O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em visita a Manágua, ofereceu nessa quarta-feira uma ampla cooperação à Nicarágua, prometendo "tantos acordos quanto os necessários" durante encontro com o colega Daniel Ortega.
Lula anunciou, na sede da Frente Sandinista da Libertação Nacional (FSLN), onde também ficam os escritórios da presidência, a assinatura de um total de 12 acordos.
Os dois governantes lembraram uma relação de amizade que data de 26 anos e falaram das discrepâncias em torno da produção de etanol que Brasil e Estados Unidos impulsionam na região como alternativa ao petróleo.
"Nossa posição é bem clara: (...) é inadmissível que na Nicarágua se produza etanol a partir de milho, isso é um crime, é atentar contra um produto básico da nossa alimentação", disse Ortega para a imprensa, convocada para cobrir a primeira reunião de trabalho.
Ortega deixou claro que sua discordância sobre este tema "não é com Lula, mas com George Bush, que veio com uma iniciativa absurda que atenta contra os direitos alimentares dos povos latino-americanos e africanos, grandes consumidores de milho".
Lula manifestou não ser "a primeira vez que chego em um país e que existe um clima de divergência política no ar. Eu nunca me incomodei, porque se tiver divergências, elas têm que ser explicitadas e se não tiver, também tem que ficar explícito".
O brasileiro defendeu ainda sua visão a respeito do etanol, como uma verdadeira opção ao problema energético que é comum a todos os países, tanto na África, quanto nos Estados Unidos, ou na América Latina.
Lula disse que nem todos os países têm capacidade econômica e recursos para trocar sua matriz energética baseada no petróleo, na energia nuclear, gás ou carvão, mas isso pode ser feito mais facilmente a partir dos biocombustíveis.
Lula acabou concordando com Ortega que produzir combustível a partir de milho na Nicarágua é como se o Brasil tivesse de fazer o mesmo a partir do feijão. "Isso seria impossível, é necessário procurar outra planta", admitiu.
"No caso do etanol, o Brasil tem 30 anos de tecnologia consagrada e hoje a maioria dos carros produzidos no Brasil é flex-fuel, pode-se colocar 100% de gasolina, pode-se colocar 100% de etanol e pode-se colocar 50%. É a gosto do cliente. E o etanol só é vantajoso quando o custo dele for até 60% do litro de gasolina", completou Lula.
"Quando pensei no biodiesel, pensei em duas coisas: primeiro, a chance dos países pobres poderem produzir, utilizar e exportar para os países ricos o excedente; Segundo, eu pensei na África, porque não é possível que o continente africano continue no século XXI sendo o mesmo continente pobre que era no século XX", explicou o brasileiro.
Apesar das divergências sobre o tema, Lula declarou que o Brasil está disposto a "fazer todo o possível" para ajudar a Nicarágua a superar uma crise energética e a fazer a mudança estrutural na produção de energia, porque o país não pode continuar com apagões de sete horas.
Desde maio, a Nicarágua vem sofrendo racionamentos de eletricidade; 80% da produção do país é a base de petróleo.
Paralelamente, empresários brasileiros manifestaram nessa quarta-feira o interesse em aproveitar as vantagens que a Nicarágua possui em relação aos Estados Unidos por causa do Tratado de Livre Comércio (TLC) assinado com países da América Central e lançar as bases para estabelecer uma produção de etanol e biodiesel.
"A exploração dessas oportunidades é uma das áreas de interesse dos investidores brasileiros" na Nicarágua, afirmou o vice-presidente da Câmara Nacional da Indústria do Brasil, Lucas Isoto, durante um fórum de investimentos organizado por empresários brasileiros e nicaragüenses em Manágua.
"As empresas brasileiras buscam países que possam contribuir para gerar lucros em mercados locais e externos", explicou Isoto, que também preside a Federação das Indústrias do Brasil, entidade que reúne cinco milhões de pequenos e médios empresários.
A iniciativa foi bem recebida pelo governo sandinista de Daniel Ortega, e empresários nicaragüenses manifestaram sua disposição de estreitar seus vínculos com o Brasil para poder se aproximar do Mercosul.