Um grupo de trabalho avalia desde março alterações no documento interno que rege as escolas estaduais de São Paulo. Poderá ser modificada, entre outros pontos, a transferência compulsória, ou seja, quando um aluno é obrigado a mudar de unidade em casos de comportamento inadequado considerado grave.
O grupo foi montado após a Secretaria Estadual de Educação (SEE) ser acionada em inquérito do Ministério Público Estadual (MPE), que apura as transferências. Após reunir reclamações de pais e do Conselho Tutelar de possíveis abusos na aplicação de sanções em dez escolas públicas, o MPE questionou a legalidade da medida. Também há três denúncias contra escolas privadas.
O argumento contra a transferência compulsória é de que a Constituição Federal garante igualdade de condições de acesso e permanência na unidade. “Ou a escola trabalha conceitos éticos e ensina a conviver, para que problemas ocorram em menor frequência, ou fica essa situação de jogar o problema de um lado para outro”, diz o promotor do Grupo de Atuação Especial de Educação (Geduc) João Paulo Faustinoni.
Outra crítica é a falta de ampla defesa do aluno acusado. “Normalmente, não há nenhum regramento sobre o procedimento de defesa desses alunos, o direito ao contraditório”, diz o promotor. Os conselhos de Educação do Paraná e do Distrito Federal já vetaram a transferência compulsória. Os Ministérios Públicos de Goiás e do Espírito Santo também recomendam o fim da medida.
Um dos casos com o MPE ocorreu em uma escola na Vila Arriete, zona sul, que tentou expulsar oito alunos em 2013, por acusações de indisciplina, desacato, dano ao patrimônio público e até assédio sexual a docentes. Quatro foram transferidos e os outros ficaram, por falta de vagas em outras unidades.
Mayk Martins, de 17 anos, morador do Capão Redondo, na zona sul, foi transferido duas vezes de escolas estaduais. A primeira foi por bagunça. “Pus fogo no lixo da escola.” O episódio aconteceu quando estava no 8º ano do ensino fundamental, série que ele ainda não concluiu. Martins também invadiu o banheiro feminino com uma câmera. Da segunda escola, foi transferido por faltar muito para andar de skate.
Para Faustinoni, casos graves como o da aluna de 12 anos estuprada em maio por três adolescentes no banheiro de uma escola estadual no Jardim Miriam, também na zona sul, não são de competência da escola. “Deve-se responder, inclusive, perante à Vara de Infância e Juventude. Já quando há dano ao patrimônio público, pode-se ter alternativas de reparação.”
Em nota, a SEE informou que as escolas têm autonomia para definir seus regimentos com base na proposta pedagógica. Disse ainda que transferências devem ocorrer “em caráter de proteção ao menor, e não de rejeição”, mas não detalhou as atividades do grupo de trabalho.