A competitividade do comércio exterior brasileiro, que vinha abalada e sem demonstrar sinais de recuperação, pode estar em vias de apresentar melhorias perante o cenário internacional. É esta a crença de Welber Barral, ex-secretário de comércio exterior, especialista em negociação internacional, que hoje preside o Brazil Industries Coalition (BIC) e atua como árbitro no Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul e na Organização Mundial do Comércio (OMC). “A boa notícia é que o Brasil tem tanto a fazer, que se nós conseguirmos algumas mudanças internas, vamos aumentar muito a competitividade das exportações”, afirma.
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Ele esteve em Curitiba no dia 16 para uma conversa com o Comitê de Comércio Exterior da Câmara Americana de Comércio (Amcham-Curitiba) . Barral apresentou uma análise sobre o atual momento do comércio internacional brasileiro, com base nos seus mais de vinte anos de experiência como consultor para agências governamentais e empresas na América Latina. Após o evento, ele conversou com a nossa reportagem sobre este cenário, a postura do novo governo com relação a isso, e as perspectivas futuras para o segmento.
Qual a sua visão, em linhas gerais, sobre o momento do comércio internacional brasileiro?
Depois de muitas décadas, o comércio internacional está crescendo pouco, abaixo do PIB. É um mercado altamente competitivo que contrasta com o momento atual do Brasil, afinal de contas o que o país precisa agora é aumentar suas exportações.
E quais os indicadores que medem o impacto do cenário político-econômico do país neste contexto?
O principal indicador é a questão do câmbio, pois o país sempre teve um câmbio sobrevalorizado. Agora nós estamos em um momento de maior equilíbrio. O câmbio vai ter um efeito importante no comércio internacional nos próximos anos. Ele tem um efeito duplo: de um lado, o Real mais desvalorizado pode facilitar as exportações brasileiras, mas por outro lado ele também aumenta a competitividade do produto brasileiro dentro do nosso próprio mercado, em comparação com produtos importados. O efeito do câmbio é muito importante para a recuperação da indústria.
Sobre os mega-acordos de comércio internacionais que não contaram com a participação do Brasil, qual é a postura do novo governo?
O Brasil durante muitos focou fundamentalmente na OMC, e na conclusão da Rodada Doha, que teria sido muito positiva para o país. No entanto, como o imobilismo da OMC neste sentido, o novo governo tem adotado uma nova estratégia que é de acelerar a negociação de acordos internacionais. O Brasil tem que fazer isso, mas não necessariamente o resultado vai ser de curto prazo. Por exemplo, a negociação do Mercosul com a União Europeia foi retomada, mas é um processo que ainda vai levar alguns anos para ser concluído e efetivado.
Dentro disso, quais as dificuldades e possíveis estratégias que o país pode usar diante deste contexto?
A boa notícia é que o Brasil tem tanto a fazer, que se nós conseguirmos algumas mudanças internas, nós vamos aumentar muito a competitividade das exportações. O Brasil precisa criar um sistema tributário que seja mais favorável às exportações, pois ainda há muito acúmulo fiscal na cadeia; deve simplificar e reduzir a burocracia no comércio exterior; e ainda tem muito a investir em infraestrutura. Todas estas mudanças têm impacto positivo, pois o Brasil pode aumentar muito a sua competitividade sem depender do mercado internacional.
E você acha que a postura do novo governo é de realmente fazer isso?
Algumas propostas que foram colocadas pelo novo governo caminham neste sentido. Há, por exemplo, a estratégia de fazer concessões e parcerias público-privadas em um prazo muito curto. Há ainda as estratégias de aumento de negociações de acordos internacionais, e de criação da janela única de comércio exterior para simplificar e reduzir a burocracia. O Brasil assinou o acordo de facilitação de comércio, e isso tornou necessária a adoção de medidas para aumentar a transparência do comércio exterior. Tudo isso é positivo, a grande questão no governo, no entanto, sempre é o tempo necessário para fazer isso.
Qual a sua visão sobre estas estratégias?
Seguramente tem muito que poderia ser feito, como a facilitação da vida internacional das pequenas e médias empresas, e a diminuição da complexidade para empresas brasileiras abrirem filiais no exterior. Ou seja, há uma lista de temas que não estão sendo abordados pelo governo que também são cruciais. Mas como eu lhe disse, tem tanto a fazer que qualquer coisa que for feita trará um resultado positivo.
E mesmo neste contexto, temos vários casos de empresas que estão conseguindo investir na internacionalização.
As notícias boas são realmente essas. Há a inventividade do brasileiro que consegue realizar uma operação mesmo diante desta perspectiva. Além disso, os empresários brasileiros estão vendo que o mercado nacional ainda vai demorar alguns anos para se recuperar, principalmente no setor de varejo. Ou seja, eles estão percebendo a necessidade de participar do mercado internacional, até mesmo como uma forma de diminuir seu risco de operação no Brasil.
Em quais áreas você acha que há mais oportunidades para empresas brasileiras no exterior?
