A inclusão do surfe como modalidade olímpica a partir de Tóquio 2020 e a hegemonia dos surfistas brasileiros nos campeonatos mundiais da categoria, conhecida como Brazilian Storm (tempestade brasileira), estão turbinando os negócios ligados ao esporte no país, mesmo com a recessão econômica. A conquista de dois campeonatos mundiais consecutivos, com Gabriel Medina (em 2014) e Adriano de Souza, o Mineirinho (em 2015), fez aumentar o número de praticantes e o interesse pelo estilo de vida saudável, dizem empresários.
“Estima-se que 90% do consumo de produtos ligados ao surfe não venham dos surfistas, mas dos simpatizantes. E, mesmo com a crise, este boom do esporte atraiu consumidores e está movimentando os negócios”, diz Alexandre Zeni, presidente do Instituto Brasileiro do Surfe (Ibrasurf), entidade dedicada à promoção do esporte.
O Ibrasurf estima que existem três milhões de praticantes do esporte no país. Juntos, atletas e admiradores do estilo de vida movimentam R$ 7 bilhões ao ano, entre gastos com moda surfwear (camisetas, bermudas, bonés, óculos), além da compra de pranchas e acessórios. Mas o volume financeiro é ainda maior, pois o esporte impulsiona também turismo, hotelaria, gastos com alimentação e transportes nas cidades litorâneas - despesas que não estão contabilizadas no número do Ibrasurf.
O interesse pelo surfe levou à realização, esta semana em São Paulo, da The Board Trader Show, maior feira de pranchas e acessórios do mundo, que termina neste domingo. É a primeira vez que o evento acontece no país. A expectativa dos organizadores é que circulem dez mil visitantes, que vão gastar cerca de R$ 30 milhões.
“O mercado de equipamentos, incluindo pranchas, cresceu 20% ao ano nos últimos três anos”, diz Claudio Martins, que assessora a feira e é CEO do Waves, maior portal de surfe da América Latina.
As marcas nacionais respondem pela fabricação de 80 mil pranchas por ano, cerca de 20% da produção mundial, que chega a 400 mil unidades/ano, segundo levantamento do consultor e editor do site da The Board Trader Show, Edison Leite Junior. EUA e a Austrália são os principais mercados, seguidos de Brasil e Europa. Há 1.500 fábricas de pranchas no Brasil e ao menos 85% delas são microempresas, produzindo de dez a 20 pranchas por mês.
Entre as maiores fabricantes está a WetWorks, do Rio, que produz entre 450 e 500 pranchas por mês, tem 30 funcionários e já se prepara para começar a produzir em Los Angeles, nos EUA. Joca Secco, um dos sócios, afirma que a produção nos EUA deve começar em 2017. Para ele, no Brasil, além dos novos praticantes, há um movimento de retomada do esporte por pessoas que surfaram no passado e agora voltam a pegar onda.
“São advogados, médicos, juízes que, no passado já praticaram e, agora, junto com seus filhos, estão retomando o surfe”, diz Secco.
Ele diz que o preço das pranchas varia de R$ 1.500 a R$ 2.200, mas há produtos mais caros.
A Pró Ilha, de São Francisco Sul, está entre as maiores fabricantes de pranchas do país, além de exportar para Chile e Peru. A média mensal é de 500 unidades, revela Gustavo Pereira, que trabalha na administração da empresa. Nos últimos dois anos, ele conta que cresceu a produção por stand up paddle (SUP) e foi preciso terceirizar a fabricação.
No segmento de surfwear, as marcas nacionais começam a despontar, já rivalizando com as estrangeiras. Entre elas, está a Mufa, que faz camisetas, bermudas, bonés e abriu sua primeira loja física no Fashion Mall, em São Conrado. A marca nasceu há três anos e usava sobras de tecidos para fazer “doze camisetas exclusivas”. Agora, vai lançar coleções em parcerias com artistas, mas sempre procurando manter o número limitado de peças para garantir exclusividade aos clientes.
“Queremos vender o life style do surfe”, diz um dos sócios e fundador da Mufa, o empresário Rick Cavalcante, de 28 anos, contando que a empresa vem dobrando o faturamento a cada ano.
Ele acredita que a vitória dos sufistas brasileiros ajuda a fortalecer as marcas nacionais e observa que aumentou o número de atletas à procura de patrocínio na Mufa, que já montou uma equipe.
O empresário Marcelo Brígido, da WQSurf, abriu sua primeira loja no Madureira Shopping, em 2005, para vender roupas e acessórios ligados ao esporte de marcas mundiais. Hoje, são 21 lojas em shoppings do Rio, além de patrocínio para atletas, organização de campeonatos e administração de uma escola de surfe. Atualmente, Brígido só faz a gestão das franquias da marca. Cada loja recebe em média 1.500 clientes ao mês e o faturamento varia entre R$ 60 mil e R$ 160 mil.
“O surfe desmistificou a imagem que o público tinha da modalidade no passado: do atleta cabeludo, que ficava na praia o dia todo. O esporte está associado a um estilo de vida mais saudável e atrai a atenção de grandes empresas”, diz.
O Brasil tem dez atletas na primeira divisão do surfe, o WCT, sendo sete de São Paulo, dois do Rio Grande do Norte e um de Santa Catarina. É o maior número que o país já teve nesta categoria. Além dos títulos mundiais, brasileiros arrebataram nos últimos anos o campeonato da segunda divisão e mundiais júnior e de amadores.
Gabriel Medina, primeiro brasileiro campeão mundial no WCT, que já foi chamado de “o Neymar do surfe”, é patrocinado por algumas empresas que não têm relação direta com o esporte. Entre elas estão Oi, Guaraná Antarctica, Mitsubishi, Samsung, Gillette, e marcas de surfwear como a australiana Rip Curl e a Coppertone, de protetor solar.
Felipe Silveira, CEO da Rip Curl no Brasil, diz que a associação contribui para a expansão de negócios, como uma linha de calçados assinados pelo atleta ou a abertura de uma loja Gabriel Medina. As vendas crescem a um ritmo de 10% ao ano. “O Gabriel é muito carismático e ativo nas redes sociais e isso tem impacto nos negócios.”
O atleta tem mais de cinco milhões de seguidores em redes sociais e está construindo, em Maresias, litoral de São Paulo, um instituto para treinar surfistas, dos dez aos 16 anos.
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