O Brasil é um país engraçado (De Gaulle disse que não era sério, continua não sendo). Demora décadas para tentar resolver um problema e quando se propõe a fazê-lo requer o afogadilho, como se, de um dia para o outro, tudo fosse discutido e debatido. Foi assim que quase passou a Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte (LRFE), ainda unilateral, com muitos pontos a serem debatidos e que por pouco não foram atropelados na proposta de sua aprovação, pois o lobby dos dirigentes de clubes e federações movimentou todos os parlamentares possíveis na ação pela sua imediata votação.
Só que os jogadores também se mexeram, foram ao Congresso Nacional, expuseram a parte deles e fizeram ver que a lei tinha pontos positivos (muitos), mas ainda poderia incluir outras demandas, exatamente aquelas que teriam benefícios diretos aos profissionais do esporte, não tão claras no texto original. A iniciativa da lei já é um progresso para um país tão afeito a atalhos e saídas fáceis para situações de responsabilidade. Desde sempre os clubes de futebol (principalmente, mas de outros esportes também) não dão a mínima para os compromissos financeiros e por isso se calcou em inúmeros recursos alternativos, como as diversas formas de loterias a arrecadar fundo para pagamento de dívidas ou refinanciamentos. Mas um dirigente saía, o outro entrava e dizia nada ter a ver com aquela pendência. Tratava de ir em frente, criar sua própria dívida e suas próprias pendências.
Isso sem qualquer fiscalização ou punição. O clube devia milhões, mas contratava jogador por salário de outros milhões. Não pagava, é claro. Aí vinham situações como aquela declarada pelo ex-jogador Vampeta, sobre o mau desempenho de um time de craques no Flamengo: "eles fingem que pagam e a gente finge que joga". E tudo seguia em frente, como se fosse muito natural dar calote. Importante é bola na rede teria dito alguém. Tudo desemboca na situação vivida hoje. Clubes devendo horrores, jogadores e funcionários fazendo greve e um alerta vermelho ligado a toda força. Maurício Assumpção, presidente do Botafogo, não deu vida longa ao clube caso a nova lei não seja aprovada logo. O Botafogo tem 65% das dívidas trabalhistas ora tramitando e não vê perspectiva de solução com suas próprias forças.
O texto da nova lei prevê fiscalização e punição com perda de pontos e rebaixamento para quem não cumprir seus compromissos. Mas os jogadores querem fiscalização permanente, trimestral, para impedir brechas na criatividade administrativa. A mesma criatividade que dividiu os ganhos dos profissionais em salário (ínfimo) e direito de imagem, em pessoas físicas e jurídicas. Aí, na hora de pagar, paga-se o salário pelo menos a cada três meses , e o vínculo do atleta está garantido.
O afogadilho da votação já foi postergado. Espera-se, agora, que haja diálogo e que todas as partes interessadas sejam ouvidas e tenham voz no que será o texto final a ser aprovado.
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