Justiça
Liminares abrem brechas para brigões voltarem a frequentar os estádios indevidamente
Boa parte dos cerca de 30 envolvidos na briga generalizada entre torcedores de Atlético e Vasco, na Arena Joinville, no ano passado, pode estar frequentando estádios de futebol indevidamente desde setembro, confirmou a 1ª Vara Criminal de Joinville à Gazeta do Povo.
Há aproximadamente três meses, a juíza Karen Francis Schubert Reimer começou a deferir liminares que liberam os brigões da obrigação de permanecer em uma delegacia de polícia duas horas antes e duas horas depois dos jogos. A alegação é de que a situação tem comprometido a renda deles, já que poderiam estar em horário de trabalho.
Os torcedores do Atlético, portanto, apenas assinam uma certidão de presença na Delegacia Móvel de Atendimento ao Futebol e Eventos (Demafe) no horário dos jogos. Após o visto, eles estão liberados, o que abre brecha para comparecer a partidas na Arena da Baixada não há fiscalização nas entradas do estádio.
"Eles vêm no horário da partida, assinam e vão embora... Não são bandidos comuns, são trabalhadores que tiveram um desvio por causa do futebol", explica o delegado Clóvis Galvão, da Demafe. "Infelizmente não temos como fiscalizar", lamenta uma assessora da vara catarinense.
A facilidade com que atleticanos e vascaínos ultrapassaram a simples corda que separava as duas torcidas na tarde de 8 dezembro de 2013, na Arena Joinville, é inversamente proporcional à agilidade do governo federal no combate à violência no futebol. O episódio de selvageria que rodou o mundo completa um ano na próxima segunda-feira. Por enquanto, apenas um envolvido irá a julgamento. Ninguém está preso.
Veja fotos da selvageria entre atleticanos e vascaínos em Joinville
Veja páginas da Gazeta sobre a cobertura da barbárie em Joinville
O alerta, no entanto, já havia sido dado em 2009, no gramado do Couto Pereira manchado de sangue. Hoje completam cinco anos da maior barbárie do futebol paranaense, quando "torcedores" invadiram o campo após o rebaixamento coxa-branca com uma única intenção: brigar e destruir. O clube levou a maior punição da história do futebol nacional (perda de dez mandos de campo e multa de R$ 100 mil), mas nenhum dos brigões foi condenado à prisão.
A barbárie em Joinville, que poderia marcar uma revolução na maneira com que o esporte é conduzido no país, tal qual o desastre de Hillsborough representou para o futebol inglês hoje modelo de segurança passou batida.
Tanto que até o momento, 13 mortes relacionadas a futebol e torcidas organizadas foram registradas pela polícia em 2014, mais de uma por mês. A vítima mais recente foi o palmeirense Leonardo da Mata Santos, 21 anos, atropelado durante emboscada contra santistas em São Bernardo do Campo, em outubro.
Prova de que o plano de segurança lançado em conjunto pelos ministérios do Esporte e da Justiça logo após o incidente em Joinville não foi suficiente. Aliás, mal saiu do papel.
Das nove medidas propostas (leia mais ao lado), apenas a criação de uma comissão para avaliar a aplicação das questões iniciais e o envio de projeto de lei que regulamenta a atuação dos agentes de segurança privada foram cumpridas. As outras atitudes ainda estão na fila para ganhar uma resolução.
Por exemplo: só existem delegacias especiais do torcedor permanentes em São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul, quando a cobertura deveria ocorrer nos 27 estados. O plano de implantar os sistemas de segurança de Copa do Mundo nos estádios ainda segue no papel. O Cadastro Nacional de Torcedores, que serviria para controlar a entrada de brigões nos estádios, está estagnado, assim como o projeto que responsabilizaria os clubes por brigas entre torcedores.
"Em relação a maior responsabilização dos clubes, o Conselho Nacional do Esporte (CNE) ainda não deliberou sobre a mudança no Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD)", explica nota do Ministério do Esporte (ME) enviada à Gazeta do Povo.
Segundo a pasta, o cadastramento de torcedores ainda acontece, mas somente quando solicitado, e encontros periódicos com vários setores têm sido feitos para resolver os problemas.
Efetivamente, porém, os hooligans brasileiros ainda estão tão à solta e à vontade. Procurado, o Ministério da Justiça não respondeu ao pedido de entrevista até o fechamento dessa edição.
Juíza espera que punição inédita ajude a combater a violência no futebol
Um ano depois da selvageria entre torcedores de Atlético e Vasco em Santa Catarina apesar de nenhum envolvido continuar preso , a juíza que cuida do caso, Karen Francis Schubert Reimer, considera que a atuação da 1.ª Vara Criminal de Joinville pode influenciar no aumento da segurança nos estádios. Em uma decisão rara, na qual a aplicabilidade da lei penal foi tomada mesmo sem a sentença, os quase 30 envolvidos ficaram mais de dois meses presos na cidade catarinense até conseguirem liberação provisória na Justiça.
"Este foi um caso quase inédito, em que torcedores permaneceram presos por diversos meses por este tipo de conduta em estádios de futebol. Existe uma cultura de que tudo vale dentro dos estádios, mas hoje não podemos mais tolerar este tipo de atitude", afirmou Karen. "Esperamos que este tipo de decisão torne os estádios mais seguros", acrescenta.
Na última terça, a juíza decidiu que o vascaíno Leone Mendes da Silva, em liberdade desde o dia 19 de março, vai a júri popular por tentativa de homicídio contra o atleticano Estevam Vieira da Silva. Os próximos a ter a sentença anunciada devem ser os os cariocas Arthur Barcelos Lima Ferreira e Jonathan Fernandes dos Santos.
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