Depois de anos em ascensão no número de matrículas, as instituições de ensino superior privadas no Brasil começaram a sentir os efeitos da crise. O Ministério da Educação ainda não publicou os números oficiais de matrículas em 2015, mas estabelecimentos de diferentes estados confirmam as baixas.
INFOGRÁFICO: Contas no vermelho
1,15 mil professores foram demitidos em Curitiba e RMC desde 2014
Um dos impactos mais dramáticos da crise que chegou às instituições particulares é o aumento no número de demissões de professores e o parcelamento do reajuste salarial para repor a inflação. Em algumas universidades, essas demissões são consideradas parte de um movimento de equilíbrio de contas que, por vezes, envolve a substituição de profissionais contratados há mais tempo por novos docentes com a mesma titulação, que chegam recebendo um salário menor. Em outras situações, diante das dificuldades econômicas, a reposição dá lugar ao fechamento de vagas.
Em Curitiba e região metropolitana, desde abril de 2014, 1.149 professores foram demitidos, de acordo com o Sinpes, sindicato da categoria. Na lista, ainda que as empresas afirmem terem desligado apenas profissionais sem titulação, figuram profissionais com doutorado, alguns com mais 30 anos de serviços prestados. “Os empregadores ficaram mal acostumados com a injeção de verbas públicas nos anos de governo petista e passaram a administrar confiando no ingresso desses valores; agora, quando essas verbas diminuem em face da conjuntura nacional desfavorável, pretendem controlar a crise dessa forma”, lamenta Valdyr Perrini, vice-presidente do sindicato.
Por outro lado, quem permanece nos quadros da rede particular de ensino superior batalha por não sofrer perdas salariais. Este ano, as instituições de Curitiba e região metropolitana propõem o aumento de 6% no salário dos docentes e parcelar o restante do reajuste necessário para repor a inflação do período, que ultrapassou os 12%, a partir de agosto. “Tivemos um pico na inflação e por isso não pudemos fazer o reajuste total, mas vamos escalonar de forma que em 2017 os professores não tenham perda nenhuma”, garantiu Jacir Venturi, do Sinepe-PR.
Em nota, o Sinpes disse discordar “veementemente da alternativa de arrocho salarial dos professores e empregados não docentes como forma de contornar a atual crise econômica pela qual todo o país atravessa”. Segundo o sindicato, as instituições demitem e aumentam as mensalidades “enquanto prosseguem investindo pesadamente em projetos que potencializam seus lucros”.
No Paraná, após um crescimento de 23,9% no número de matrículas de cursos presenciais entre 2009 e 2014 – um pouco abaixo da média registrada no Brasil nesse período, que foi de 25,8% –, as instituições de ensino superior privadas no estado registraram uma queda em 2015, que persiste em 2016, segundo o Sinepe-PR, sindicato das empresas, que não divulgou dados mais concretos.
As causas para esse cenário são principalmente duas: as consequências da crise econômica e a redução do financiamento público das mensalidades realizada por meio do Fies. Os números são expressivos: em 2014 eram 732 mil vagas pelo programa; em 2015 apenas 278 mil foram beneficiados. Em 2016, a previsão do Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior (Semesp) é que os estudantes com Fies não passem de 222 mil.
A crise também é responsável por outro efeito negativo sobre o faturamento das instituições, a inadimplência, que cresceu em 2015 e, no caso das mensalidades, ficou acima da taxa média de pessoas físicas medida pelo Banco Central. Enquanto 6,2% das famílias tiveram que atrasar o pagamento das contas por mais de 90 dias no ano passado, dentro do ambiente universitário esse número chegou a 8,8%. Ou seja: é mais comum deixar para depois a mensalidade do curso do que outras obrigações financeiras.
Houve um aumento de 12,9% na inadimplência em faculdades, universidades e centros universitários de 2014 para 2015. Neste ano, a previsão é de estabilidade: conforme o Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior (Semesp), responsável pela pesquisa, essa taxa deve ficar em 9% em 2016.
O aperto nas contas significa que a construção de novos campi, a oferta de mais cursos e a revitalização de laboratórios, entre outros planos, acabaram ficando para depois – quando não são cancelados. Neste contexto, prédios deixam de ser erguidos, salas não passam por reformas, e profissionais ficam sem promoção. “No Paraná, muitas instituições de ensino tiveram uma contenção de gastos; continuaram a investir apenas as que tinham caixa”, disse Jacir Venturi, presidente do Sinepe-PR.
A crise atinge o bolso de todos. Para professores, que veem menos turmas sendo formadas, a quantidade de horas/aula diminui, o que tem influência direta nos salários. Para os estudantes, cada vez mais preocupados com as contas, o aproveitamento também pode cair e resultar em um período maior até a graduação.
Apesar desse quadro, as instituições acreditam que em 2017 o setor voltará a apresentar uma curva positiva de crescimento. “Como a economia dá sinais de melhora, ainda que contidos, somos otimistas com o futuro. As iniciativas das próprias instituições e o crescimento de outras modalidades de ensino, como o realizado a distância, também serão importantes”, reforça Venturi.
Responsáveis por abrigar a maior parte dos estudantes que estão matriculados em uma faculdade – 76% dos matriculados no ensino superior em 2014 frequentavam a rede privada –, as instituições particulares são fundamentais para que o Brasil possa atingir uma das metas do Plano Nacional de Educação (PNE): a de elevar a taxa bruta de matrículas na educação superior de 34,2%, em 2014, para 50% até 2024. Como em uma difícil etapa do vestibular, são elas agora que terão de provar sua resistência.
A força do ensino a distância
Ao mesmo tempo em que os cursos presenciais nas instituições de ensino superior veem cair o número de matrículas, os cursos a distância registraram de 2004 a 2014 crescimentos entre 15% a 20% ao ano. As mensalidades desses cursos são, em geral, muito menores se comparadas a dos cursos presenciais e, graças à popularidade alcançada em outros países – como os Estados Unidos, em que 80% das universidades oferecem cursos on-line –, os preconceitos a esse modelo diminuem no país.