O perfil da dívida pública brasileira foi o grande "calcanhar de Aquiles" na implantação do sistema de metas para a inflação, avalia o professor José Luiz Oreiro, da UnB. Além disso, outras variáveis, como a fragilidade externa e algumas crises (o apagão, em 2001, e a crise da Argentina, em 2002), configuraram um cenário hostil à adoção do regime.

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Há dez anos, mais da metade da dívida brasileira, resultado da emissão de Letras Financeiras do Tesouro (LFTs), estava indexada à taxa Selic. Mas essa taxa é um instrumento de política monetária, ela baliza os empréstimos que os bancos fazem entre si, pelo prazo de um dia – e serve de base para todos os demais financiamentos no mercado.

Em outros países, essa taxa interbancária costuma ser inferior à taxa dos títulos públicos, que o governo usa para se financiar. Nos Estados Unidos, a taxa de empréstimo interbancário, a "Fed Funds rate", está entre 0% e 0,25%. Já os títulos da dívida pública norte-americana com prazo de 30 anos pagam cerca de 3,5%. No Brasil, a mesma taxa pelo empréstimo de um dia entre os bancos (a Selic) serve para remunerar as LFTs, títulos da dívida pública com prazo de muitas décadas.

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Com grande parte da dívida atrelada à Selic, qualquer alteração nos juros criava um "dilema de Sofia" para o BC, diz Oreiro. "No momento em que há saída de capitais do país, se o BC não faz nada, o câmbio se desvaloriza (o dólar sobe). Só que a dívida indexada ao câmbio sobe junto. Mas, se o BC aumentar a taxa de juros, o câmbio não sobe tanto, mas a parte da dívida indexada aos juros sobe. Nos primeiros três anos do regime de metas, esse foi o grande calcanhar de Aquiles." O perfil da dívida pública só começou a melhorar a partir do primeiro mandato do presidente Lula, em 2003, quando a parte da dívida indexada ao câmbio foi eliminada. (FL)