O prejuízo das empresas públicas brasileiras, no ano passado, beirou os R$ 60 bilhões, com os resultados negativos de gigantes como Petrobras, Eletrobras, Correios e Infraero| Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Apesar da propalada dificuldade financeira de várias estatais federais, as 135 que existem país afora continuam infladas, com crescimento constante de pessoal.

CARREGANDO :)

Dados atualizados do governo mostram que, de 2010 a 2014, o número total de contratados nessas empresas teve um acréscimo de 11,2%, o que representa 55.836 novas contratações. O aumento foi ininterrupto.

Se forem levadas em conta as estatais que dependem exclusivamente do Tesouro Nacional — como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e a Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), entre outros exemplos — a alta foi de 48,4% no período. Já de 2006 a 2014, o volume de servidores nas estatais aumentou em 30%, e o das dependentes do Tesouro, em 75%. Enquanto o número de funcionários disparou, o volume de investimentos das estatais federais no primeiro quadrimestre caiu ao menor nível desde 2006.

Publicidade

Entre as distorções no setor está a Agência Brasileira Gestora de Fundos de Garantidores e Garantias (ABGF), criada em 2012 e com quase 96 funcionários. A estatal foi fundada com o objetivo principal de gerir um novo fundo garantidor de concessões de infraestrutura que, no entanto, nunca foi lançado, e o atual governo não confirma os seus planos de capitalização.

Na mira do governo interino de Michel Temer, a EBC viu seu número de funcionários saltar de 913, em 2010, para 2.564, em 2014, um incremento de 180% em quatro anos. No mesmo período, os investimentos das estatais cresceram 13,6%.

Prejuízo

Em termos agregados, o prejuízo das empresas públicas brasileiras, no ano passado, beirou os R$ 60 bilhões, com os resultados negativos de gigantes como Petrobras, Eletrobras, Correios e Infraero. A penúria financeira das estatais contamina as contas públicas. Segundo relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) divulgado neste mês, as empresas públicas responderam por um deficit primário de R$ 1,7 bilhão no ano passado.

“Os governos anteriores acreditavam no aumento do gasto público como motor de crescimento da economia, mas as empresas tiveram problemas por má gestão”, diz Paulo Vicente, professor de gestão pública e estratégica da Fundação Dom Cabral.

É com esses números que a equipe do presidente interino, Michel Temer, está trabalhando para moldar o conceito de “Estado suficiente”, que vai balizar todas as privatizações que estão por vir, caso se confirme o afastamento da presidente Dilma Rousseff.

Publicidade

Segundo Fernando Soares, diretor do Departamento de Estatais do Ministério do Planejamento — que deverá ser alçado a secretaria nos próximos dias —, o governo vai procurar trazer um modelo de gestão privada para as estatais, com regras adaptadas de governança e transparência. Ele destaca, porém, que as estatais têm de atender aos interesses da sociedade, e não apenas render lucros ao governo.

“Os retornos da Embrapa ou dos hospitais são sociais. Algumas empresas dão retorno econômico e outras, apenas social”, afirma Soares.

Já Vicente destaca, contudo, que, uma vez infladas as folhas de pagamento das estatais, a redução não é trivial. Os programas de demissões voluntárias (PDVs) existentes em algumas delas, diz ele, tendem a tirar os servidores mais competentes, que conseguem se realocar em outras empresas. Outras medidas, como afastamentos, implicam riscos jurídicos.

“O congelamento da folha, proposto pelo governo Temer, é cruel, como todas as medidas possíveis, mas é um remédio para amenizar gastos”, diz o professor da Dom Cabral.

Indicações

O governo interino trava embates com o Congresso para, além de definir o teto de gastos que comprimirá os salários dos servidores, aprovar uma nova lei das estatais, reformando a gestão e a governança das maiores empresas. Mesmo com a aprovação do texto, porém, há ceticismo do mercado quanto à sua efetiva revolução na gestão das estatais.

Publicidade

O tempo dirá se a nova lei vai alterar substancialmente a qualidade e a assertividade da governança das estatais, escreveu o presidente do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Emilio Carazzai, aos seus associados na última sexta-feira.

“Todavia, assim como foram falsas as expectativas de que a mera promoção de funcionários de carreira seria bastante para blindar aquelas empresas de más práticas, o acervo de conhecimento do IBGC nos permite afirmar que as medidas incluídas no novo estatuto estão longe de assegurar que aquele intento seja plenamente alcançado”, afirmou em comunicado.

A carta se refere ao fato de ex-servidores da Petrobras alçados a cargos de chefia terem capitaneado grande parte dos crimes e desvios que foram alvo da Operação Lava-Jato. Agora, o governo procurou indicar nomes notáveis para as principais estatais e dar-lhes autonomia. Pedro Parente, novo presidente da Petrobras, assumiu dizendo que comandará a empresa sob uma ótica empresarial, sem espaços para interferências do governo.

Na Eletrobras, segunda maior estatal, o ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, indicou o presidente da CPFL, Wilson Ferreira, e já decidiu que seu secretário executivo não será mais conselheiro da empresa e que seus diretores não participarão da cúpula que define os rumos do setor em Brasília.

Publicidade

“A mistura de papéis entre governo e empresas levou ao sonho de um Brasil maior, mas esse sonho pode ter virado delírio, ou pesadelo, e agora estamos no momento do despertar”, disse Paulo Pedrosa, secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, sobre o rumo das estatais.

Antes de o governo determinar o bloqueio a indicações de políticos em estatais, foram apontados nomes claramente políticos, como o presidente do PSD, Guilherme Campos, para a presidência dos Correios, e Gilberto Occhi, do PP, para a Caixa — embora ele seja servidor do banco. Para Soares, limites por relações políticas ou sindicais muitas vezes são insuficientes para blindar as empresas.

“A lei já é um avanço, mas vamos avançar mais em partes”, afirmou Soares.

Nesse cenário, o ministério do Planejamento prepara uma reformulação do seu Departamento de Estatais (Dest), transformando-o em uma secretaria — sob a batuta de Soares e com um contingente maior — encarregada sanear as empresas públicas em dificuldade e prepará-las para a privatização. Ou seja, cuidará da saída do setor público de áreas estratégicas, como energia, transportes, petróleo e gás. Soares explica que terá uma equipe dedicada exclusivamente a analisar essas operações.