As paralisações dos caminhoneiros, que atingiram pelo menos 12 estados e ainda ocorrem no Paraná, colocaram em evidência diversas fragilidades do setor de transporte rodoviário de cargas do Brasil. Estradas mal conservadas, falta de segurança, valor de frete defasado e alto custo operacional são alguns dos problemas enfrentados pelo setor, e que refletem o atual cenário econômico do país.
Frete defasado
Segundo a Federação dos Transportadores Rodoviários Autônomos do Estado de São Paulo (Fecamsp), o preço do frete diminuiu 37% em todo o país nos últimos cinco meses, embora os custos de transporte tenham aumentado.
“O frete ofertado pelos embarcadores e transportadoras vem, na contramão, baixando sistematicamente. Ainda mais em um contexto de safras recordes todos os anos. Ou seja, muito mais cargas a transportar e o mesmo número de caminhões. O que deveria, pela lei da oferta e da procura, aumentar o frete e não diminuí-lo”, afirma a associação, em nota.
Sem regulamentação, caminhoneiros eram prejudicados
Falta de regulação da atividade criou cenário ruim para caminhoneiros autônomos, diz Bruno Batista, diretor executivo da Confederação Nacional do Transporte (CNT).
Leia a matéria completaPresidente da Federação das Empresas de Transporte de Cargas do Estado do Paraná (Fetranspar), Sérgio Malucelli diz que houve um consenso entre os sindicatos das empresas de transporte, após uma reunião durante a última semana, que o valor do frete deveria aumentar em 14,11%.
Diferenças estaduais
Hoje, o valor do frete no país é calculado de várias formas, de acordo com o que é definido em cada estado. Em alguns lugares, por exemplo, o frete é pago levando em conta o peso e a mercadoria carregada. Os caminhoneiros pedem a criação de uma tabela única nacional de preços do frete baseada no quilômetro rodado.
Edson Campagnolo, presidente da Federação das Indústrias do Paraná (Fiep), diz que não acredita que isto seja possível. Para Campagnolo, uma solução seria a criação de uma planilha básica de piso do frete. “Um tabelamento fixo é impossível, mas uma referência mínima é algo que o governo poderia considerar”.
A economista Geovana Lorena Bertussi, professora da Universidade de Brasília (UnB), concorda e diz que o valor de frete mínimo não é eficiente do ponto de vista econômico. “É difícil de fiscalizar. O mercado de fretes é um mercado competitivo, tem muitos compradores e vendedores. Se você estabelece um preço mínimo muito alto, menos pessoas vão querer demandar este frete. E com o excesso de oferta de trabalho, o preço tem de diminuir”, explica.
Rodovias ruins
Assim como os caminhoneiros, os empresários do setor de transportes também defendem mais obras para melhorar as condições das rodovias, principalmente as federais. Segundo Malucelli, da Fetranspar, uma estrada em má condição aumenta em quase 30% o custo do transporte.
“Muitas rodovias, principalmente BRs, estão intransitáveis. E o custo de manutenção dos caminhões está cada vez mais alto. Hoje as únicas estradas que prestam são as que estão sob concessão. O resto é péssimo”, diz.
Caminhoneiros
A manifestação que parou as estradas do país é liderada pelos profissionais autônomos
As paralisações
A greve é promovida, prioritariamente, por caminhoneiros autônomos, que representam praticamente metade de toda a frota do país, que hoje é de 2,2 milhões de caminhões, de acordo com a Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT).
Forma de trabalho
Os autônomos possuem caminhão próprio e não têm carteira assinada. Trabalham de acordo com a oferta de frete disponível no mercado e, apesar de terem renda maior em comparação aos que trabalham para empresas, também arcam com despesas de combustível, manutenção, pedágios, depreciação e seguro do veículo. A categoria foi regulamentada com a Lei 7.290 de 1984.
Pauta de reivindicações
A ausência de uma pauta de reivindicações e lideranças unificadas complicaram a negociação com o governo federal. Os manifestantes reclamam da alta do preço do diesel, mas também pedem a criação de uma tabela única nacional de preços de frete; a prorrogação das dívidas contraídas com a compra de caminhões e a isenção da cobrança de pedágio para eixos suspensos.
Nos últimos anos o investimento federal em infraestrutura representou pouco mais de 2% do Produto Interno Bruto (PIB). De acordo com a economista Geovana Bertussi, da UnB, considerando apenas o eixo transporte, o índice cai para 0,6% do PIB. “É muito pouco. Com esse valor não se consegue nem manter, muito menos melhorar ou ampliar os equipamentos que já existem”, afirma.
Um dos principais desafios, segundo a especialista, é justamente elevar os investimentos no setor de infraestrutura no cenário atual do país de crescimento baixo e com problemas fiscais do governo.
Alto custo operacional
O diesel representa mais da metade do custo do frete, de acordo com estimativas tanto dos caminhoneiros quanto das entidades empresariais. A alta recente do combustível – quando o governo elevou as PIS/Cofins e da Cide – resultou no aumento de R$ 0,15 por litro do combustível, segundo a Fecamsp.
Os preços do combustível, assim como o dos pedágios, foram represados pelo governo federal desde 2013. Segundo a professora da UnB, a ausência de reajuste foi uma manobra do governo para controlar a inflação antes das eleições. “Acredito que tudo isso é basicamente um problema de gestão governamental”, afirma Geovana.
O presidente da Fetranspar também cita a falta de segurança nas estradas como outro problema que agrega cada vez mais custos aos transportadores. “Hoje cerca de 10% do faturamento é gasto em gerenciamento de risco. Falta segurança principalmente nas rodovias que cruzam o estado do Rio de Janeiro. Tem seguradoras que não aceitam mais fazer seguro de cargas que passam pela região. 75% dos assaltos a cargas acontecem lá”, diz.
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