O adiamento na recuperação da atividade econômica brasileira pode manter o aumento do endividamento público por mais tempo, segundo um estudo publicado nesta segunda-feira (5) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). No caso de uma retomada mais fraca do crescimento nos próximos anos, seguida de um cenário mais conservador para o aumento dos investimentos e da produtividade, a queda da Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG), principal indicador de endividamento público, só começaria a ocorrer a partir da segunda metade da década de 2020, mesmo com a aprovação da PEC do Teto dos Gastos e implementação da nova regra já em 2017.
No cenário que aparentemente se delineia atualmente, de uma recuperação lenta da atividade econômica, a dívida pública brasileira permaneceria crescendo até 2027, quando atingiria 88,9% do PIB. Só em 2028 teria início o processo de recuo no endividamento, que dez anos mais tarde, em 2037, estaria em 76,2% do PIB.
“À primeira vista, o resultado parece desalentador e requer algumas considerações. Em primeiro lugar, os resultados ignoram a possibilidade de quaisquer receitas extraordinárias que, eventualmente, poderiam reduzir o nível de dívida de forma mais rápida. A retirada parcial ou completa das desonerações fiscais também não foi considerada e poderia abreviar o ajuste”, ponderaram os autores José Ronaldo de Castro Souza Júnior e Francisco Santos, na nota.
Na hipótese mais otimista, o crescimento mais vigoroso do Produto Interno Bruto ajudaria a reduzir mais rapidamente a dívida, que atingiria o pico em 2020 (82,14%). Dez anos após a implementação da PEC, já estaria em 75,3% do PIB, para recuar ao patamar de 34,9% do PIB ao fim de 20 anos, em 2037. O estudo já leva em consideração o abatimento imediato dos R$ 100 bilhões da devolução do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
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Desempenho
O PIB brasileiro recuou 0,8% no terceiro trimestre de 2016 ante o trimestre imediatamente anterior, com perdas disseminadas entre os componentes, sobretudo indústria e investimentos. O resultado, divulgado na semana passada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), fez analistas de mercado calibrarem para baixo suas expectativas para o crescimento na economia. Já se fala em um possível novo recuo no PIB brasileiro de 2017.
“Curioso é que o PIB ruim já era esperado, mas, depois que saiu, houve uma consternação. Isso é ruim, porque pode levar as pessoas a quererem medidas que deem resultado rápido. Não existe solução que dê resultado rápido para que o PIB cresça, é preciso resolver o problema da dívida”, afirmou Souza Júnior.
No cenário de PIB mais fraco, o superávit primário só voltaria a crescer em 2022. Num cenário mais otimista para a atividade econômica, o superávit primário do governo geral já alcançaria o terreno positivo um ano antes, em 2021.
O estudo lembra que a Dívida Bruta do Governo Geral saltou de 51,3% para 72,5% do Produto Interno Bruto (PIB) entre 2013 e 2016. Se a tendência fosse mantida, o resultado seria uma trajetória explosiva da dívida, alertam os autores. Segundo eles, a proposta de emenda à Constituição em tramitação no Congresso visa justamente evitar que essa trajetória se concretize.
“Ao estabelecer um horizonte de longo prazo para o crescimento dos gastos públicos, a proposta busca reverter paulatinamente a trajetória ascendente da dívida pública, o que é essencial para a retomada da confiança na economia e, por conseguinte, para a redução do custo do capital e para a reversão da tendência de queda dos investimentos”, defenderam Souza Júnior e Almeida Santos, na nota.
Eles ressaltam ainda que as hipóteses para o PIB pressupõem que o regime fiscal seja implementado com sucesso. “Caso contrário, dificilmente seria possível obter a retomada do crescimento econômico e a queda dos juros previstas para os próximos anos”, acrescentaram.
Arcabouço
Em outro documento divulgado também nesta segunda, o Ipea defende que o principal desafio para a retomada da economia é “a estruturação de um arcabouço constitucional e infraconstitucional que dê suporte crível a um novo regime fiscal”.
“Os desajustes acumulados ao longo dos anos anteriores impõem uma longa trajetória para reequilibrar as contas públicas e, com isso, reduzir o custo de capital da economia. Concluída esta etapa, será necessário enfrentar as demais questões estruturais que vêm pesando sobre o desenvolvimento econômico brasileiro: melhorar o ambiente de negócios, com ênfase para a questão regulatória; reformar a estrutura tributária, que é excessivamente complexa e cria inúmeras distorções; alterar a legislação trabalhista, que é excessivamente rígida; e aumentar grau de exposição da economia ao comércio internacional”, afirmaram Souza Júnior e Paulo Levy, que assinam a Carta de Conjuntura do 4º Trimestre de 2016.
Segundo o documento, o crescimento da economia brasileira depende de uma série de mudanças estruturais, seguidamente adiadas por fatores conjunturais, que permitiram que o país crescesse sem se tornar mais produtivo. “Não será por meio de medidas simples de estímulos de curto prazo que o país voltará a crescer de forma consistente. O que se espera é que a gravidade da conjuntura atual seja capaz de evitar um novo e perigoso adiamento de tais mudanças”, avaliaram os autores.
Ambos os cenários levam em consideração que o PIB volta a crescer 1,20% em 2017, mas a partir de 2018 segue trajetória ascendente com mais força (alta média de 2,80% ao ano de 2018 a 2037) ou menos força (alta média de 1,93% ao ano de 2018 a 2037). Os resultados mais otimistas supõem ainda uma alta média de 4% ao ano nos investimentos de 2015 a 2037 e elevação de 1% na produtividade da economia a partir de 2018 (conforme observado na década de 2000) ou crescimento médio de 2,5% na Formação Bruta de Capital Fixo e avanço de 0,5% na produtividade a cada ano (valores próximos das médias para essas variáveis no período pós-Plano Real).
“Há uma ociosidade muito grande na economia brasileira. Então é de se esperar alguma recuperação cíclica a partir de 2018”, previu Souza Júnior.