimentação predominantemente masculina nas imediações. Isso teria ajudado a caracterizar a área como território de prostituição.
Osvaldo Matter Filho, da terceira geração da alfaiataria Riachuelo, aberta em 1932, diz lembrar que a sobreloja foi alugada por uma cafetina na década de 70 e transformada em prostíbulo. "A gente percebia a movimentação das moças na calçada, e volta e meia ouvíamos os passos na escada", relembra.
A deterioração da rua coincidiu com o período em que funcionou como canaleta de ônibus, na década de 80. Impedido o trânsito de carros, a via sofreu desvalorização comercial. "Havia um monte de bares bem ruins", recorda Jean Paul Decock, proprietário do cinquentenário restaurante Ile de France. Segundo ele, também nessa época cresceu o comércio de objetos usados. (LR)
Os especialistas do Sebrae têm pela frente uma tarefa que pode ser ainda mais complicada do que mudar a estrutura física da Rua Riachuelo. Eles vão ajudar os comerciantes da região a transformar sua cultura. Hoje, a área tem várias lojas de móveis e roupas usadas que precisam se esforçar para conquistar o público esperado com a melhora na infraestrutura.
"Todo empresário tem coisas para melhorar, para rever e reestudar no seu próprio negócio", diz Walderes Bello, consultora de projetos de varejo do Sebrae. "Não adianta reformar a rua se eles continuarem a subir com o caminhão na calçada, por exemplo. É preciso uma reforma também na mentalidade do empresariado local."
Para que a Riachuelo volte a ser uma rua tradicional de comércio, o arquiteto do Ippuc Mauro Magnobosco, coordenador do Projeto Novo Centro, aposta na "repaginação" dos brechós e lojas de móveis, mas também na atração de "um comércio mais sofisticado", o que provocaria a ampliação da clientela.
"Você não vai transformar a Riachuelo numa Avenida Batel", relativiza o arquiteto. "Nós temos ali um fluxo de pessoas de classe B, C, talvez até D, que vêm para o centro da cidade com recursos muito limitados. O comércio vende para esse tipo de freguês, é muito difícil mudar, mas pode ter novos atrativos para buscar um público diferenciado", diz Magnobosco.
Tal objetivo requer um produto que atenda o mesmo critério: apresentar um diferencial, seja em qualidade ou conceito.
O empresário Alessandro Weber, proprietário da loja Achados do Batel, acredita que a revitalização possa se efetivar se a rua oferecer um passeio agradável entre as praças que interliga. "Tem que se transformar em um lugar mais charmoso, nem que seja por um tatuador bacana, um salão de beleza badalado ou arte na rua", diz.
Se a ideia é atrair novos frequentadores, "é preciso imprimir um estilo para esse comércio", opina Weber. Mas "estilo é uma coisa muito difícil de ensinar", pondera Tiça Muniz, dona da loja Flor de Vedete, no Bom Retiro.
Os brechós da Riachuelo algumas vezes forneceram matéria-prima (especialmente casacos masculinos antigos) para seu ateliê, dedicado à moda retrô. A catarinense que veio para Curitiba há oito anos conta que já aconteceu de encontrar, nos fundos de uma das lojas da rua central, desprezado, um vestido da alta costura francesa. Sem falar nos alfinetes de prata com almofada de veludo e outros mimos caros à estilista.
Como nem sempre os vendedores estão conscientes do que têm ou no valor dentre os produtos que oferecem, e como não se impõe facilmente senso estético a alguém, Tiça sugere que os comerciantes invistam em informações sobre sua área de atuação. "Comprar um dicionário de moda com a história do que já foi feito é superlegal para quem tem um brechó", indica.
A empresária vê com bons olhos a revitalização da rua. Se não se instalou na região até hoje, foi por causa da violência decorrente do consumo de drogas por ali. "Faz tempo que penso em arranjar um lugar para abrir um brechó, mas o que me fez repensar foi a questão da segurança. Se ficar seguro e tiver espaço, eu vou para lá", diz.
Mobília
Os móveis antigos, de madeira nobre, são cada vez mais escassos nas lojas da Riachuelo, segundo o empresário João Livoti, que trabalha com artigos restaurados das décadas de 50 e 60 na loja Desmobília, no Batel. "Há cinco ou dez anos via muitas peças interessantes. Mudou o perfil, do móvel antigo para o usado", diz.
Além do trabalho de garimpar um objeto em meio às peças que se empilham umas sobre as outras, Livoti aponta como empecilho a dificuldade de restaurar o que se compra.
"A prestação de serviços seria um caminho interessante. Faltam oficinas para restaurar, lixar, empalhar. Isso poderia aquecer o mercado do entorno e o cliente sairia com uma peça relativamente nova e mais barata que a peça zero", propõe.
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