"Alemão... Quinta coluna... Coxa-branca!", bradava, entre outros xingamentos, o célebre atleticano Jofre Cabral e Silva da cerca do Estádio Joaquim Américo. Era ofensa ao zagueiro Breyer, nascido na Alemanha, pivô da Segunda Guerra Mundial que completava seu segundo ano em 1941. Impossível imaginar que, quase três décadas depois, a expressão se tornaria a maior identidade da torcida coritibana.
Naquele 19 de outubro, pela primeira vez a dupla Atletiba se encontrava em uma decisão. Apesar dos insultos, o Alviverde então tratado como alvinegro, por causa das camisas brancas e calções pretos venceu no reduto adversário por 3 a 1. Uma semana depois, ganharia também a segunda partida por 1 a 0 e conquistaria seu sétimo título estadual. Mas o apelido pegou. Contra a vontade de Breyer, que o detestava.
Contra a vontade de todos no clube. Como a presença alemã ainda era muito forte no time, a alcunha passou a ser cada vez mais usada pelos adversários. "Passamos a ser chamados assim", lembra Aryon Cornelsen. Companheiro de equipe do zagueiro, o centromédio de origem dinamarquesa e alemã ainda viria a ser presidente do Coritiba.
O apelido ganhava um tom ainda mais pejorativo por causa da guerra. Enquanto o Eixo liderado pela Alemanha de Hitler era combatida pelos Aliados na Europa, os alemães ou seus descendentes sofriam as consequências por aqui.
Desde a década anterior, quando o nazismo ganhou força, o clube convivia com insinuações de preconceito racial. Acusações que o presidente Antônio Couto Pereira rebatia prontamente. Seu exemplo preferido era o negro Moacyr Gonçalves, jogador e técnico nos anos 30. Citaria também os irmãos Bananeiro e Janguinho, que atuariam nos anos 40.
Mas Breyer, assim como a grande maioria dos jogadores, tinha as coxas brancas mesmo. Ele veio com a família para o Brasil aos seis anos de idade. Vice-campeão brasileiro de decatlo em 1939, com 20 anos, treinava na pista ao lado do campo do Coritiba e acabou convidado a jogar na ponta direita. Depois de três partidas, sua altura (1,86 m) e vigor físico o transformaram em zagueiro.
Deixou o futebol em 1944, ainda chateado com o apelido. "Mas não foi por isso que ele parou, não. Queria fazer outras coisas", diz Laís Levoratto Breyer, que o conheceria nos anos 50 e seria sua esposa até a morte em 2001. Enquanto jogava, era funcionário da Fundição Müller no mesmo local onde hoje se encontra o shopping homônimo. Mais tarde se tornaria corretor de imóveis e dono do restaurante Nino, no centro de Curitiba.
A expressão "coxa-branca" percorria um caminho paralelo. A antiga ofensa aos poucos foi sendo adotada pelos coritibanos. Não há nenhuma explicação exata, mas a comemoração do título de 1969 é apontada como marco para a união entre torcida e apelido. Vem daquela partida contra o Água Verde, no Estádio Oresthes Thá, o registro dos primeiros gritos da arquibancada. "Aí ele (Breyer) passou a gostar. Ficou com orgulho", conta Dona Laís.
Tanto que sua lápide no Cemitério Água Verde traz a epígrafe Hans Egon Breyer "O Coxa Branca".
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