O discurso corrente dos clubes, do governo federal e da CBF para defender o texto atual da Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte é que ele difere 10% da proposta dos jogadores. Para ser mais exato, "apenas 10%". Um reducionismo com o objetivo de vender a ideia de que o Bom Senso está reclamando à toa, se prendendo a detalhes que pouco contribuiriam para a "salvação do futebol brasileiro". Para ser mais exato, os jogadores estariam apenas "enchendo o saco".

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Ontem li a íntegra da proposta dos jogadores. Uma coleção de dez emendas, que alteram oito artigos da LRFE e um da Lei Pelé, além de criar um artigo na LRFE. Pontos que, para usar o porcentual sugerido pelos cartolas, atacam os 10% mais problemáticos da gestão do futebol brasileiro.

A cartolagem aponta a apresentação da Certidão Negativa de Débitos como atestado para um clube poder disputar qualquer campeonato. Um clube que disputa Estadual, Brasileiro e Copa do Brasil teria de mostrar a CND três vezes – ou tirá-la duas vezes por ano, já que o documento vale por seis meses. Não apresentou, caiu. Um rigor aparente, que na prática não se sustenta, pois para ter a certidão basta aderir ao refinanciamento. E a adesão segue vigente mesmo que o clube atrase duas parcelas.

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Os "apenas 10% de diferença" tomam a CND como ponto de partida para uma série de parâmetros muito mais abrangentes e rigorosos, que efetivamente obrigam a uma mudança de gestão. Alguns exemplos: o clube não pode acumular déficit superior a 10% da sua receita bruta nos dois primeiros anos de adesão ao parcelamento; nos dois anos seguintes, o limite cai para 5%; depois, tolerância zero. Trocando em miúdos. O clube organiza sua vida passada, com adesão ao parcelamento, mas é obrigado a equilibrar as contas de hoje. Sem dúvida, um chute na canela de dirigentes que gostam de culpar heranças malditas enquanto a dívida cresce debaixo do próprio nariz.

Outros exemplos. O custo de departamento de futebol não pode superar dois terços da receita bruta do clube. Um dispositivo elementar, que inibiria o especulativo mercado de salários. Hoje, o clube oferece o que obviamente não tem para pagar – e não paga. Algo que passaria a ser detectado com a apresentação trimestral do cumprimento do refinanciamento, do pagamento de salários, recolhimento de FGTS, contribuições previdenciárias e obrigações assumidas com os atletas. Mais uma barreira para a atuação de maus gestores. Tudo com as devidas punições. De advertências à impossibilidade de inscrever-se em competições, passando por suspensão do registro de atletas e rebaixamento, além, claro, da responsabilização dos dirigentes.

Hoje, diante da mobilização capitaneada pela CBF, é provável que o texto do deputado federal Otávio Leite seja votado e aprovado como está. Os jogadores vão a Brasília para fazer pressão. Para mostrar que "apenas 10%" de diferença entre uma proposta e outra têm a possibilidade de mudar, de verdade, o futebol brasileiro. Não apenas dar mais um passe livre para a cartolagem.

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