O nome era para ser de rei! Rei de Roma: Paulo Roberto Falcão. Mas acabou virando de astro de cinema. Meio aportuguesado, é verdade. Maicon Douglas Sisenando. Para os íntimos, Pingo. Um jogador preparado para brilhar desde os primeiros minutos de vida. O pai Manoel apelou para a crença por via das dúvidas. Quando Maicon e o irmão Marlon nasceram, ele pegou os cordões umbilicais e enterrou no campo do estádio Santa Rosa, em Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul.

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"Falar essa história é meio complicado porque todo mundo vai querer fazer igual. É uma história legal porque deu certo. Se não tivesse dado ninguém ia contar (risos). Ele ali deve ter feito uma reza para que um filho tivesse sucesso no futebol. Ele plantou mesmo um jogador (risos)", disse Maicon em entrevista ao repórter Tino Marcos, da TV Globo.

Era dia 27 de julho de 1981. Manoel Sisenando, então zagueiro do Novo Hamburgo, caminhou até o centro do gramado e abriu um pequeno buraco no gramado para enterrar os cordões umbilicais dos filhos que tinham acabado de nascer. Fez uma oração e pediu para que pelo menos um virasse um grande jogador de futebol. A ideia partiu da esposa Anísia, que ainda estava internada no antigo Hospital Operário. Só depois, ele foi registrar os filhos.

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"A gente era fã de cinema. E eu queria colocar o nome de "Michael Douglas", já que o adorava como ator. O meu marido era ídolo do Falcão e queria colocar o nome do outro de Paulo Roberto Falcão. Eu falei que não. Está louco? Aí ele pensou. E falou que então iria colocar "Marlon Brando", que era outro ator que eu gostava", lembra Dona Anísia.

Mas ao chegar ao cartório de Novo Hamburgo, uma surpresa.

"Queria registrar os garotos como "Maicon Douglas" e "Marlon Brando", mas o pessoal lá não deixou eu colocar o Brando. Então o nome do meu outro filho ficou "Marlon Maicon". Foi aí que tiraram a sorte do Marlon (risos)", disse Manoel, que estava viajando na hora do nascimento dos filhos com o Novo Hamburgo, no Paraná, para a disputa de um amistoso com o Coritiba e só chegou à maternidade para conhecer os gêmeos no dia seguinte.

Maicon não reclama da escolha dos pais. Garante que acha o nome legal. Mas admite que não repetiria a fórmula com os filhos. Preferia algo mais tradicional. A filha se chama Marcela. E o filho, Felipe.

"Gosto do meu nome, amo o meu nome. Mas não colocaria em outra pessoa, não (risos)".

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Os nomes famosos só confundiram o avô de Maicon. Por isso, ele resolveu simplificar. Nada de Maicon ou Marlon. Na casa dos Sisenandos era Pingo e Fofo.

"Meu avô que colocou esse apelido (Pingo). Ele não sabia pronunciar direito o meu nome. Ele já estava com uma certa idade. E como eu era menor ele passou a me chamar de Pingo (de gente). Já o meu irmão que era um pouquinho mais forte virou Fofo. O fato é que no meu bairro ninguém me chama pelo meu nome. Todo mundo me chama de Pingo porque é como eu cresci e como as pessoas me conhecem lá".

O meu bairro em questão é Vila Zuleima, em Criciúma, Santa Catarina. A família Sisenando se mudou para lá quando Maicon e Marlon estavam com dois anos. Perto de casa havia um campinho onde os gêmeos deram os primeiros chutes. Manoel, que foi lateral do Blumenau Esporte Club nos anos 80 e precisou abandonar a carreira cedo por causa de uma contusão, logo virou um professor para os filhos no mundo da bola.

"Todos os fundamentos do futebol eu aprendi dentro de casa. É bom porque a pessoa que está te ensinando faz tudo com amor e carinho. Quando ele voltava do serviço a gente já o esperava no campinho. Porque sabia que ele passaria por ali. Seu Manoel é um bom treinador. Afinal deu certo. Estou jogando bem, em um clube grande, na seleção brasileira", lembra Maicon.

"Os fundamentos do futebol para o Marlon e para o Maicon fui eu quem dei. Sabia que um dos dois daria jogador de futebol. O pai quando joga bola sempre vai querer que um filho siga o mesmo caminho", disse Manoel.

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Além disso, Maicon foi criado de uma forma, vamos dizer, especial para ter um físico avantajado. É quase um segredo de família.

"Ele foi criado na papinha. Então, quando tu é criado na papinha, tu não tem lesão, não tem nada, vai jogar o resto da vida (risos)", completou o pai.

O maior susto da vida

Aos dez anos, porém, um grande susto. Maicon estava com a mãe e foi pegar a chave de casa com o pai, que estava com amigos em um bar. Mas, apressado, saiu correndo, caiu no meio da rua e foi atropelado. Desespero. O drama batia novamente na porta de Seu Manoel e Dona Anísia.

"Lembro perfeitamente de tudo. Eu na pressa de chegar em casa para brincar acabei saindo correndo e cai na frente de um carro. E a minha mãe, de longe, viu tudo. Ela ficou muito nervosa. Meu pai me pegou na hora no colo. Ficou todo mundo assustado porque eu já tinha perdido um irmão por atropelamento. Então foi um choque. Eles não queriam perder outro filho da mesma forma. O meu pai começou a chorar e perguntar se eu estava vivo. E eu falava "pai, está tudo bem, não aconteceu nada, estou inteiro". Mas ele não escutava. Ali eu vi a tristeza deles", lembra Maicon.

