Apesar de ver nos últimos anos suas receitas dispararem, impulsionadas por fusões, alta nas mensalidades e pela ampliação do Financiamento Estudantil (Fies), os grandes grupos educacionais de ensino superior com ações na bolsa têm direcionado proporção cada vez menor de recursos para a principal matéria-prima: os professores. A remuneração dos docentes em relação à receita líquida passou de 45% em 2010 para 35% no ano passado, na média dessas empresas.

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Instituições trocam docentes, reduzem carga e lotam salas

A estratégia adotada por algumas instituições de ensino para diminuir gastos com professores passa pela substituição de professores antigos por mais novos, fechamento de salas e redução no número de horas/aula por docente, intensificando as atividades a distância.

Professores e alunos da antiga Uniabc - adquirida pela Anhanguera há quatro anos e desde 2014 parte da Kroton - contam que alunos de semestres diferentes fazem aulas na mesma sala. É uma forma de, ao abrir apenas salas cheias, potencializar o trabalho do professor. “Uma educação que reduz os professores significa falta de prestígio dos docentes e descompromisso com a qualidade?”, diz o professor Nelson Valverde, que leciona na unidade.

Além de diminuir a demanda por docentes, as salas chegam a ter mais 80 alunos. “Isso atrapalha a aula, inviabiliza a participação, não tem nem como tirar uma dúvida”, diz Pedro Virgílio Benaventi, que aos 60 anos cursa Engenharia na Anhanguera.

Sob condição de anonimato, a professora C.S., de 52, conta que as instituições estão demitindo quem ganha mais. “Depois contratam quem está no mestrado. Preferi sair antes”, diz ele, que, após seis anos, pediu demissão semana passada da Anhanguera.

O diretor do Sindicato dos Professores de São Paulo (Sinpro-SP), Marcelo Marin, diz que algumas instituições têm diminuído carga horária como forma de pressionar a saída. “Eles passam de 4 para 3 aulas por dia, evitam até o adicional noturno. O professor que não aceita é demitido. E muitos topam trabalhar com valores menores.” A Kroton defendeu que a carreira docente é valorizada na empresa e que oscilações de carga horária são naturais.

O Ministério da Educação (MEC) exige que um terço dos professores das instituições seja mestre ou doutor. Enquanto o grupo Anima tem 81% dos professores com título, acima da média do setor privado (65,3%), a Kroton tem 42%.

Como o MEC não fala em mínimo de doutores, prepondera o emprego de mestres. A média de doutores no setor privado é de 18,2% - nas quatro empresas é de 14,4%. Entre as públicas, é de 53,2%.

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As companhias Kroton (Anhanguera), Anima, Estácio e Ser, que têm capital aberto, tiveram, em média, salto de 201% na receita líquida no período. A bruta, sem desconto de impostos, saltou 233%. Um desempenho considerado extraordinário no País. A maior parte desses recursos foi revertida em lucro aos acionistas.

A Kroton, por exemplo, gastou no ano passado 29% da sua receita com os professores - em 2010, esse porcentual era de 52%. A Ser Educacional manteve esse gasto estável no período e em 2014 gastava 26%.

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Os dados foram extraídos dos balanços financeiros e notas explicativas divulgadas ao mercado pelas empresas. As informações foram processadas e analisadas pela consultoria de Oscar Malvessi, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), a pedido da Federação dos Professores do Estado de São Paulo (Fepesp). A análise abordou as quatro únicas empresas que têm capital aberto e, por isso, são obrigadas a manter a transparência de seus dados.

Como comparação, Malvessi analisou os mesmos critérios de outras duas instituições, cujos dados eram públicos. O gasto com professores no Mackenzie responde por 67% da receita. Na Unicsul, empresa particular de capital fechado, é de 52%. Nas públicas, esse porcentual quase sempre supera 70%.

Questionado, o Sindicato das Mantenedoras (Semesp) informou que, entre 2008 e 2011, o porcentual de gasto com professores estava aumentando nas instituições privadas. Levantamento do Semesp com 2 mil instituições mostra que, desde 2008, a tendência era de aumento do gasto. Em 2011, ele representava 40% da receita.

Custo

A queda no gasto com docentes veio a reboque de uma diminuição do custo total dos serviços prestados. Passou de 62% em 2010 para 47% em 2014, na média das empresas.