Seguramente, a área onde o Brasil não tem competidores no mercado internacional é a de alimentos e alimentos processados, onde o país tem indústrias muito bem estabelecidas. O grande desafio, no entanto, é o setor de serviços. Temos que lembrar que o setor de serviços já é responsável por mais de 70% do PIB, e o país fundamentalmente não exporta serviços. A dificuldade é maior, os mercados são diferentes, as regulações muitas vezes são diferentes, há menos financiamento, há uma dependência grande de mão-de-obra local. São várias características do setor que dificultam a internacionalização. Apesar disso nós estamos vendo transportadoras brasileiras indo pro exterior, consultorias, empresas de software e fornecedoras do mercado financeiro. São empresas que geraram competitividade no Brasil e que conseguem naturalmente sair para a América Latina, que acaba sendo um mercado mais acessível para estas empresas.
Além do processo burocrático, que outras dificuldades existem para empresas que querem começar a atuar internacionalmente?
Um outro enorme problema é a estrutura tributária. Por exemplo, a empresa brasileira média que resolva ter uma filial no exterior passa a ser tributada como lucro real no Brasil, e isso tem um impacto contábil e fiscal enorme. Ou seja, o Brasil tem esta prática trágica de punir a internacionalização, o que faz com que empresas da China e da Índia, por exemplo, estejam muito à frente das brasileiras nesse processo de operação internacional.
O Mercosul e a América Latina são considerados por muitos empreendedores uma alternativa mais viável e acessível expandir. Quais os fatores que motivam essa viabilidade?
O Brasil tem acordos comerciais com vários destes países, e também está fechando acordos de serviços e investimentos. A proximidade cultural e física também facilita a instalação das empresas brasileiras nestes países. Além disso tudo, hoje alguns destes países estão em momentos econômicos muito interessantes, como a Colômbia, o México, o Peru e o Chile. São países que tem tido um crescimento bastante sustentável, onde pode ser gerada uma escala interessante, mesmo sendo mercados menores que o brasileiro.
O que o novo governo e o empresariado brasileiro podem aprender com estes bons exemplos de crescimento?
Acho que se olharmos o que estes países estão fazendo, vamos ver que eles estão passando por um grande, e necessário, processo de abertura econômica e comercial. Eles estão também criando estruturas regulatórias mais leves. Ou seja, o governo tem que notar que a intervenção estatal cria muito custo e dificuldades para o empreendedor.
Falando sobre a negociação do Mercosul com a União Europeia, com o surgimento de um acordo, qual pode ser o impacto neste contexto?
Um acordo como esse seria fundamental, pois garantiria mais acesso dos produtos agrícolas do Mercosul a um mercado premium como a União Europeia, além de facilitar investimentos europeus nos países do Mercosul. Por outro lado, temos que ser realistas que é uma negociação muito difícil, pois há um protecionismo grande na Europa, principalmente nos países agrícolas, contra este acordo. Além disso, há ainda a questão do prazo, pois é uma negociação complexa, que vai levar tempo para se encerrar, com vários detalhes e marcos regulatórios. E depois de tudo isso, mesmo que seja possível assinar um acordo, vale lembrar que este documento precisa ser aprovado pelos governos dos países envolvidos. Ou seja, é algo que deve sim ser feito, mas que não deve gerar um impacto direto pelo menos nos próximos dois anos.
A maior parte da exportação brasileira é baseada em commodities. O que fazer para reverter este quadro e aumentar as exportações de manufaturados?
A resposta é simples: é necessário aumentar a competitividade da manufatura no Brasil. Agora, a execução é que é mais complexa. Neste caso, a revisão começa com o sistema tributário que pune a agregação de valor, o alto custo da mão-de-obra brasileira, o grande número de exigências regulatórias que encarecem a produção, e uma infraestrutura que também gera muito custo.
Você falou bastante sobre o problema da mentalidade do empresariado brasileiro com relação à substituição das importações. Qual sua opinião sobre o tema e o que fazer para reverter esta mentalidade?
Esta é uma visão bastante mercantilista que ainda está muito impregnada na sociedade brasileira como um todo. Por isso é necessário um esforço para educar, até mesmo uma boa parte da elite brasileira, sobre o que nós queremos de inserção internacional no Brasil. Há uma discussão, não realizada, sobre qual é a nossa estratégia de inserção internacional. Nós não temos clareza com relação a isso, e vários outros países emergentes já tem as suas estratégias definidas. É uma discussão inacabada, pois o Brasil nunca parou para pensar nisso. O país não está isolado do mundo. As coisas vão continuar a acontecer, queiramos ou não, e nós temos que ter uma estratégia para isso.
Você acredita que este tema será abordado com mais atenção pelos próximos candidatos à presidência, em 2018?
Daqui até 2018 o Brasil vai ser submetido a uma série de pressões, quanto ao futuro da OMC, quanto à conclusão de acordos por outros países, com relação à participação cada vez maior da China na América Latina. Vai haver uma série de pressões que vão obrigar o Brasil a pensar na sua inserção internacional a partir de 2018.
Para finalizarmos, qual a sua expectativa para o futuro do cenário brasileiro de comércio exterior?
Olhando para a economia primeiramente, podemos dizer que o Brasil vai se recuperar, apesar do governo. A economia brasileira tem um mercado interno tão grande, que ele vai continuar com seu ciclo econômico. Agora, o prazo de recuperação é que vai depender de quais reformas forem implementadas ou não pelo governo federal. De qualquer forma, nós devemos ter um 2017 melhor que 2016, e um 2018 melhor que 2017. Não sabemos quanto ainda, mas há uma expectativa de 1 a 1,5% de crescimento para o ano que vem, e 3 a 3,5% em 2018.
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