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Antes de Maicon nascer, o casal Sisenando enfrentou uma tragédia. O filho mais velho morreu em um acidente de trânsito. Elton Luis tinha apenas oito anos quando bateu com a bicicleta em um caminhão. Foi socorrido, mas faleceu no hospital. Anísia sofria de problemas de saúde e foi aconselhada pelos médicos a evitar uma nova gravidez. O casal já tinha uma filha, Erla Carla. Mas ela preferiu arriscar. Só na hora do parto se descobriu que ela esperava dois meninos. Marlon nasceu cinco minutos antes de Maicon.

"Quando vi o Maicon caindo gritei. Pensei... perdi outro filho. Mais um, não. Eu não vou aguentar. E o sangue escorria da perna dele. E eu pensava que não poderia ter outra tristeza no meu coração", lembra Dona Anísia, que estava grávida de oito meses e perdeu a criança.

"Não foi por causa disso. Eu não estava mais com tanta saúde", garante.

Mas Maicon perdeu as forças nas pernas. Não andava mais. Era psicológico.

"Para eu ver televisão o meu pai tinha que me pegar no colo e me levar até o sofá. E para eu dormir ele tinha que me levar para cama. Eu não conseguia me mover (pausa). E claro ficou aquela tensão naquele momento para saber se eu ia andar ou não. Ficava a expectativa... será que vai ficar travado, que não vai conseguir mais andar?", disse Maicon.

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Unida, a família se recuperou do susto. Aos 13 anos, Maicon chegou para treinar no Grêmio de Porto Alegre. Jogava como meio-campo. Mas foi dispensado depois de alguns meses. O treinador alegou que ele não tinha força física. O gêmeo Marlon também tentou seguir a carreira como zagueiro, mas não teve sucesso. Virou professor de Educação Física".

"Foi algo muito triste para mim. Cheguei em casa chorando porque eu não queria decepcionar a minha família. Queria ficar no Grêmio e começar a minha carreira ali. Não deu certo, mas surgiu uma oportunidade no Criciúma".

O pai Manoel foi quem abriu as portas no Criciúma. Tinha alguns contatos no clube. Logo ele também virou treinador do filho no juvenil. E foi responsável por uma grande mudança de rumo da carreira de Maicon.

"Um dia a gente foi fazer um amistoso em Gravataí, no Rio Grande do Sul, e o nosso lateral acabou machucando. E o meu pai me falou que eu iria jogar na lateral direita porque eu não ia dar certo no meio-campo porque eu não tinha um giro muito rápido. Ele achava que seria melhor eu sempre pegar a bola de frente. Ele tinha razão".

Não demorou para o Cruzeiro se interessar pelo promissor garoto. E aceitar pagar R$ 1,8 milhão por Maicon antes mesmo de ele se profissionalizar. A partir dali tudo aconteceu rápido. Convocado para o Pré-Olímpico de 2003, ele fez um gol histórico contra o Paraguai. Saiu driblando meio time desde o campo de defesa. Até o goleiro ficou no chão.

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"Foi um momento muito importante na minha vida. Aquele gol abriu as portas para mim. Depois daquele gol eu me transferi para a França", disse o lateral.

"Eu vendo na televisão só mandava ele tocar (risos). Larga a bola, larga a bola. Mas ele só ia com a bola, passava por um, por outro. E fez um gol daqueles (risos)", lembra o pai Manoel.

"Quando ele fez aquele gol, nossa... eu me joguei no chão e gritei muito. Mas como eu gritei aquele dia, eu só gritava e chorava", lembra a mãe.

Sucesso no mundo da bola

Logo Maicon se transferiu para o Mônaco, da França. E lá começou um gosto curioso. Dono da camisa 2 da seleção brasileira, o lateral tem uma queda pelo número que tanta sorte deu a Zagallo. Agora, tudo na família Sisenando está ligado ao 13. Até as placas do carro.

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"Tudo começou no Cruzeiro. Fui inscrito com a 13 na Libertadores porque eu era reserva do Maurinho. E quando cheguei ao Mônaco tinham os números livres para eu escolher. Quis o 13 e me falaram que era um número que dava azar. Mas eu falei que não, que iria pegar a 13 para mostrar que não tem nada disso. E foi assim. Joguei pra caramba lá. Aí quando vim para o Inter, o Zé Maria foi embora e só sobrou a camisa 13. Então vesti aqui também. Posso dizer que para mim não dá azar, dá é muita sorte (risos)".

Maicon vai disputar a primeira Copa do Mundo. Apesar de ter participado das conquistas da Copa América de 2004 e da Copa das Confederações de 2005, o lateral não foi chamada para defender a seleção na Alemanha, em 2006. Perdeu a vaga para Cicinho.

Mas com a aposentadoria de Cafu, virou titular absoluto na seleção sob o comando de Dunga. Tem 52 jogos pela seleção. E conquistou o bi da Copa América de 2007 e da Copa das Confederações de 2009. Maicon é o terceiro jogador mais utilizado por Dunga, atrás apenas de Robinho e Gilberto Silva.

"O grupo está unido e pronto".

Maicon está afinado. Não só com a bola nos pés. O lateral também tem, na ponta da língua, uma música especial. "Moleque Atrevido", de Jorge Aragão: "Não se discute talento / Mas seu argumento, me faça o favor / Respeite quem pode chegar / onde a gente chegou / E a gente chegou muito bem / Sem a desmerecer a ninguém / Enfrentando no peito um certo preconceito / e muito desdém!".

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"Essa música ficou gravada na minha memória. Fazia sucesso quando marquei aquele gol contra o Paraguai. É algo que vai ficar marcado para sempre na minha vida. A música fala de uma pessoa atrevida, que quer fazer uma coisa diferente. E as outras pessoas não acreditam que ele poderia fazer aquilo".