Ao completar 99 anos nesta segunda-feira, a Universidade Federal do Paraná (UFPR) inicia o ano do seu centenário. As celebrações seguem até o dia 19 de dezembro de 2012, estimulando a reflexão sobre a boa fase pela qual passa a principal universidade paranaense. Foi em meio às reuniões que definiram os detalhes das comemorações que o reitor Zaki Akel Sobrinho recebeu a reportagem da Gazeta do Povo em seu gabinete, em Curitiba. "A cada ano a universidade se renova e temos a vontade de avançar cada vez mais, discutindo sustentabilidade, fontes de energia renováveis e tudo o que diz respeito à sociedade paranaense", afirma o reitor e ex-aluno de Administração da instituição. Confira trechos da entrevista em que Akel Sobrinho fala de detalhes históricos da UFPR, da luta por verbas públicas, do desafio de atender às reivindicações de alunos, da política de cotas, entre outros temas.
Embora esse não seja um consenso entre os historiadores, como o Paraná se tornou o primeiro estado a ter uma universidade?
No início foi muito difícil, ainda mais porque havia um ceticismo em relação a existir uma universidade no Paraná. O estado havia recém-perdido a questão do Contestado e uma porção importante do território. Depois de ter deixado de ser a 5.ª comarca de São Paulo, em algum tempo nos tornamos um estado independente e autônomo. Foi em uma época em que surge a ideia de que precisávamos criar uma identidade, ou forjar uma identidade, para o povo paranaense, desvinculada de São Paulo e de Santa Catarina. Depois da união de dois grupos um liderado por Nilo Cairo e o outro por Victor Ferreira do Amaral é que a universidade começa, ainda particular.
Como era a universidade nesse início?
Era de um funcionamento precário, inicialmente na Rua Comendador Araújo, onde hoje está o Shopping Omar. O prédio da Santos Andrade só foi construído mais tarde, em um período de mais maturidade. Houve uma lei, em 1915, que proibiu o funcionamento da instituição pelo fato de a cidade não ter o número mínimo de habitantes exigido para a instalação de uma universidade. Depois ainda houve uma batalha para reunificar os cursos, que foram separados em faculdades.
Quais foram os principais marcos da Federal nos seus 99 anos?
Em 1950, em busca de verbas públicas para o funcionamento e manutenção, ela vence a batalha pela federalização. Entre 1950 e 1960 tivemos um grande salto em termos de infraestrutura. A partir daí foram construídos o complexo da Reitoria, o Hospital de Clínicas e o Centro Politécnico, um marco da arquitetura paranaense. A época da ditadura também foi um período turbulento. Como a universidade é um local de defesa da democracia e espaço prioritário de discussão e da pluralidade de ideias, recebeu muitos ataques nesta época. A partir da resistência ao regime militar são criados movimentos, como o dos professores, que mais tarde vão lutar pelas eleições diretas para a reitoria.
O que esses fatos representaram para a transformação da instituição?
A partir dali, a eleição passou a ser direta para reitor e em todos os níveis. A Reforma Universitária de 1973 acabou com as faculdades, transformando-as em setores. O funcionamento mudou e passamos a ter departamentos que atendem aos cursos.
A luta por mais recursos foi uma constante ao longo dos 99 anos?
Mais recentemente tivemos grandes dificuldades com uma falta de financiamento agudo. Faltava dinheiro, havia uma dívida de R$ 5 milhões e chegamos a não pagar contas de luz e água. Com o presidente Lula, houve uma retomada do projeto da universidade pública. Passamos a receber investimentos e o Reuni [Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais], no meu entender, foi uma grande janela de oportunidade para crescer. Conseguimos melhorar muito a universidade. Hoje vemos estudantes mais novos reclamando e falando em sucateamento da estrutura. Eu gostaria que eles tivessem visto como estávamos antes.
No que os estudantes têm razão quando reclamam? Como estão as pautas reivindicadas na última greve?
