Aposta olímpica
O investimento em atletas ainda é uma prática distante de se tornar comum na cultura universitária brasileira, mas a proximidade dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro parece motivar algumas iniciativas. A experiência pela qual passa a nadadora Alessandra Marchioro (foto superior), 19 anos, é um exemplo. Atleta do Fluminense, ela recebeu bolsa integral, com direito a escolher qualquer curso, para treinar na PUCPR e representar a universidade nas competições por onde passar. Em novembro, ela venceu o Campeonato Brasileiro Júnior com o melhor índice da competição, 25s63 nos 50 metros livre, e é cotada como uma das apostas para a Olimpíada de 2016.
Campeonatos
Como a maioria dos atletas norte-americanos começa sua carreira no ambiente acadêmico, os campeonatos universitários têm grande importância para todo o setor esportivo do país. Em algumas modalidades profissionais, como beisebol e basquete, nem sequer existem as categorias de base, comuns no Brasil. Com raras exceções, os times são montados exclusivamente com os atletas revelados pelas universidades.
Opinião Por que o esporte universitário brasileiro não funciona
Adriana Brum, repórter da editoria de Esportes, competiu nos Jogos Universitários entre 2001 e 2003 e cobriu a Olimpíada de Londres.
Mesmo com incentivo do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), que passou a apoiar (e financiar) um campeonato nacional para atletas do ensino superior desde 2005, ainda falta muito para o Brasil ter um esporte universitário de alto nível.
As universidades brasileiras estão a anos-luz de dar condições plenas a atletas com potencial de se desenvolverem durante o período em que dividem as atenções com os estudos, treinos e competições. Menos mal é que hoje muitos atletas conseguem bolsas de estudo para assegurarem uma formação superior enquanto fora das universidades seguem investindo em suas carreiras de atletas.
Dois pontos são relevantes para entender por que o esporte universitário segue amador no país. O primeiro é que o Brasil não consegue definir uma agenda de política esportiva. Por mais que se fale em necessidade de investimento, não há uma proposta de como a verba deva ser investida.
O segundo ponto é cultural. O brasileiro não vê compatibilidade entre os esforços físico (principal atribuição de qualquer esporte) e mental (base do estudo acadêmico). Além disso, acredita firmemente na vitória esportiva como resultado do talento de cada atleta e não no esforço árduo de treinamentos sistematizados anos a fio pesquisas apontam ser necessário pelo menos uma década de dedicação total para um atleta ingressar nas principais disputas em qualquer modalidade.
Cabe lembrar, porém, que esse impasse ideológico não é exclusividade nossa, brasileiros. Os próprios norte-americanos convivem com essa dicotomia. Tanto que para muitos atletas o talento esportivo é o único meio de carimbar o passaporte para o mundo acadêmico.
A relação existente entre esporte e universidade, essência do modelo norte-americano na formação de atletas, é invejada por países de todo o mundo. Até hoje, nenhuma outra tentativa conseguiu agregar em um mesmo sistema o sucesso em Jogos Olímpicos e benefícios ao aluno esportista. Quando o exemplo dos Estados Unidos é comparado com as tentativas brasileiras de vincular o esporte à academia, o resultado não é muito animador. Sem uma definição clara de papéis na formação de atletas, universidades, governos e clubes jogam a responsabilidade uns para os outros e dificultam a criação de uma tradição esportiva nas instituições de ensino superior.
Para o professor de Políticas Públicas do Esporte e vice-diretor do Setor de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Fernando Mezzadri, a formação de atletas dentro das universidades brasileiras não é eficiente porque o país teria ficado no meio do caminho entre dois modelos: o norte-americano, que forma atletas no sistema educacional, e o europeu, que atribui aos clubes essa responsabilidade. "Não temos um campeonato universitário forte por causa disso. Enquanto não tivermos um sistema nacional de esporte bem definido, não avançaremos", lamenta.
Pertença
As diferenças ficam mais evidentes para quem teve vivência esportiva lá fora. É o caso do paranaense Luiz Fernando Iubel, graduado em Educação Física pelo Berea College, de Kentucky, e prestes a ingressar no mestrado em Administração Esportiva pela Universidade de Columbia, em Nova York.
Aniele Nascimento / Gazeta do PovoLuiz Fernando Iubel cursou Educação Física nos EUA e participou da equipe de futebol do Barea College.
Segundo Iubel, as universidades assumem diversos papéis de relevância social na maioria das cidades dos EUA e acabam criando uma forte ligação afetiva com a população. "Ao passar por aeroportos norte-americanos, é muito comum você ver pessoas trajando roupas das suas universidades de origem", conta o ex-integrante do time de futebol de Barea.
Esse sentimento de pertença contribui para o surgimento de times nas instituições de ensino. Segundo Iubel, os alunos-atletas começam sua formação na elementary school (o equivalente aos primeiros anos do ensino fundamental brasileiro) e vão até a universidade, último e decisivo passo de acesso às ligas nacionais de várias modalidades esportivas.
Enquanto no Brasil a história de vários atletas de sucesso especialmente no futebol mostra que eles tiveram de priorizar o treino em detrimento dos estudos, na cultura norte-americana essas são duas realidades inseparáveis. "Eles acreditam que é necessário ao atleta se desenvolver dentro de um ambiente que lhe permita a continuidade de seus estudos", diz Iubel.
Negócio lucrativo, mas difícil de imitar
Além de ser uma oportunidade e tanto para os estudantes, os campeonatos universitários norte-americanos são fonte de lucro para as instituições que patrocinam os eventos. "Uma final de campeonato universitário tem todo um aporte de mídia, o que o transforma num grande negócio", conta o professor Marcelo Pastre, do curso de Educação Física das Faculdades Integradas do Brasil (UniBasil).
Um lado discutível dessa prática está no fato de que as universidades americanas realmente lucram muito com o marketing feito a partir dos alunos-atletas que se destacam, mas, por questões legais, os próprios estudantes não podem receber salário por sua atuação, apenas uma bolsa de estudos. "Para compensar, algumas instituições dão presentes caros a esses atletas, como carros", diz Pastre.
A falta de incentivo do governo, argumento comumente ouvido no Brasil para justificar resultados modestos em competições, parece não fazer falta no cenário do esporte universitário norte-americano, já que o setor é totalmente sustentado pela iniciativa privada.
Barreira
Esse seria outro aspecto difícil de imitar. Além da barreira cultural, que dificulta a confiança das universidades privadas de que o esporte pode dar retorno financeiro, o volume de recursos que sustenta o esporte universitário norte-americano impressiona. A projeção da National Collegiate Athletic Association (NCAA), entidade que gerencia o esporte acadêmico nos EUA, é de que a temporada de jogos 2011-2012 arrecade US$ 777 milhões (cerca de R$ 1,6 bilhão), dos quais 90% vêm de contratos publicitários.
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