O governo anunciou ontem medidas que têm potencial para incentivar a economia de formas diferentes: uma a curtíssimo prazo e outra estrutural, de horizonte mais longo. A primeira promete injetar, quase imediatamente, R$ 40 bilhões na economia. Ao autorizar saques de contas inativas do FGTS, a equipe econômica mira um alívio já para os próximos meses, na avaliação de analistas. Já a minirreforma trabalhista faz parte de um conjunto de outras medidas que têm por objetivo melhorar o ambiente de negócios no país.
A possibilidade de permitir que trabalhadores usem dinheiro do FGTS, que rende pouco, para quitar dívidas ou consumir foi bem recebida por economistas. A medida, no entanto, tem caráter de emergência. Deve servir para dar fôlego extra em um início de ano que deve ser difícil. Segundo o boletim Focus, a mediana das previsões indica que o PIB recuará 0,73% no primeiro trimestre de 2017, frente a igual período de 2016.
Medida emergencial
Para o economista Claudio Frischtak, sócio-diretor da Inter.B Consultoria, trata-se de uma medida emergencial.“O governo está olhando o curto prazo, especificamente o primeiro trimestre do ano que vem. O ciclo dos consumidores brasileiros é se endividar em novembro e dezembro e pagar em janeiro, o mês mais complicado. A ideia é reduzir a pressão sobre as famílias e facilitar o pagamento de dívidas”.
Ao mexer no FGTS, cujos recursos financiam investimento em infraestrutura, saneamento básico e construção civil, o economista avalia que a equipe econômica fez uma escolha clara: trocou investimento por consumo.
“O governo está vendo que não há muito investimento com os recursos do FGTS. Então resolveu usá-los numa situação de emergência. Está trocando o desconhecido pelo conhecido”.
Thais Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados, também vê um impacto de curto prazo na liberação dos recursos. Ela não acredita, no entanto, que o aumento do dinheiro em circulação será suficiente para reativar a economia.
“Não tem mágica. Esse tipo de medida acaba gerando algum alívio, que faz sentido do ponto de vista do trabalhador. Hoje em dia, o FGTS rende menos que a inflação, o trabalhador perde poder de compra. É positivo que ele tenha acesso a esse dinheiro. Pode trazer um certo alívio, mas não é o que vai fazer a economia voltar a crescer”, analisa.
Se os saques ao Fundo tentam evitar uma retração nos próximos meses, as mudanças na legislação trabalhista devem ter impacto nos próximos anos. O projeto apresentado ontem tem pontos que, na avaliação de economistas, podem aumentar a segurança do empregador ao contratar. Em tese, isso significaria mais emprego.
‘Lei alguma é capaz de gerar empregos’
O economista Gabriel Ulyssea, professor da PUC-Rio, destaca que a mudança nas regras da jornada parcial, por exemplo, pode facilitar a contratação de trabalhadores jovens e mulheres. Pela proposta do governo, o trabalho parcial poderá ter jornada de até 30 horas semanais (hoje são 25), ou de 26 horas mais seis horas extras na semana. Na prática, quem busca jornadas mais flexíveis acaba indo para a informalidade, explica.
“No caso das mulheres, isso está bem claro. Na idade de ter filhos, a demanda por arranjos mais flexíveis é de primeira ordem. O número de mulheres na informalidade é muito maior que o de homens. No caso dos jovens, é importante porque eles têm um processo natural de descoberta no mercado de trabalho e, por não terem histórico, são uma incógnita para o empregador”, argumenta Ulyssea.
Assim como liberar o saque do FGTS não tem fôlego para sustentar a economia a longo prazo, a reforma trabalhista não deve surtir efeito assim que for adotada. Segundo o IBGE, a taxa de desemprego brasileira ficou em 11,8% no trimestre encerrado em outubro. Para o sociólogo José Pastore, professor da USP e especialista em relações de trabalho, a legislação não tem capacidade para reduzir a desocupação, mas pode incentivar empregadores.
“Lei alguma é capaz de gerar emprego. Se isso fosse possível, não tinha desemprego no mundo. O que gera é investimento. Agora, uma lei que dá segurança para as partes, que garante que o que foi acordado não vai ser contestado, reduz o medo de contratar, hoje muito grande”, avalia o especialista.
Frischtak, da Inter.B, lembra que, apesar de não ter efeito sobre o PIB, a reforma é importante para melhorar o ambiente de negócios.
“Tem coisas que impulsionam o PIB: consumo, setor externo, investimento... Outras coisas fazem parte do ambiente de negócios no Brasil. Não vejo a reforma trabalhista impulsionando o PIB. Ela tem outro tipo de importância, mais estrutural”, afirma o economista.
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