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Para sobreviver, startups deixam de lado consumidor e buscam cliente corporativo

 | Andrew Burton/AFP

Ao abrir sua primeira startup, a Netshow.me, o empresário Rafael Belmonte queria “digitalizar o chapéu do músico de praça”, deixando que artistas independentes faturassem com ingressos virtuais para shows ao vivo, pela internet – a plataforma ficava com uma pequena fatia na receita. Depois de três anos, a Netshow.me mudou de planos. No lugar dos fãs de Fresno, Só Para Contrariar e Wanessa Camargo, a carteira de clientes da empresa começou, em janeiro, a incluir empresas como KraftHeinz, Itaú e Napster.

A mudança não foi à toa: apesar de alcançar bom público em algumas transmissões, a Netshow.me tinha faturamento baixo e inconstante. A guinada para o mundo corporativo deu frutos. “De lá para cá, o faturamento cresceu oito vezes”, diz Belmonte.

Hoje, a Netshow.me atende cerca de 300 clientes, com planos entre R$ 99 e R$ 499. “Além de render mais, minha receita é mais previsível”, afirma.

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O caso da Netshow.me é mais radical – a ponto de ter abandonado as transmissões com artistas –, mas está longe de ser único. Nos últimos tempos, vários empreendedores brasileiros deixaram de lado o sonho de atingir as massas com um “app matador” e passaram a atender empresas.

Treinamento

A startup mineira Qranio fez um movimento parecido, mas mais suave. Dona do app homônimo que mistura educação com testes divertidos de múltipla escolha, a startup alcançou a marca de 1,3 milhão de usuários no início deste ano. Contudo, não gerava receita significativa.

Segundo especialistas, é preciso conquistar uma boa base de usuários para ser lucrativo – e isso costuma levar tempo e dinheiro. “Nem sempre os investidores estão dispostos a esperar esse tempo todo”, diz Samir Iásbeck, fundador da startup.

A solução surgiu de fora da empresa. “Um cliente nos perguntou se poderíamos adaptar a plataforma para fazer um treinamento interativo”, conta Iásbeck. Ao participar do programa de aceleração do Google, no início deste ano, o projeto virou o novo foco da empresa.

De janeiro para cá, a Qranio já conquistou clientes do porte de Magazine Luiza, Bradesco e Brasil Kirin. “Hoje, 98% do meu faturamento vem desse novo setor”, diz o empreendedor. A startup, no entanto, não abandonou o bom e velho quiz. “Meu melhor cartão de visita para o cliente ainda é o meu aplicativo para o consumidor final.”

Risco

A escassez de capital de risco no Brasil é o principal fator que faz as startups deixarem de lado as pessoas físicas. “Se o cara tem uma boa ideia para consumidores, ele deve ir ao Vale do Silício”, diz Renato Valente, diretor da aceleradora Wayra, da Telefônica.

Na crise, esse investimento é ainda mais difícil. Por outro lado, apostar em empresas é uma forma rápida de crescer. “Com menos dinheiro, você fala com um número maior de potenciais clientes, com um tíquete médio bem maior”, diz Felipe Matos, presidente da aceleradora StartupFarm.

Com receita e retorno mais rápido, a startup se torna mais atraente para o investidor, que vê menos risco, afirma Matos. Além disso, em tempos de crise, ajudar empresas a economizar faz a diferença. É o que aconteceu com a Telep.

Inicialmente, a startup criou um app capaz de monitorar as chamadas e sugerir o plano mais econômico entre as operadoras brasileiras. Ele ficaria com uma pequena comissão a cada oferta fechada. “Lançamos a primeira versão em 2014. Conseguimos muitos downloads, mas não vendemos quase nenhum plano”, diz Paulo Sena, sócio-fundador da empresa.

Ao pesquisar o mercado, a Telep descobriu que a dor de uma fatura “estourada” era muito maior para as empresas. “Os empresários chegavam com contas de até 300 páginas. Era difícil interpretar tudo aquilo”, afirma Sena. A Telep então voltou para a prancheta e só retornou ao mercado há dois meses. Hoje, administra mais de 3 mil linhas de 25 empresas.

Pêndulo

Para Matos, da StartupFarm, o crescimento de startups focadas em pessoas jurídicas está associado ao momento do País. “Daqui a alguns anos, a onda de serviços para consumidores tem tudo para se repetir”, prevê ele.

É nisso que aposta a TimoKids, que cria livros digitais para crianças com pegada socioeducativa desde 2014. Em dois anos, a empresa conta com 110 mil usuários em 190 países – mas apenas uma minoria deles paga pelas histórias. “Com a base das empresas, temos tranquilidade para criar um produto relevante para as crianças”, diz Fabiany Lima, presidente executiva da empresa.

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