Contato indesejado
Depoimento de M.F.C., universitária, 18 anos.
"Na faculdade, a primeira vez que eu vi droga foi no trote, onde havia calouros e veteranos bebendo e fumando maconha. Sou estudante do setor de Educação Profissional e Tecnológica da UFPR e desde o início do curso tinha amizade com uma garota que fuma maconha. Ela conta para todo mundo e participa de marchas e protestos. Nunca liguei que ela fumasse, mas não queria contato. Por causa de alguns acontecimentos, acabamos discutindo e ela não soube respeitar a minha decisão de não me envolver com drogas.
Não foi a primeira vez que eu tive contato com usuários e com a "bela" argumentação e discurso que fazem incansavelmente. No câmpus é normal ver aluno convidando alguém para fumar ou contando onde e com quem fumou. Não me recordo de terem me convidado. Sempre fiz questão de mostrar que sou contra. Já conheci e conversei com pessoas que usavam maconha, cocaína, LSD e crack. Não acho que os alunos sejam pressionados a fazer uso de drogas ou álcool. Mas o fato é que essas substâncias estão em todo lugar: no câmpus, no bar, na esquina, na pracinha e, obviamente, nas festas."
Instituições adotam medidas contra as drogas
Na Universidade Tuiuti do Paraná (UTP), a batalha contra o álcool e as drogas atravessou ruas e chegou aos bares do entorno da instituição. Alunos e professores se envolvem em atividades como palestras e distribuição de panfletos, além da medição com etilômetro (bafômetro) do porcentual de álcool na corrente sanguínea dos estudantes que estão nos bares.
As ações fazem parte do programa UTP com Vida, com pelo menos uma atividade por bimestre. "O trabalho preventivo é feito na própria instituição, na coordenação dos alunos para uma mudança psicológica interna", diz Luiz Henrique Ramos, professor de Psicologia do Adolescente e responsável técnico pela Clínica de Psicologia da UTP. Além disso, medidas preventivas dificultam o acesso dos alunos aos bares que vendem bebidas alcoólicas, como a desativação dos portões mais próximos a esses locais.
Cerco fechado
Instalação de câmeras, melhora da iluminação e vigilância constante são as principais ferramentas da UTFPR para impedir o uso de drogas na instituição. Para o diretor Marcos Flávio de Oliveira Schiefler Filho, o fato de, em Curitiba, a instituição não estar em um local muito amplo e aberto, facilita a coibição. "Comportamentos suspeitos são observados e, se for algo mais sério, temos contato direto com a polícia. O cigarro é proibido mesmo na área central aberta e, desde 2005, bebidas alcoólicas foram totalmente proibidas nas dependências da universidade, mesmo em celebrações oficiais", diz. A instituição também conta com o Núcleo Psicopedagógico de Apoio ao Estudante para ações educativas.
A abordagem de três estudantes que portavam maconha em um câmpus da Universidade de São Paulo (USP), no fim de outubro, e os reflexos que essa ação da polícia teve na comunidade universitária invasões, protestos, prisões, depredação patrimonial e reintegração de posse da Reitoria levantam a questão da presença de drogas dentro das universidades.
Um estudo, divulgado no ano passado pelo governo federal, revelou que quase metade dos universitários brasileiros já fez uso de alguma substância ilícita. Segundo o psiquiatra Dagoberto Requião, professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), trata-se de um estudo de grande validade científica e reconhecimento internacional. "É fundamental para entendermos qual é a realidade e definirmos que programas é possível implementar. O que sabemos é que hoje a droga está em qualquer unidade de ensino e na universidade não é diferente", afirma.
A pesquisa nacional serviu também como alerta às próprias universidades, que agora querem conhecer de perto o tamanho do problema que têm dentro de seus portões. É o caso da Universidade Estadual de Londrina (UEL), que, assim como outras sete instituições estaduais, está programando para janeiro a aplicação de um censo sobre o uso de drogas por parte da sua comunidade acadêmica.
De acordo com o coordenador do Censo, o professor e doutor em Saúde Mental David Roberto do Carmo, o estudo é fundamental para identificar a real situação regional. "Pela pesquisa, que será feita com 103 mil pessoas, não vamos identificar ninguém, mas vamos saber os segmentos em que as drogas existem e quais são as mais usadas por região. Em Foz, por ser uma cidade de fronteira internacional, a realidade pode ser bem diferente da de Paranaguá, que é portuária, por exemplo." Com os dados, que devem ser compilados ainda no primeiro semestre do ano que vem, as universidades estaduais pretendem definir estratégias de prevenção e tratamento de usuários.
Acessibilidade
O fato de as universidades serem abertas ao público facilita a disseminação e o consumo de drogas, segundo Marcos Flávio de Oliveira Schiefler Filho, diretor-geral da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) em Curitiba. Desde 2005, o antigo Cefet tornou-se universidade federal, o que hoje resulta em cerca de 10 mil pessoas circulando por dia dentro da instituição. "Com essa mudança para universidade, muda também a filosofia e o acesso. Não tem mais como tratar como colégio, com catracas, o que dificulta o controle. Eu não seria hipócrita em dizer que não existem drogas na UTFPR. Infelizmente, esse é um problema de qualquer instituição de ensino que tenha um número grande de pessoas de várias origens", diz. De acordo com o diretor, na instituição há um consumo localizado e pouco frequente e não há registro de tráfico.
Formação aliada à prevenção
A maior instituição pública de ensino superior do Paraná admite estar vulnerável às drogas. "Estamos [vulneráveis], pois não temos nenhum programa de combate hoje", diz a diretora do setor de Ciências da Saúde da UFPR, Claudete Reggiani. Desde 2010, quando houve a proibição do consumo de bebida alcoólica na Federal, foi montada uma comissão para instituir ações preventivas e educativas sobre o consumo de álcool e outras drogas.
O programa Universitário Saudável faz parte desse trabalho e está prestes a ter sua primeira etapa iniciada com uma pesquisa. "Não conhecemos o porcentual de usuários e o que se fala hoje é achologia e não ciência", afirma Claudete. A UFPR planeja introduzir ações de prevenção já em 2012. "Vamos dar condições para o aluno de ter não só uma formação técnica, mas de cidadania e promoção da saúde" diz a diretora.
Caminho
O professor Dagoberto Requião, da PUCPR, também defende esse tipo de formação. "A preocupação de qualquer escola e universidade não é só de passar informação, mas também questões humanísticas, como o respeito às leis e aos outros."
O usuário de drogas tem tendência de ficar inquieto durante a aula provocar colegas, desafiar professores e ter baixo desempenho escolar por dormir muito em sala ou faltar às aulas. Mas, segundo Requião, outros problemas estão envolvidos. "Com as drogas, o usuário tem comprometida a autocrítica e, aí, não se importa se está fazendo sexo sem camisinha, pegando carona com motorista alcoolizado ou dirigindo sem capacete."
Requião lembra que já existe um serviço de apoio psicopedagógico na PUCPR, mas reforça que os pais têm grande responsabilidade no comportamento dos jovens. "É como se a entrada na faculdade fosse um rito de passagem, a partir do qual os pais não se preocupam mais. O pai fala para a universidade: Toma que o filho é seu. Forme-o e o transforme em um bom profissional!."
>>> Confira: a reportagem visitou os câmpus Reitoria e Centro Politécnico, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), para saber o que os estudantes pensam da presença de drogas na universidade. Acompanhe nas fotos a opinião de alguns deles.
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