Hoje temos 600 cafés da manhã sendo servidos todos os dias no RU [restaurante universitário]. Conversei com a estudante que pediu a refeição 1,1 milhão do ano e ela me contou que toma café da manhã no RU todos os dias e agradeceu por isso. Essa era uma demanda dos estudantes que não havíamos percebido. É gostoso quando podemos atendê-los. Estamos atendendo às pautas de todos os movimentos da paralisação. Tivemos o diagnóstico das bibliotecas e vamos ampliar o horário de atendimento e instalar máquinas de drive-tru para devoluções fora do horário. Queremos trazer os alunos para o nosso lado e melhorar esse relacionamento.
E, segundo o reitor, do que a universidade ainda precisa?
Melhorar o espírito universitário. As pessoas precisam estar cada vez mais apaixonadas pela universidade. Sou reitor 24 horas por dia. Almoço e janto assuntos da universidade. Quando vejo a falta de compromisso de algumas pessoas, outros interesses trazidos aqui para dentro, eu me desaponto. Estamos em uma campanha para mudar isso. A universidade não chegaria aos 99 anos tão vitalizada se não fosse pela dedicação e fé, se não considerássemos a educação como o maior agente de transformação social. Não precisamos de um discurso sobre que universidade queremos ser, temos de ser a universidade que o Paraná precisa.
O que falta para a UFPR se tornar essa instituição que o estado precisa?
Estamos caminhando em passos rápidos para isso, investindo em ensino, pesquisa, extensão. Temos um fórum com grande debate sobre o papel da universidade, inclusive em outros níveis, no ensino fundamental e médio. Nosso papel vai além do interesse e da discussão de conteúdos. Nos preocupamos com a formação de talentos para atuar na área de educação. Com o PNE [Plano Nacional de Educação], um dos focos centrais é o papel do educador e não vamos mudar o país enquanto não tivermos salários dignos. Temos de pensar no educador como um profissional. A paixão precisa ser correspondida.
Qual será o caminho depois de entrar no primeiro centenário?
Temos um novo período pela frente e vamos começar com muita energia. Comemoramos o centenário pensando em um evento de planejamento estratégico com ações até 2022. Temos 100 obras em andamento, desde reformas de laboratórios até construção de novas sedes. Vamos inaugurar o câmpus Teixeira Soares depois de uma revitalização com sustentabilidade, em que os insumos do prédio atual serão aproveitados, sem demolição. Estamos em expansão sem perder a excelência acadêmica e isso requer infraestrutura. Estamos nos aproximando da data de revisão das cotas de ingresso nas universidades federais. Como está caminhando esse sistema na UFPR?
Temos uma previsão de revisão ao fim dos 10 anos de implantação e tem sido uma lição receber os cotistas e conviver com as diferenças. Uma das coisas mais ricas de uma universidade é a diversidade de pessoas, sob todos os aspectos. As cotas para afrodescendentes não têm sido usadas na totalidade, mas as que sobram são automaticamente redirecionadas para quem veio de escolas públicas. E ainda temos as direcionadas a indígenas. Acabamos de formar a primeira odontóloga que agora retornou pra sua aldeia.
Como a universidade tem enfrentado a evasão de estudantes?
Logo que entrei na reitoria, a pauta era recheada de solicitações de recurso contra o jubilamento. Mas eu sou contra esses recursos, pois o estudante que não cumpre seu curso no prazo máximo, que é uma vez e meia o período normal, deve desocupar aquela vaga para outro aluno. Se isso não acontece, ele está usando mal esse dinheiro público que está sendo investido na vaga. Uma das contrapartidas pelo investimento recebido por meio do Reuni é o combate à evasão. Nossa meta é aprovar 90% dos alunos. Para isso, contamos também com a transferência de alunos, que também podem ser da rede privada, para ocupar as cadeiras vazias.
>>> Zaki Akel Sobrinho fala em vídeo sobre o centenário da UFPR.
Vida e Cidadania | 1:47
No início da celebração do centenário da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o reitor Zaki Akel Sobrinho explica qual é a importância da instituição para o Estado.
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