Pai e filho, amizade à parte!

Quem foi que disse que pais e filhos podem ser amigos? Pelo menos para o psicoterapeuta e escritor Içami Tiba, especialista em Educação, acreditar nisso na fase da adolescência é pura "ilusão". Na opinião do médico, os amigos são escolhas dos filhos e os pais, figuras a que devem respeito e obediência, principalmente por serem dependentes legal e financeiramente deles. "O melhor amigo, mesmo que o jovem não tenha, nunca é o pai. O pai tem que ser pai, isso tem que ficar claro", enfatiza Tiba. O médico é formado pela Universidade de São Paulo (USP) e em psiquiatria pelo Hospital das Clínicas da USP.

Em entrevista à Gazeta do Povo Online, Tiba (foto) falou ainda sobre o seu mais recente livro: Adolescentes: Quem Ama, Educa!, há seis semanas no mercado. A obra, uma espécie de volume dois de Quem Ama, Educa!, de 2003, foi lançada em Curitiba nesta quinta-feira e, nesta sexta, será a vez do lançamento em Londrina. Tiba também comentou sobre dúvidas freqüentes dos pais, como anda a Educação no Brasil, e que não existe mais diferenças entre meninos e meninas. Confira os principais trechos da entrevista.

Gazeta do Povo Online - Qual a mensagem embutida aos pais nas duas edições do Quem Ama, Educa!?Içami Tiba - Hoje, não se cria mais crianças, se educa crianças. Antigamente, era quem ama cria, quem ama cuida, quem ama perdoa, e aí vinham adolescentes sem educação porque faltou um item: quem ama, educa. Quem ama, tem que preparar os filhos para a vida. Não adianta só deixar crescer, dar do melhor para o filho se não ensinar esse filho a se virar. Então o pai dá o melhor que tem, o filho não sabe aproveitar, aí recebe a empresa do pai e ela vai à falência. É daí que vem o Quem Ama, Educa!, que é preparar para a vida. E Adolescentes porque é muito diferente lidar com crianças e adolescentes. Se com crianças os pais estão apanhando imagina o que não está acontecendo com os adolescentes então.

Esta é mesmo a pior fase entre pais e filhos?Certamente, porque os adolescentes consomem os conhecimentos recém lançados, as tecnologias. Os pais só consomem o que eles vão precisar se perder emprego, correr risco de vida, enfim, por necessidade, e os filhos vão por curiosidade. Começa a surgir então a grande diferença entre a geração dos filhos de hoje e a geração dos pais que sustentam esses filhos. E aí os pais acham que os filhos viram consumistas, porque os próprios pais, que nem sabem lidar com o celular, vêem o filho querer trocar o modelo novo de um celular que já tirava fotografia. Isso é demais para os pais.

Quem é que se abre mais com os pais, o menino ou a menina?Em geral, a menina se abre mais porque ela fala muito, e o menino já com hormônios é um cara mais calado. O menino que fala muito é porque não chegou nessa fase de ficar parecido com o pai, porque o pai também fala menos. Pelo fato da filha falar mais, pensar em voz alta, apesar de nem sempre querer a solução dos pais, ela fala o problema. Então, os pais ficam sabendo em geral mais.

Quais as dúvidas mais freqüentes dos pais com relação à criação dos filhos?Os pais estão perdidos, não sabem o que fazer, se soltam os filhos, se cobram deles, se engolem o sapo. É totalmente diferente do que era antes. Antigamente, os pais prendiam no quarto e ficavam sossegados porque os filhos estavam presos. Hoje, prendem os filhos no quarto e eles estão na internet, em uma esquina virtual, com um cara que nunca viram. Aí fica perigoso porque, pelo menos, maus elementos da padaria os pais conseguem vislumbrar. O maior problema hoje é que os pais não sabem se controlam, se não controlam. Quando o filho quer mudar de escola, se deixa mudar ou não deixa. O que é que faz se todo mundo fuma maconha e ele não quer deixar o filho fumar. Só que esse negócio que todo mundo fuma é falso, é um argumento que os jovens usam que quer dizer o seguinte: todas as pessoas que o filho se relaciona fumam, mas não significa que todo o mundo fuma. Aí o pai não entende a mensagem e fica achando que o filho é o inocente e que o mundo é que está perdido.

Qual a melhor forma dos pais manterem o bom relacionamento com filhos adolescentes? A primeira coisa que o pai tem que colocar na cabeça é que ele não é amigo do filho e também essa história de dizer que é melhor amigo do filho. Eu tenho pena do filho, porque amigos são de escolha e qualquer adolescente precisa de pai e mãe, porque eles ainda são dependentes financeira e legalmente dos pais. O pai não sai para a balada com o filho para abater menina junto com ele, para experimentar maconha, essas coisas. É uma ilusão o pai achar que é o melhor amigo, porque não é. O melhor amigo, mesmo que o jovem não tenha, nunca é o pai. O pai tem que ser pai, isso tem que ficar claro.

Ainda existe diferença entre meninos e meninas?Cada vez mais está diminuindo essa diferença, meninas estão tomando iniciativas. Não tem mais esse negócio de menino pode menina não pode, prendam suas cabeças porque meu bode está solto. As meninas vão e elas são "serial kisses" mesmo, abatendo homem por homem, beijou joga fora. E a mesma coisa os meninos, os "ficantes". Eles ficam com uma menina, aí vai diminuindo o entusiasmo e já pegam outra, é de consumo imediato. Então, essa diferença entre homem e mulher já não tem mais tanta, porque isso é um ranço do machismo. E eu acho isso muito bom, porque no fundo as meninas estão usufruindo das coisas que elas mais lutaram para mudar.

Como especialista na área, qual a sua avaliação sobre o sistema educacional no Brasil atualmente?Eu acho que a educação está muito atrasada, porque ela ainda está na época da informação, quando nós estamos vivendo a era do conhecimento. Ainda se exige que o aluno decore coisas, e em todo esquema que é montado para o aluno passar de ano, ele só estuda na véspera da prova. Isso é muito mau para a formação, porque não existe trabalho onde a pessoa só vai trabalhar no dia do pagamento. Não existe um emprego onde a pessoa só trabalhe 200 dias, que é o número redondo de aulas que o aluno acaba indo para a escola por ano. E não existe aquilo de se fizer metade está bom. Se é para tirar nota cinco, então vamos estudar só as páginas ímpares? Para que estudar as páginas pares? Enquanto a educação ficar nesse nível, não adianta mudar estrutura de escola, não adianta colocar poucos alunos ou muitos alunos, não é pagando mais professores com o mesmo sistema que a educação vai melhorar. A educação vai melhorar na hora que mudar o paradigma do aprendizado. Ou seja, do aluno que recebe a informação e responde pela prova, para o aluno que sabe e responde pelo cotidiano.

Confira na próxima semana a segunda parte da entrevista com o médico e escritor Içami Tiba. O entrevistado vai falar sobre a profissão de médico, mercado de trabalho, preparação e a nova geração de doutores. Saiba mais sobre a carreira e a bibliografia de Içami Tiba no site www.tiba.com.br.