O governo federal editou uma medida provisória que permite repassar ao consumidor o prejuízo que as geradoras de energia têm ao produzir energia abaixo da chamada “garantia física” – o volume mínimo que, pelas regras do setor, elas têm de entregar ao sistema.
Mas o mesmo consumidor não recebeu dividendos no longo período em que as hidrelétricas geraram acima desse nível mínimo, podendo vender o excedente no mercado “spot”.
“Quando há saldo, os consumidores continuam pagando suas caras tarifas sem capturar essa vantagem. Quando há déficit, querem jogar nas nossas costas”, resume o engenheiro eletricista Roberto Pereira D’Araújo, diretor do Instituto Ilumina.
As geradoras alegam, com razão, que a decisão de gerar mais ou menos energia não cabe a elas, e sim ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Mas é fato que, nas épocas de sobra, nem as companhias nem o governo tiveram a iniciativa de propor a divisão dos ganhos com o público.
Nos 92 meses que vão de janeiro de 2005 a agosto de 2012, as hidrelétricas geraram acima da garantia física em 78 ocasiões. E puderam negociar a sobra no mercado livre, por um preço médio de R$ 47 por megawatt-hora (MWh), segundo cálculo do Ilumina.
Esse preço, muito inferior ao pago pelos clientes convencionais, beneficiou apenas os consumidores de grande porte – indústrias, shopping centers, hospitais e outros – que podem comprar sua eletricidade no mercado livre.
No período de déficit, de fins de 2012 para cá, as geradoras tiveram de comprar energia no mercado livre por R$ 660 por MWh, em média, para repor a falta que sua energia fez ao sistema. É essa conta que, segundo a medida provisória, poderá ser repassada aos consumidores caso o déficit ultrapasse a marca de 12% – neste ano, ele chegou a 17%. Até então, o chamado risco hidrológico era todo das geradoras.
Térmicas tardias
Chama atenção que o déficit começou justamente em setembro de 2012, mês em que a presidente Dilma Rousseff anunciou uma redução de 20% nas tarifas de energia. Foi quando o ONS determinou o acionamento de boa parte do parque termelétrico e, portanto, a redução na geração hidrelétrica.
Isso fez o custo da energia disparar, uma vez que a energia térmica é bem mais cara. A forte alta dos custos do setor foi sendo repassada às faturas dos consumidores. No Paraná, a tarifa residencial da Copel subiu 51% apenas em 2015, e mais que dobrou nos últimos dois anos.