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Eles fazem desafios engraçados ou bizarros como entrar em balões gigantes ou misturar Mentos com Coca-Cola para causar uma explosão. Também fazem receitas fáceis, esquetes engraçadas, paródias e até dão dicas de maquiagem. Tudo isso é devidamente filmado e publicado na internet e atinge milhões de visualizações. As estrelas são crianças que conquistaram a fama cedo como youtubers mirins. Só que as brincadeiras da web estão sendo questionadas do ponto de vista jurídico, tanto por acabarem virando trabalho infantil quanto por envolverem publicidade em alguns casos.

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O trabalho infantil artístico se diferencia do trabalho infantil – que é vedado pela legislação até os 14 anos, quando se pode começar a trabalhar com menor aprendiz, com regras específicas. No meio artístico, crianças podem participar de produções audiovisuais, peças de teatro ou campanhas publicitárias, mas, para exercer essas atividades, não basta a permissão dos pais, é preciso também autorização judicial.

Condições

Ao conceder a autorização, um juiz observa quantas horas vai durar a gravação, as condições físicas do espaços, se há riscos físicos ou morais. Em alguns casos, se houver uma cena de violência ou algo incompatível com a faixa etária, a criança só é autorizada a participar de forma descontextualizada da cena, para depois ser incluída pela edição.

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Os vídeos do Youtube geralmente são produzidos mais no ambiente doméstico, mas nem por isso devem dispensar a autorização judicial, segundo defendem as advogadas entrevistadas pela reportagem. Mesmo assim, Sandra Cavalcante, atuante em causas que envolvem o trabalho artístico infantil, conta que nunca viu uma autorização judicial ser emitida para produção de vídeos para a internet.

Ekaterine Karageorgiadis, advogada do Instituto Alana (ONG voltada à proteção dos direitos infantis), observa que, muitas vezes, as crianças expõem suas famílias, até irmãos bebês, suas casas, seus quartos, enfim, toda a intimidade em vídeos que serão acessados por milhões de pessoas. E muitas vezes a família não está preparada para administrar isso.

“A criança não é só das famílias. Ela pertence à sociedade”, diz a advogada do Instituto Alana. Ela ressalta que o objetivo não é vedar a expressão das crianças, que fazem parte de uma geração que já nasceu usando essa ferramenta. “A questão é como se dá a exploração e a superexposição dessas crianças nos meios de comunicação.”

Sandra relembra que a Constituição Federal prevê que é dever da família, do Estado e da sociedade cuidar do bem-estar das crianças. E, por isso, mesmo que a família autorize e até participe dos vídeos dos youtuber mirins, é fundamental que os órgãos responsáveis acompanhem de perto.

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Outro tipo bem comum de vídeos dos pequenos famosos são os de divulgação de lançamentos do mercado infantil. Muitos dos vídeos se resumem à apresentação de brinquedos, roupas, materiais escolares e brindes de lanche de fast food. Em várias oportunidades esses episódios são chamados de “recebidos” e reúnem uma série de “jabás” – como são chamados no jornalismo os presentes dados em troca de divulgação.

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Para Sandra Cavalcante, ao darem esses presentes para serem divulgados, as empresas estão nitidamente fazendo merchandising. Autora do livro Trabalho Infantil Artístico: do Deslumbramento à Ilegalidade, ela considera que esse tipo de estratégia acaba por desrespeitar as normas sobre propaganda, além de acabar sendo trabalho infantil.

A Resolução 163 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) veda que as propagandas voltadas para crianças tenham pessoas ou celebridades com apelo ao público infantil.

“A percepção que se tem é que esses canais estão sendo utilizados pelas empresas como plataforma para burlar a legislação vigente”, explica Ekaterine. Ela acrescenta que, por mais que ainda se considere a internet terra sem lei, devem ser aplicadas todas as regras que existem para outros meios.

Consequências psicológicas

Em sua pesquisa, Sandra acompanhou 10 artistas mirins (não só da internet, mas da tevê e de campanhas publicitárias) e constatou que a dedicação que elas têm a essas atividades acaba por afetar outras áreas de suas vidas. Elas associam muito sua identidade à fama. Muitas relatavam que não tinham amigos na escola porque eram famosas. Outras diziam que só tinham amigos porque eram famosas.

A advogada, que é doutoranda em saúde pública na Universidade de São Paulo (USP), diz que é preciso prestar atenção no tempo que essas atividades tomam. “Essa rotina toma interesse e atenção. Vai diminuir o período que vai se dedicar a outros assuntos.” Para ela, é importante que as crianças tenham um acompanhamento que as prepare tanto para o assédio físico e psicológico, quanto para quando a fama acabar.

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Conar

O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) não comenta “temas especulativos”, conforme explica a assessoria de imprensa. Todo parecer precisa se referir a um caso concreto, que seja trazido para discussão no Conselho.

Apesar de não ter se posicionado sobre os youtubers mirins especificamente, o Conar se posiciona contra tentativas de omitir material publicitário.

Em decisão de 2012, o Conar julgou simultaneamente três casos de denúncias a blogueiras que divulgaram a marca de maquiagem Sephora do Brasil. Devido a expressões semelhantes utilizadas pelas três autoras, fotos do produto em que aparece no rótulo que não devem ser vendidos “not for sale” e links para o site da empresa.

A empresa e as blogueiras receberam advertência.

Legislação

A advogada Sandra Cavalcante defende que seja criada uma lei específica para os pequenos artistas, que garanta acompanhamento psicológico e determine um porcentual do valor ganho pela criança seja depositado em uma conta para que ela possa usar no futuro. Ela cita como exemplo a California Child Actor’s Bill, lei criada no Estados Unidos após esforço do ator Jackie Coogan, que interpretou o garotinho junto com Charlie Chaplin, mas chegou ao fim da vida com poucos recursos. A lei ficou conhecida como Coogan Bil l ou Coogan Act.

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