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Autor do estudo, Malvessi indica que, economicamente, os resultados são excelentes. “Houve um contexto de oportunidade que foi muito bem aproveitado pelas empresas. E o Fies foi muito importante, viabilizou o acesso dos alunos. Como contrapartida, veio receita e crescimento”, diz. “Mas a educação merece uma atenção especial das empresas, entidades, do governo e da sociedade. Se não, os interessados no negócio de educação ficam restritos aos ganhos financeiros.”

As quatro empresas concentram 23% de 1,9 milhão de contratos do Fies firmados até o ano passado. Na Kroton, cerca de 60% dos alunos têm Fies. Na Anima são 39%.

Com o avanço do Fies, as empresas passaram a ter repasses garantidos do governo, diminuindo o risco de inadimplência - mesmo cobrando mensalidades maiores. Entre 2010 e 2014, o valor médio das mensalidades no ensino superior privado aumentou 13%, como revelou reportagem do jornal “O Estado de S. Paulo” em fevereiro. Já o gasto do governo com o Fies, desde 2011, saltou 647%, enquanto o número de contratos cresceu 374%.

O presidente da Fepesp, Celso Napolitano, diz que há um descompasso entre os lucros e os investimentos com os professores. “Essa grande lucratividade resultou em enxugamento dos gastos com corpo docente, em detrimento das condições do trabalho e da qualidade do ensino”, diz ele. “É um tipo de gestão em termos massificados que, com relação à educação, é arriscada para a qualidade.”

Melhoria
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O diretor executivo do Semesp, Rodrigo Capelato, afirma ser natural que o porcentual de gasto com professores seja menor em empresas maiores. “Isso se deve ao ganho de escala e não à precarização da mão de obra”, diz ele, que defendeu melhoria na qualificação dos docentes no setor privado.

“Quando se tem um volume maior de alunos, obviamente, pode-se otimizar a quantidade de professores. Isso até melhora a qualidade, pois o docente fica exclusivo daquela instituição, uma vez que ela tem turmas e aulas suficientes para preencher todo o tempo.”

As instituições de ensino afirmam que houve investimentos nos docentes e melhoria de qualidade dos cursos. A diretora da Associação Brasileira para o Desenvolvimento da Educação Superior (Abraes), Elizabeth Guedes, diz que a folha salarial vem aumentando nos últimos anos. “Se ela cresce menos do que a receita, isso se deve a um planejamento cada vez mais eficiente dos recursos utilizados”, diz. “Estamos obtendo resultados e elevando a qualidade acadêmica.” A Abraes representa as empresas de capital aberto, além dos grupos Devry e Laureate.

Após as mudanças no Fies do fim de 2014, houve pressão por parte do setor na negociação salarial dos docentes. A data-base era em março e a definição do reajuste saiu em junho. “Conseguimos a duras penas um aumento real de 0,57%, mas o resto das melhorias na carreira ficou parado”, afirma Napolitano. A Fepesp pretende ainda reivindicar participação de lucro e resultados.

Instituições trocam docentes, reduzem carga e lotam salas

A estratégia adotada por algumas instituições de ensino para diminuir gastos com professores passa pela substituição de professores antigos por mais novos, fechamento de salas e redução no número de horas/aula por docente, intensificando as atividades a distância.

Professores e alunos da antiga Uniabc - adquirida pela Anhanguera há quatro anos e desde 2014 parte da Kroton - contam que alunos de semestres diferentes fazem aulas na mesma sala. É uma forma de, ao abrir apenas salas cheias, potencializar o trabalho do professor. “Uma educação que reduz os professores significa falta de prestígio dos docentes e descompromisso com a qualidade?”, diz o professor Nelson Valverde, que leciona na unidade.

Além de diminuir a demanda por docentes, as salas chegam a ter mais 80 alunos. “Isso atrapalha a aula, inviabiliza a participação, não tem nem como tirar uma dúvida”, diz Pedro Virgílio Benaventi, que aos 60 anos cursa Engenharia na Anhanguera.

Sob condição de anonimato, a professora C.S., de 52, conta que as instituições estão demitindo quem ganha mais. “Depois contratam quem está no mestrado. Preferi sair antes”, diz ele, que, após seis anos, pediu demissão semana passada da Anhanguera.

O diretor do Sindicato dos Professores de São Paulo (Sinpro-SP), Marcelo Marin, diz que algumas instituições têm diminuído carga horária como forma de pressionar a saída. “Eles passam de 4 para 3 aulas por dia, evitam até o adicional noturno. O professor que não aceita é demitido. E muitos topam trabalhar com valores menores.” A Kroton defendeu que a carreira docente é valorizada na empresa e que oscilações de carga horária são naturais.

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