Mario Mesquita, diretor do BC: regime precisa manter a credibilidade| Foto: Marcello Cazal Jr./ABr

Adotar outro regime de política monetária, a exemplo dos Estados Unidos, colocaria em risco o controle da inflação no Brasil, avalia o secretário de Política Econômica do Banco Central, Mário Mesquita. Em entrevista concedida por e-mail à Gazeta do Povo, ele considera que o sistema adotado tem sido bem sucedido na tarefa de aliar queda nos juros ao crescimento da economia.

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Os críticos da condução da política monetária acreditam que o sistema de metas brasileiro poderia ser mais flexível, com um prazo de convergência mais longo para a meta de inflação? Isso é possível?

A questão do prazo de convergência [da meta da inflação] mais longo deve levar em conta a questão da credibilidade e do compromisso com o regime de metas. Um prazo de convergência mais longo significaria compromisso mais fraco em trazer a inflação de volta à trajetória de metas, o que provavelmente ocasionaria aumento dos prêmios de risco e das taxas de juros do mercado. Além disso, o Banco Central tem atuado com bastante flexibilidade na implementação do regime. Quando houve uma forte aceleração inflacionária em meados de 2008, o Banco Central anunciou que trabalharia para trazer a inflação de volta para a meta em 2009, ou seja, em um prazo mais dilatado que o ano calendário.

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E a adoção de um indicador de núcleo da inflação?

Não acreditamos que a mudança para um indicador de núcleo seja de fácil implementação. Em primeiro lugar, por uma questão de transparência, o regime de metas deve prestar contas ao cidadão comum, não necessariamente aos economistas ou analistas de mercado. O público em geral sente os efeitos da inflação cheia em seu poder de compra, e não das medidas de núcleo. Em segundo lugar, vale notar que não há consenso entre os economistas sobre qual medida de núcleo seria a mais adequada. Tal mudança, portanto, poderia reduzir a credibilidade do regime.

Não seria a hora de se acabar com títulos lastreados na Selic, para evitar o contágio da dívida pública pela taxa?

A maior parcela da dívida pública não está mais indexada à taxa Selic. Ao fim e ao cabo, será uma inflação baixa e estável que permitirá o alongamento do prazo da dívida pública e o aumento da parcela dos títulos prefixados em sua composição.

Há países que não adotam sistemas de metas e ainda assim aliam inflação controlada ao crescimento econômico. O contexto brasileiro permitiria a adoção de outro regime?

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A decisão sobre o regime monetário cabe à sociedade e não ao Banco Central. No entanto, parece evidente que o atual regime é consideravelmente superior às suas alternativas. Vejamos: o Brasil já teve regime de meta cambial, e nesse regime praticaram-se taxas de juros muito mais elevadas do que as observadas durante o regime de metas para inflação. Outra alternativa poderia ser, simplesmente, a adoção de um regime puramente discricionário, no qual a prioridade da política monetária iria mudando ao longo do tempo. Ocorre que tal regime não ofereceria uma âncora nominal para a economia e, por não deixar claro o que quer o Banco Central, também tenderia a elevar os prêmios de risco e as taxas de juro de mercado. Note-se a esse respeito que o Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos, mesmo sem ter meta formal para a inflação, tem procurado tornar explícito e quantificar seu compromisso com a estabilidade de preços, exatamente para deixar claro qual é o objetivo da política monetária.