Quando autoridades norte-americanas desvendaram a existência de um esquema de pirâmide (também chamado de esquema Ponzi) que envolvia bilhetes para o hit musical da Broadway “Hamilton” no mês passado, os promotores disseram haver telefonemas de um “grande nome” de investidor que tinha exigido o seu dinheiro de volta.
Na verdade, houve vários grandes nomes – incluindo os bilionários Paul Tudor Jones (um megainvestidor) e Michael Dell (fundador da fabricante de computadores Dell), bem como um executivo da Och-Ziff Capital Management Group – entre as mais de 125 pessoas que colocaram dinheiro no esquema, de acordo com pessoas com conhecimento do assunto.
Os líderes da pirâmide se aproximavam das pessoas e as encorajavam a colocar dinheiro em uma conta para comprar blocos de ingressos para os shows e peças de teatro mais demandados. O mais proeminente foi “Hamilton”, cuja popularidade empurrou os preços para o nível mais alto da história da Broadway. A promessa era de um retorno de pelo menos 10%.
É raro que um esquema Ponzi atraia tubarões dos negócios tão altamente qualificados na arte de avaliar investimentos. Mas para advogados veteranos do segmento de valores mobiliários, o caso tem algumas das características da pirâmide liderada por Bernard Madoff – em que a familiaridade de um sujeito pode ajudar a instilar a confiança, mesmo com uma promessa que parece boa demais para ser verdade.
“Quando a promessa de um dinheirinho rápido está sendo feita por alguém com quem você se socializa, é ainda mais tentador”, disse Paul Ryan, um advogado que trabalho na SEC, órgão que fiscaliza o mercado acionário americano. Ainda assim, “a ideia de que havia blocos de bilhetes para o espetáculo Hamilton disponíveis para compra deveria ter acendido o alerta.”
Três homens foram acusados. Um deles é Joseph Meli, promotor de eventos em Nova York. Ele aparece em fotos em festas com executivos e celebridades, incluindo Renee Zellweger. Seu parceiro seria Steven Simmons, que era supostamente o intermediário encarregado de arrecadar dinheiro de investidores. Ambos apareceram no tribunal em 27 de janeiro e permaneceram livres sob fiança.
Um terceiro membro, Mark Varacchi, se declarou culpado de fraude e foi libertado com fiança de US$ 250 mil. Varacchi era um gerente de fundo de investimento cuja empresa era baseada em Connecticut. Ele pediu ajuda a Meli para pagar US$ 4,2 milhões que ele tinha tomado de investidores, de acordo com promotores. Não está claro como ele conheceu Meli ou os outros. Meli e Simmons ainda não entraram em contestação. O advogado de Meli disse que as acusações de falsas, enquanto o advogado de Simmons se recusou a comentar.
A denúncia criminal descreveu um informante que entrou em contato com o FBI por meio de seu advogado no final do ano passado, dizendo que ele havia conspirado com Meli e outros para arrecadar dinheiro sob falsos pretextos para pagar um investidor anterior. Ele se ofereceu para ajudar na investigação –o informante foi Varacchi, de acordo com pessoas com conhecimento do caso.
O esquema durou pelo menos dois anos, de acordo com um caso civil paralelo que a SEC apresentou contra Meli e Matthew Harriton, seu parceiro de negócios. Harriton não pôde ser contatado para comentar, e suas empresas não responderam aos pedidos de comentários. Harriton não foi mencionado no caso criminal.
Meli mentiu para pelo menos uma vítima, alegando que ele tinha acesso a mais 35 mil ingressos para “Hamilton” e poderia vendê-los em uma marcação, de acordo com autoridades. Ele realmente entrou em contato com o produtor do show para revender bilhetes em massa, mas foi rejeitado, disseram. Em agosto de 2015, quando o show se mudou para a Broadway, eles disseram que Meli conversou com o “grande nome” investidor, oferecendo para apresentá-lo ao produtor do show. Enquanto a reunião nunca acontecia, o investidor enviou US$ 3,5 milhões à companhia da Meli para ajudar a comprar ingressos.
Ele também atraiu potenciais vítimas, alegando que outros investidores de alto nível, incluindo a Och-Ziff, estavam no negócio. Um deles disse que foi mostrado um contrato com o nome do fundo de hedge. Um executivo de Och-Ziff, Boaz Sidikaro, era amigo de Meli e investiu recursos próprios. Sidikaro não respondeu a um pedido de comentário. De acordo com seu perfil no LinkedIn, ele é um diretor executivo da empresa, onde trabalhou por quase 20 anos.
Com certeza, nem todos os investidores foram “pescados” pela chance de lucrar com o musical “Hamilton”. A SEC diz que Meli e Harriton arrecadaram dinheiro para quatro veículos de investimento. O primeiro prometeu revender bilhetes para uma variedade de “eventos de alto perfil”. Mas o musical apareceu em pelo menos algumas jogadas dos outros três veículos.
Michael Dell tem um patrimônio líquido estimado em US $ 19,6 bilhões, de acordo com o índice Bloomberg Billionaires, e a empresa que ele fundou, a Dell Technologies, é a maior empresa de tecnologia de ponta do mundo. Já Jones administra US $ 11 bilhões da Tudor Investment Corp., um dos mais antigos fundos de hedge. Ele ajudou a fundar a Fundação Robin Hood, uma instituição de caridade cuja meta é acabar com a pobreza em Nova York. Não há indicação de que os investidores estavam cientes de uma fraude e seus porta-vozes se recusaram a comentar.
Pirâmides como esta podem durar anos ou mesmo décadas, mas não se sustentam para sempre. De acordo com os promotores, Varacchi registrou telefonemas em dezembro em que Meli disse que estava levando dinheiro de novos investidores para pagar os antigos. Meli disse que tinha acabado de receber mais US $ 7 milhões de um novato, o suficiente para pacificar o grande investidor que cobrava retorno sobre seu investimento.