Quando o ônibus da seleção brasileira seguir para o Mineirão nesta tarde, escoltado pelo maior esquema de segurança armado para o time nacional no próprio país, quem arriscar um olhar pela janela verá um cenário hostil. Belo Horizonte se prepara para o imprevisível.
A capital mineira nem precisava deste combustível para piorar os ânimos na sede mais refratária aos gastos públicos com o Mundial de 2014 e a Copa das Confederações. Mas a semifinal desta quarta-feira (25) entre Brasil e Uruguai, às 16h, elevou a tensão.
No trajeto ao estádio, quase tudo que faz referência ao torneio já foi destruído por vândalos. Apenas um ou outro banner da Fifa, instalado nos postes, resistiu. Rasgados, pichados ou arrancados, o estrago tem como alvo direto a entidade máxima do futebol.
Tapumes estão sendo instalados em frente de casas e de estabelecimentos comerciais, tanto no centro como na Avenida Antônio Carlos, rota para o local do jogo. A sensação é de que a cidade espera pela passagem de um furacão. A população prevê mesmo o pior. E ele pode acontecer.
Manifestantes prometem para hoje uma gigantesca mobilização, com expectativa de 100 mil pessoas, e o confronto com polícia parece inevitável. Apesar das denúncias de vários abusos por parte dos policiais no desfecho violento de outras mobilizações na capital mineira, as autoridades públicas pediram ainda mais rigor no combate aos desordeiros e no bloqueio a quem pretender seguir à praça esportiva edificação de R$ 695 milhões, 64% de dinheiro público (R$ 445 milhões).
O jogo da seleção se tornou o melhor dos holofotes na cidade onde os mais diversos movimentos resolveram concentrar ações, pautas e reivindicações no Comitê Popular dos Atingidos pela Copa 2014. O eco contra a Fifa é coletivo.
Acuada, a entidade descaracterizou seus veículos, decidiu abrir os portões do estádio mais cedo e cancelou compromissos do presidente Joseph Blatter em evento no centro. Ele seguirá direto do Aeroporto de Confins para o Mineirão, com logística mantida em sigilo até para a polícia.
Reforço de segurança foi requisitado para o hotel da seleção, possível alvo de ataques e que ontem amanheceu cercado por grades. Os cartazes popularizados nos protestos já foram vetados no último jogo na cidade, entre Japão e México, e serão recolhidos hoje na entrada.
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, também tentou acalmar os ânimos. Ele garantiu que o governo federal tem um "plano assegurado" para manter a paz. Por sua vez, a Secretaria de Defesa Social de Minas Gerais destacou que serão mobilizados 5.567 policiais 55% a mais do que o efetivo usado no sábado, durante o maior protesto da história de Belo Horizonte.
Mineiro, o atacante Fred revelou a apreensão. "A previsão é de manifestação bem forte. Isso me deixa preocupado. Pedimos ao povo que esteja unido com a seleção e faça um canto só para darmos essa alegria pelo menos nos 90 minutos do jogo", disse ontem o camisa 9.
O ambiente, contudo, não é desfavorável apenas fora de campo. Após desfrutar de uma devoção incondicional, especialmente nos dois duelos no Nordeste, o Brasil volta ao palco de onde saiu vaiado.
Em abril, com um futebol fraco e apenas jogadores de times nacionais, a seleção empatou por 2 a 2 em amistoso contra o Chile. Nem mesmo a presença de Ronaldinho, ídolo do Atlético-MG, poupou o Brasil dos apupos. Ele espera outro clima hoje. "Acho que será um apoio igual a das outras cidades. Quando Belo Horizonte resolve apoiar, eles abraçam realmente", disse o meia do Galo e fora do time nacional.
Foi no Mineirão também a última derrota do Brasil atuando no país em torneios oficiais. O tropeço ocorreu em 30/9/75 pela Copa América, com um 3 a 0 para o Peru.
O pedido de apoio ao público virou quase uma súplica da equipe brasileira e apareceu em todos os pronunciamentos desde Salvador, com a classificação para a semi.
"Que a torcida em Minas Gerais ajude a fazer a diferença, como a torcida dos outros estados fizeram. Ajudem-nos! Precisamos dar um passo importante para a final", reforçou o técnico Luiz Felipe Scolari.
Ele mesmo detectou mais uma dificuldade para o jogo desta tarde. O Uruguai é o time melhor postado e pode provocar grandes dificuldades, de acordo com o técnico Alexandre Gallo, observador técnico da seleção.
Não bastasse tudo isso, qualquer embate com a Celeste invoca o Macaranazo, de 1950. Mas o maior trauma do time nacional concorre hoje com fantasmas muito mais reais.
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