A Caixa Econômica Federal vai levar pelo menos mais dois meses para tirar do papel o uso do FGTS como garantia para empréstimos consignados. A nova linha, com condições mais favoráveis aos trabalhadores, tendo em vista que a garantia diminui o risco de os bancos tomarem calote, deveria estar em vigor desde 30 de março, quando o governo da presidente afastada Dilma Rousseff mandou a Medida Provisória (MP) ao Congresso. Mas só vai estar disponível, segundo estimativas do governo, em setembro.
O trabalhador que queira usar 10% do saldo do FGTS e a totalidade da multa rescisória (de 40% sobre o total depositado pelo empregador) como garantia para um empréstimo consignado ainda não vai encontrar essa opção porque o sistema que permitiria aos bancos criar a linha não foi desenvolvido pela Caixa.
O banco respondeu, em nota, que, nas próximas semanas, vai iniciar as “tratativas no âmbito técnico”, inclusive sobre a formatação do modelo operacional. Só então poderá estimar o prazo necessário para o desenvolvimento e implantação do novo serviço. “A Caixa destaca que já tem desenvolvido estudos e adotado medidas internas que independem da formatação do respectivo modelo operacional, de modo a favorecer a implantação mais qualificada desse novo processo”, afirmou a instituição.
O conselho curador do FGTS, formado por representantes do governo, dos trabalhadores e dos patrões, também não fez sua parte, que era definir as condições desse empréstimo, ou seja, as taxas mensais e o número máximo de parcelas que podem ser cobrados nas operações.
Segundo o coordenador-geral do FGTS no Ministério do Trabalho, Bolivar Moura Neto, a decisão sobre as características desses empréstimos só deve sair em setembro. Nesta quarta-feira (20), o conselho curador se reúne, mas o assunto não está na pauta.
Uma das propostas é que os juros do consignado com garantia do FGTS sejam semelhantes aos cobrados nas operações para os aposentados do INSS, de 2,34% ao mês. No entanto, segundo Moura Neto, o conselho curador só quer bater o martelo sobre a taxa quando for possível que os trabalhadores contratem a operação no dia seguinte, o que depende da Caixa.
Os bancos cobram juros menores – em comparação com outras linhas – nos empréstimos consignados porque os descontos são feitos diretamente na folha de pagamento. No caso dos trabalhadores da iniciativa privada, porém, havia resistência por parte das instituições financeiras por conta do risco de os empregados serem demitidos.
Os bancos eram mais restritivos aos trabalhadores da iniciativa privada por conta desse risco. A maior parte do consignado é destinada a funcionários públicos e aposentados e pensionistas do INSS, que respondem por mais de 90% do que foi desembolsado.
Juro maior
O risco de calote por conta da demissão também encarecia as operações para os trabalhadores do setor privado que pagaram, em média, 43,9% de juros ao ano, em maio, segundo dados do Banco Central, enquanto os funcionários públicos e beneficiários do INSS pagaram 27,7% e 30,7% no período, respectivamente. Mesmo assim, as taxas foram menores do que os 53,9% cobrados, em média, nas operações de crédito pessoal.
Mesmo sendo usados como “caução” nos empréstimos consignados, os recursos do FGTS não ficarão bloqueados na conta do trabalhador. Ele poderá usar, por exemplo, para moradia ou doença quando ele for demitido, seguindo as regras do fundo. Os 10% do total mais a multa só serão destinados ao pagamento do consignado caso haja necessidade desse montante para quitar o resto do empréstimo no momento da demissão.
Colocar em “banho-maria” a operacionalização do empréstimo consignado com garantia do FGTS também foi uma forma de conter as críticas à medida dentro do conselho curador do fundo. “Estamos dando uma corda para o trabalhador se enforcar”, diz Luige Nese, da Confederação Nacional de Serviços (CNS).
Ao propor a medida, o governo Dilma estimou que se apenas 10% do total do FGTS mais as multas por demissão sem justa causa fossem usados, seriam injetados R$ 17 bilhões na economia. “Essa lei só fará encher o bolso dos bancos, para manter seus lucros, e prejudicará o trabalhador, que aumentará mais seu nível de endividamento”, disse Mário Avelino, presidente do sistema Fundo Devido ao Trabalhador.