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No novo modelo de ensino médio que o governo pretende implantar aos poucos nos próximos anos no Brasil não serão eliminadas disciplinas como Artes, Educação Física, Química, Física, Matemática, Geografia, etc. O esclarecimento, dado pelo Ministério da Educação no final desta quinta-feira (22), foi necessário após o anúncio da reforma nesta etapa do ensino ter desencadeado uma série de dúvidas entre educadores e opinião pública. O texto da Medida Provisória (MP) foi publicado em edição extra do Diário Oficial da União nesta sexta-feira (23).
O documento foi preparado durante o governo Dilma Rousseff, fruto de uma discussão que existe ao menos há 10 anos sobre o modelo que hoje é usado - criado na ditadura militar - e que gerou vários textos legislativos, como o projeto de lei nº 6.840, de 2013. A sua edição só não foi levada adiante pela petista por causa do processo de impeachment.
A proposta do governo não é eliminar um conjunto comum de disciplinas, mas garantir que matérias-chaves para a compreensão de outras disciplinas, como português e matemática e conteúdos básicos de outras matérias, tenham mais horas de aula, e deixar que o estudante escolha no restante do tempo algum ramo do conhecimento para se aprofundar. Este é o modelo adotado em diversos países como Alemanha e Suíça, e tem bons resultados – diferentemente do que ocorre no Brasil, em que os estudantes saem do ensino médio com lacunas graves em português e matemática. No Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), o ensino médio ficou estagnado, longe da média de qualidade esperada para esta etapa, com nota 3,7 (veja abaixo). No ranking de qualidade medido no Pisa, avaliação internacional da OCDE com 65 países, o Brasil está na 58ª. colocação.
A ideia também é reduzir o número de jovens entre 15 e 17 anos que não estudam nem trabalham, hoje 1,7 milhão de pessoas. Com a possibilidade de poder escolher um ramo do conhecimento específico que mais lhe agrade, o governo acredita que será mais fácil manter esses adolescentes em sala de aula.
Críticas
O anúncio dividiu a opinião dos especialistas. O fato de o governo ter optado por impor a reforma por meio de MP, ao invés de fazer uma consulta pública e votar o texto final, é talvez a atitude mais criticada.
“O ensino médio precisa de mudanças, mas elas devem ser dialogadas de forma democrática para se evitar o amadorismo pedagógico. As entidades de formação de professores, os professores e os estudantes, que conhecem a realidade da escola, também tem que opinar para que, de fato, a reforma contemple todos os enormes desafios do ensino médio e não promova mais desigualdades”, avalia a coordenadora de projetos da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Maria Rehder.
A decisão também desrespeita as discussões que envolvem educadores de todo o país sobre a Base Nacional Curricular Comum (BNCC), afirma Dirce Djanira Pacheco e Zan, diretora da Faculdade de Educação da Universidade de Campinas (Unicamp). “Pela falta de recursos para a educação, havia um consenso que a necessária reforma do ensino médio começaria a partir da melhora do currículo”, lembra. Além disso, a professora da Unicamp lembra que como o governo já anunciou que não vai aumentar o orçamento para a educação nos próximos anos, a medida provisória conta com recursos inexistentes e tende a sucatear o ensino médio.
A Campanha Nacional pela Educação também questiona o fato de a medida não abordar questões relacionadas à melhoria da infraestrutura e da valorização dos profissionais da educação, o que também tem reflexos sobre a evasão escolar. “Quando se fala em evasão não se fala só de carga horária, mas de que a escola precisa ser melhor para atrair os alunos e garantir sua permanência. A maior carga horária, inclusive, pode restringir o acesso daqueles que realmente precisam trabalhar ou que já estão fora da escola”, pontua Maria Rehder.
Outra crítica levantada por Maria Rehder refere-se ao risco de a flexibilização não valorizar a formação crítica e humanística do aluno, o que também contribuiu para prepará-lo para a escolha da área de conhecimento na qual ele deseja se aprofundar.
Baixa evasão em escolas de tempo integral
A professora visitante de Harvard e ex-diretora de educação do Banco Mundial, Claudia Costin, também não considera a MP a melhor forma de se resolver propostas de ensino, mas acredita que a reforma pode trazer avanços para o ensino médio. “O jovem tem hoje a sua cabeça fragmentada com um currículo enciclopédico, mas que não leva a desenvolver nenhuma competência”, avalia. Claudia também acredita que a proposta deve ser acompanhada com medidas para formar melhor os professores, que passa por rever o conteúdo ensinado nas universidades, além de oferecer salários atraentes para conquistar os melhores alunos para a docência.
“Hoje ensinamos teoria da educação, história da educação, filosofia da educação. Imagina se fizéssemos isso com um médico, se ensinássemos teoria da medicina, história da medicina e filosofia da medicina e colocássemos um paciente na frente do médico. Em resumo, o currículo do professor precisa enfatizar muito mais a prática do professor e as didáticas específicas”, explica.
Ela acrescenta que o aperfeiçoamento da proposta, a partir da garantia da diversidade de enfoques e de trajetórias educativas, irá proporcionar ao aluno tornar-se protagonista do seu processo de aprendizagem, como ocorre nas escolas estaduais de Pernambuco, por exemplo, que tiveram as melhores notas no Ideb e baixo índice de evasão.
A professora comentou estas e outras questões relacionadas à reforma do ensino médio em entrevista concedida à Gazeta do Povo na tarde desta sexta-feira (23), antes de dar uma conferência no XVI Congresso Paranaense de Gestão de Pessoas (CONPARH 2016). Confira.
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