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Setembro de 2008, mês que termina nesta terça-feira, é também de catástrofe para o mercado financeiro mundial, como outro setembro, o de 2001. Felizmente, sem mortes como aquele, marcado pelo desastre de dois aviões arremessados no dia 11 contra as torres gêmeas do World Trade Center, bem próximas de Wall Street. A comparação foi inevitável em dezenas de análises feitas ao longo do mês, mas, agora, os termos são superlativos, como "a maior crise financeira desde a Grande Depressão", a "maior falência bancária da história dos EUA", e o "maior acordo de resgate de todos os tempos" - que, não aprovado ontem pela Câmara norte-americana, jogou os mercados no mais completo caos.
Desta vez, se não houve destruição de prédios nem mortos, Wall Street foi atingida direto no seu coração e nos seus valores e necessariamente será outra depois desta crise.
Foram-se bancos centenários, foram-se bancos de investimentos - os dois últimos grandes já deram o primeiro passo para se transformarem em comerciais -, foi-se a máxima capitalista do Estado não intervencionista. O mundo assistiu ao Tesouro dos EUA precisando entrar firme em cena para tentar estancar a sangria de uma crise sistêmica, com um plano de US$ 700 bilhões - que não convenceu número suficiente de parlamentares republicanos e democratas para aprová-lo. Antes, muitos outros bilhões tinham ido para o ralo em prejuízos diversos oriundos do mercado imobiliário norte-americano do subprime, que varreu o globo como uma onda de tsunami.
O mercado financeiro brasileiro não foi uma exceção neste "setembro negro", mas o mês teve um gostinho particularmente amargo para uma economia cuja imagem de "blindada", ou quase isso, foi vendida aos quatro ventos. Os "furos" na blindagem, aqui e ali, começaram a aparecer de forma mais nítida e também o Banco Central, como já haviam feito outros BCs pelo mundo, foi obrigado a intervir para garantir liquidez, no mercado de câmbio e no mercado à vista de reais.
O dólar, que se comportou bem até o começo de agosto, quando começaram a desaparecer as linhas de pré-pagamento para financiamento aos exportadores, acentuou a disparada em setembro, com a fuga dos investidores estrangeiros da Bolsa e da renda fixa, com o desaparecimento do dinheiro para ACC, ACE e também das linhas interbancárias. O BC interveio, anunciando os leilões de venda de dólar, conjugados com compra futura, uma espécie de empréstimo, com data para devolução, apenas para melhorar a oferta de moeda. Mas a liquidez continuou escassa. A segunda-feira da rejeição do acordo em Washington terminou com o dólar subindo 6,15% ante o real, no balcão, a R$ 1,9670 - o maior valor desde 5 de setembro de 2007 (R$ 1,9690). Agora, o governo estuda medidas para fornecer mais linhas de crédito aos exportadores.
A liquidez também acabou "secando" em setembro no mercado de reais, com o clima de desconfiança levando bancos a evitar o fornecimento de crédito a outras instituições, o chamado "empoçamento", e o BC viu-se obrigado a promover ajustes nos depósitos compulsórios. Os juros acompanharam, com medo, a alta do dólar, de olho na inflação, porém agora o temor é quanto aos efeitos da crise na atividade econômica, com o mercado trabalhando com impactos mais fortes do que os cogitados pelo BC em seu relatório de inflação. A possibilidade de mudança na política monetária já está em debate nas mesas de operação e escritórios de consultorias.
No entanto, uma das maiores surpresas para o mercado doméstico foi o solavanco adicional sofrido pela Bolsa, quando se percebeu que executivos brasileiros embarcaram num jogo ousado de alavancagem em moldes semelhantes aos dos seus pares em Wall Street, olhando para a oportunidade de ganhos elevados, mas subestimando os riscos. O anúncio de perdas cambiais de grandes empresas, como Sadia e Aracruz, por conta de operações no mercado de derivativos pareceu descortinar a visão de uma "bolha" nacional, até então pouco visível.
Se as perdas decorrentes de riscos assumidos no mercado de derivativos vão se circunscrever a algumas empresas que ousaram demais ou se vão abranger um número considerável, ninguém sabe.
A Bovespa caminha para terminar setembro com perda na faixa dos 13%, bem maior que em agosto, o propalado "mês do desgosto" para as bolsas, quando fechou com desvalorização de 6,43%. A alta do dólar à vista no mercado de balcão, no mês, terá chegado perto de 17% (em agosto, o dólar tinha subido 4,55%). Já o juro do contrato de DI futuro com vencimento em janeiro de 2010 - o mais negociado no mercado - encerra setembro na faixa de 14,47%, abaixo dos 14,64% do último dia do mês de agosto, o que indica que os investidores não estão acreditando na possibilidade de alta de juro por muito mais tempo. O último dia do mês, depois do pesadelo de ontem, está se caracterizando por uma trégua e por uma renovada esperança de que o governo dos EUA faça alguma coisa, qualquer coisa, para estancar a crise. Mas este "setembro negro" não deixará saudades e retém a desconfortável impressão de que não terá terminado.